segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Um Casaco de General



Reli por estes dias o excelente “Meu Casaco de General: 500 dias no front da segurança pública no Rio de Janeiro”, do cientista político Luiz Eduardo Soares. O livro é um relato de sua experiência como subsecretário de segurança no governo de Anthony Garotinho. Quando a obra foi lançada, em 2000, eu era um repórter recém-formado. Quase uma década depois, cursei mestrado e doutorado no Iuperj (onde Soares lecionava) e trabalhei em ONGs ligadas a seu trabalho. Estive com ele diversas vezes e gostei ainda mais do livro nesta segunda leitura.

Soares era um professor universitário que havia militado no Partido Comunista Brasileiro durante a ditadura militar e que na redemocratização passou a pesquisar o tema da segurança pública. Garotinho, um radialista carismático que foi eleito prefeito de Campos quando a cidade começou a receber uma enxurrada de royalties do petróleo. Isso o catapultou para o governo estadual, à frente de uma coalizão de partidos de esquerda. Ainda candidato, convidou Soares para elaborar o programa sobre segurança e os dois até assinaram juntos um livro a respeito do tema.

Os problemas começaram antes da posse. Garotinho era obcecado em ser visto como forte diante do crime, e nomeou um general do Exército para o cargo de secretário de segurança, que se cercou de oficiais militares como auxiliares. Soares ficou como o subsecretário encarregado dos projetos de cidadania e de diálogo com a comunidade. Um estranho no ninho, como ele deixa claro pelos relatos sobre o tenso convívio no órgão.



O governo queria usar Soares como um verniz social, de respeitabilidade intelectual, enquanto continuava tudo como antes na área de segurança. Mas os projetos de Soares começaram a conquistar simpatia da opinião pública, enquanto seus superiores se envolviam em uma trapalhada após a outra. As principais iniciativas lançadas por Soares foram a “Delegacia Legal”, remodelamento e modernização dessas instituições, e a criação do Instituto de Segurança Pública, que deveria ser o embrião para a formação do que seria na práticas uma nova polícia. Também desenvolveu projetos sociais nas favelas e estabeleceu uma excelente relação com a imprensa.

As reformas de Soares despertaram ojeriza e ele recebeu ameaças de morte. No livro, os crimes cometidos por policiais ganham mais destaque do aqueles perpetrados pelos bandidos comuns, sem farda ou distintivo. Os relatos de assassinatos, torturas, corrupção e estupros cometidos pelos homens de farda ou de distintivo são de arrepiar, mesmo para quem se acostumou à barbárie cotidiana do Rio de Janeiro.

Afinal, Soares acabou exonerado pelo governador, numa entrevista ao vivo para a TV Globo. De lá para cá, foi candidato derrotado a vice-governador do Rio e exerceu cargos de secretário em governos do PT – por alguns meses com o presidente Lula, por alguns anos na cidade fluminense de Nova Iguaçu. Talvez o mais importante tenha sido uma série de livros que escreveu com parceiros de fora da academia, como “Elite da Tropa”, com os policiais militares Rodrigo Pimentel e André Batista, e “Cabeça de Porco”, com o rapper MV Bill e o produtor musical Celso Athayde. Sua antiga equipe no governo estadual foi para a Universidade Candido Mendes, para o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania.

Vejo algumas de suas idéias influenciarem as atuais políticas públicas de segurança, mas de forma bastante diluída. Ele merece mais espaço.

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