sexta-feira, 24 de abril de 2009

O Padre e as Moças



Na capela ficou a ausência do padre
e celebra a missa dentro do arcaz.
Longe o padre vai celebrando e cantando
todo amor é o amor e ninguém sabe
onde Deus acaba e recomeça.

Carlos Drummond de Andrade, "O Padre e a Moça"

A descoberta de que o presidente do Paraguai, Fernando Lugo, tem uma vida sexual mais animada do que a de um personagem de Jorge Amado poderia ser apenas mais uma anedota sobre o furor dos latino-americanos, mas alguns elementos das estripulias amorosas de Lugo podem colocá-lo em problemas judiciais bastante sérios e, eventualmente, até lhe custar a presidência.

Lugo reconheceu recentemente a paternidade de um menino – após negá-la várias vezes – e surgiram outras duas mulheres alegando que ele é o pai de seus filhos. Uma das moças tinha 16 anos no momento do suposto relacionamento com o então bispo. Pela lei paraguaia, sexo com menores de 17 é estupro, mesmo que a relação tenha sido consentida. O presidente governa apoiado numa coligação de diversos partidos, com muitas disputas e contradições. Seu principal aliado, o Partido Liberal, já tem se mostrado arredio a acordos e o vice-presidente, que é membro dessa sigla, foi saudado num comício, há poucos dias, com gritos de “presidente!”.

Para além dos problemas jurídicos, a situação pode se tornar uma crise de confiança entre Lugo e seu eleitorado. O presidente fez campanha como um santo, não como um homem, propondo medidas muito austeras como a redução do próprio salário. É chocante para seus eleitores descobrirem que mesmo quando bispo ele tinha vários casos amorosos, em geral com moças décadas mais jovens do que ele, que dependiam de sua diocese para emprego ou assistência social. Bem, pelo menos não foram os coroinhas... Talvez haja também uma certa satisfação perversa em perceber que apesar da pretensão em ser mais honesto do que os outros, Lugo tem tantas fraquezas como qualquer pobre pecador de seu rebanho.

Em outros países, a moral sexual dos presidentes raramente rende mais do que algumas notas em colunas de fofocas – Bolívia e Venezuela, para citar dois exemplos contemporâneos. Mas o Paraguai ainda é uma nação de grande base agrária, muito conservadora em temas que dizem respeito à família e ao sexo. Me lembro da dificuldade que foi pesquisar no país sobre esses assuntos, em particular com os camponeses, a base de apoio de Lugo.

No mês que vem o presidente paraguaio terá uma dura rodada de negociações com o governo brasileiro sobre Itaipu, e naturalmente irá muito fragilizado para a disputa.

6 comentários:

carlos disse...

caro santoro,

fico com um pé atrás ao tomar conhecimento dessas notícias.

geralmente desconfio da grande imprensa ávida, como seus leitores, por detalhes da vida íntima de homens ou mulheres que exercem altos cargos públicos e cobrar-lhes, falsamente, rígidos comportamentos morais.

isso me lembra uma estória de meu saudoso pai sobre jk. meu filho, ele dizia, um homem que frequenta bares, saraus, faz serenata e gosta de mulher, nem tem tempo de "botar" no povo!

talvez seja o caso do presidente paraguaio.

abçs

Maurício Santoro disse...

Salve, Carlos.

Não sou fã de se explorar politicamente a vida íntima de políticos, mas no caso de Lugo a história tem um apelo muito forte, por sua antiga condição de bispo e por toda aura de honestidade que ele criou em torno de si mesmo. Bem fazia o JK, que, desconfio, era mais feliz.

Abraço

Anônimo disse...

verdadeiro fanfarrão esse Lugo.

acho que não tem essa de "vida íntima", pois ele tornou sua cida íntima em vida pública pela condição de bispo. Um cara que cuspiu nos próprios votos e que comia as fiéis mostra o nível (falta de) de líder político paraguaio.

lamentável.

Helvécio.

Patricio Iglesias disse...

Caro Maurício:
Lembro seu primeiro artigo sob o Lugo, depois das eleiçöes, e eu dizia que näo gostava da idéia de um bispo na aréia partidária. Além de que é grave que a oposiçäo só possa vencer com uma figura que teoricamente teria que ser neutral, todas issas denúncias teriam sido menores de ser um laico.
Há que ver cómo siguem as investigaçöes. Sem dúvidas, näo é o mesmo uma mulher de 30 anos independente econômicamente a uma garota de 16 que necessitava do apoio da diócese pra sobreviver.
Tinha lido faz umos anos que o Juscelino K. gostava das "danças", eufemismo pra dizer "mulheres". Aqui é pouco conhecido que o Sarmiento, quando trabalhava como diplomata do Chile, organizava na Europa orgias e rendia com claridade os gastos ao governo. Näo só "el aula" era seu lugar favorito...
Saludos

Maurício Santoro disse...

Olá, Patricio.

Pois é, me lembro da nossa discussão e de como estávamos críticos ao uso que Lugo vinha fazendo da religião. Só não sabia era da vida animada do Sarmiento na Velha Europa.

Abraços

Patricio Iglesias disse...

Caro Maurício:
Aunque näo é novo no ambiente da história, o escretor Federico Andahazi publicou um livro polêmico com relatos sob a pouca castidade de figuras do século XIX como Sarmiento, Belgrano, Rosas ou San Martín. Falei do tema com um genealogista e me confirmou a escasa "moderaçäo" do Padre del Aula. Väo alguns enlaces. O segundo comenta cómo as paixöes do Padre de la Bandera ajudaram à consolidaçäo da forma republicana.
Saludos!

http://www.revistaenie.clarin.com/notas/2009/03/29/_-01887796.htm
http://www.lanueva.com/edicion_impresa/nota/26/04/2009/94q133.html