quarta-feira, 19 de agosto de 2009

A Partida



A Partida”, de Yojiro Takita é a produção japonesa que venceu o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2009, derrotando rivais de peso como o israelense “Valsa com Bashir” e o francês “Entre os Muros da Escola”. Narrando uma história simples com delicadeza, o drama japonês conquistou o público carioca na divulgação boca a boca.

Daigo (interpretado pelo jovem e excelente Masairo Motoki) é um violoncelista que perde o emprego em Tóquio, quando a orquestra em que tocava é dissolvida. Em dúvida quanto ao próprio talento e em crise pessoal, resolve retornar à pequena cidade onde cresceu, na qual pode viver na casa herdada da mãe. As lembranças de infância são agridoces: a beleza do local e o início da paixão pela música, mas também as parcas e dolorosas memórias do pai que o abandonou ainda criança, e nunca mais deu notícias.

Em busca de trabalho, Daigo responde a um estranho anúncio de jornal e é empregado como assistente numa pequena agência funerária que prepara os corpos para serem colocados em caixões. Anteriormente, os ritos eram feitos pelas famílias dos mortos, mas as tradições se perderam com o tempo e agora os parentes dependem de profissionais capazes de executar as delicadas práticas, que envolvem maquiagem, a escolha da vestimenta adequada e o trato com as pessoas que eram próximas aos falecidos.



A princípio o novo ofício causa repugnância a Daigo – ele tivera pouco contato com a morte e nunca refletira sobre o que ela significa para a vida. Seu mentor nessa jornada será Shoei (atuação contida e talentosa de Tsutomu Yamasaki), o dono da agência funerária, cuja trajetória individual e comentários filosóficos sobre o vínculo entre comida e cadáveres o tornam um personagem antológico. Mas a mudança pessoal de Daigo é complicada pela rejeição que sua nova profissão provoca na esposa e nos amigos, que passam a evitá-lo. O período de solidão do protagonista rende algumas das cenas mais belas do filme, como aquelas em que ele toca Brahms no campo, ou observa os salmões nadarem contra a corrente do rio, no que parece ser um confronto sem sentido com a vida e a morte.

“A Partida” mistura humor e drama nas doses certas, e nunca é amargo ou depressivo. Há apenas uma tristeza muito doce, como aquela cantada por Vinicius de Moraes, que parece guardar sempre a esperança de um dia não ser mais triste. As visitas profissionais de Daigo o levam a ser testemunha de conflitos familiares, de pessoas que se foram antes de fazer as pazes com aqueles que lhes eram queridos, ou de feridas que permaneceram abertas por tempo demais. O cuidadoso roteiro trata a todos os personagens com respeito e afeto, fazendo com que os espectadores nos sintamos também parte de suas histórias, em especial na luta de Daigo para entender o significado da morte e buscar a reconciliação em sua difícil relação com o pai.

4 comentários:

Helvécio Jr. disse...

jogador,

no geral os japoneses são especialistas em produzir filmes com altas doses de reflexão interior. Acho que eles são especialistas nisso. Lembro-me de "Rapsódia em Agosto" por ex.

vou baixar esse filme.
abração e desejo-lhe um bom retorno à cidade dos contrastes. Cuidado com o bonde de Santa!

abraços.

Maurício Santoro disse...

Salve, meu caro.

Comentei com meu irmão como era necessário uma cultura sofisticada como a japonesa para produzir um filme tão bom e equilibrado sobre a morte.

Nem me fale do acidente... Parece que agora os bondes serão municipalizados.

abraços

Eduardo Matzembacher Frizzo disse...

Costumo acompanhar seu blog há algum tempo. Inclusive tomei a liberdade de colocar um link para o seu blog no meu blog. Porém poucas (ou nenhuma vez, não lembro) comentei seus textos daqui, os quais considero extremamente certeiros em suas pretensões e muito corretos em seus argumentos. Com esse filme certamente não é diferente, muito embora ainda não tenha assistido ao mesmo. Mas vou correr atrás. Continuarei aparecendo diariamente por cá. Um grande abraço, Eduardo. Blog:http://insufilme.blogspot.com.

Maurício Santoro disse...

Obrigado, Eduardo.

Cinema é sempre uma questão de gosto pessoal e alguns amigos não ficaram impressionados por este filme, mas torço para que você tenha uma opinião diferente.

abraços