sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

A Batalha pelo Partido Republicano

Mitt Romney venceu as primárias do importante colégio eleitoral da Flórida com cerca de 46% dos votos e ficou mais perto de conseguir a indicação dos Republicanos. Os eleitores conservadores são maioria, mas estão divididos entre três candidatos: Newt Gingrich, Rick Santorum e Ron Paul. Eles também eram a principal base de apoio de outros políticos, que desistiram da corrida (gráfico abaixo), como Rick Perry, Sarah Palin e Michelle Bachmann. Romney é o mais competitivo nacionalmente contra Obama por sua capacidade de atrair eleitores centristas, mas terá problemas como um Partido Republicano no qual o termo “moderado” passou a ser pejorativo. Este é um desdobramento recente e importante, que contraria uma tradição centenária da sigla.

O Partido Republicano nasceu das tensões da década de 1850, em torno da persistência da escravidão no Sul, de sua expansão para os novos territórios do Oeste e dos debates como como incorporar as levas crescentes de imigrantes. Os dois grandes temas da sigla eram a manutenção da União e de tarifas industriais altas. Foi bem sucedido em ambas, comandando a vitória na guerra civil e administrando o boom econômico que se seguiu. Os republicanos governaram os EUA quase sem interrupção por 50 anos, até a década de 1910. Os democratas haviam se reduzido a um pequeno partido regional do sul americano.

Isso começou a mudar com as grandes transformações sócio-econômicas da primeira metade do século XX: crescimento das cidades, mais migração de minorias religiosas (católicos, judeus) e a primeira leva de mudança dos negros para os centros industriais do norte, a partir da I Guerra Mundial. Os democratas se reestruturaram como uma aliança entre esses segmentos emergentes, mais progressistas, e os setores tradicionais do Sul. Era uma formidável combinação eleitoral, como demonstraram as quatro vitórias de Franklin Roosevelt e as de John Kennedy e Lyndon Johnson.

O ponto fraco da aliança era a pressão para expandir as reformas sociais para o Sul, o que ocorreu entre 1954-1965, destruindo o sistema de segregação racial e o secular domínio dos democratas na região. A classe média e a elite locais migraram em massa para os republicanos, como mostra o mapa abaixo. Os estados vermelhos são aqueles nos quais o partido obteve a maioria no colégio eleitoral nas disputas à presidência. É quase todo o sul, a exceção significativa é a Flórida. Os democratas se concentram nas principais zonas industriais: costa leste e oeste, e grandes lagos.

Essas regiões também elegeram políticos republicanos para governos estaduais ou senados, mas que em geral ficaram conhecidos por sua moderação e liberalismo, como Nelson Rockefeller em Nova York ou o pai de Mitt Romney no Michigan. Isso começou a mudar na década de 1950, com a ascensão de um tipo de político conservador mais radicalizado ideologicamente, primeiro nos temas da Guerra Fria, como o senador Joseph McCarthy, e mais tarde na oposição à expansão do governo federal (exceto em Defesa e segurança nacional). Sobretudo no Sul, onde o assunto era inseparável das tensões raciais – o senador Jess Helms é um bom exemplo. É um forte contraste aos republicanos de outra era, como o presidente Dwight Einsenhower, que aceitara as reformas do New Deal, ampliara o investimento público em infraestrutura, construindo uma excelente rede rodoviária, e alertara os Estados Unidos contra o risco do crescimento desmensurado do complexo industrial-militar.

Em boa medida essa nova guinada ideológica se deveu à mobilização política de movimentos religiosos, assustados com as rápidas mudanças da década de 1960 e com o que parecia ser o declínio americano no Vietnã e no Terceiro Mundo de modo geral. Esses grupos foram importantes no apoio a presidentes como Ronald Reagan e George W. Bush, ele mesmo um evangélico convertido.

Reagan e Bush foram habilidosos em criar coalizões que envolviam as várias facções dos republicanos: o meio empresarial, religiosos, libertários, neoconservadores, liberais. Não há hoje ninguém no Partido que consiga isso, em meio à rebelião das bases partidárias do Tea Party. Romney tem contra ele não só suas posições político-econômicas mas até sua religião – os mórmons são menos de 2% da população americana e em geral são vistos com desconfiança pelos eleitores conservadores, que tendem a considerar o grupo uma seita fechada. Um terço da população dos Estados Unidos sequer sabem que os mórmons são cristãos!

4 comentários:

Luiz Rodrigues disse...

Barry Goldwater rindo em seu túmulo!

Marc Jaguar disse...

Caro Amigo e Mestre Mauricio

Pelo que tenho conversado com as pessoas por aqui, mesmo as que se declaram simpaticas ao Partido Democrata, a maioria nao estah satisfeita com o desempenho do atual presidente americano. Todos sao quase unanimes em dizer que Obama eh muito bom de discurso mas nao eh nada bom em tomar atitudes e decisoes efetivas.
Isso nao quer dizer, obviamente, que os republicanos jah podem considerar a eleicao como ganha, longe disso!
Os dois candidatos, Romney e Gingrich tem quem os ame e quem os odeie dentro do Partido Republicano.
A principal duvida sobre Romney eh o fato dele ser mormom e ser rico e quanto a Gingrich, pesa um passado moralmente duvidoso em relacao ao seu casamento.
Na minha opiniao, Romney seria um candidato com um perfil melhor para enfrentar Barck Obama, mas Gingrich vem ganhando terreno nas primarias republicanas.

Forte abraco, Mauricio!

Goncalez

Diogo disse...

A popularidade crescente de Gingrich não é obra do acaso: ele é a cara do americano conservador típico. Discurso ultramoralista e prática depravada.

Aliás, se a mídia de lá (tão parcial e vendida a interesses excusos quanto a nossa...) caísse de pau nesse histórico familiar dele, Romney já teria liquidado a fatura faz tempo. Por muito menos, Gary Hart e Bill Clinton tiveram seus apuros por questões íntimas (com destinos diametralmente opostos, frise-se).

Mauricio, uma análise do Guardian mostra que o sumiço da Sarah Palin do mapa se deu porque esta apoia Gingrich de corpo e alma. Procede?

Maurício Santoro disse...

Salve, Luiz.

Vejo o Goldwater como um líder da transição do Partido Republicano. As opiniões liberais dele em temas de sexualidade seriam inaceitáveis para seus colegas de sigla de hoje em dia, embora em certos aspectos - sobretudo política externa - ele tenha antecipado parte do discurso de hoje.

Grande Marcelo,

Apesar dos truques do Romney com o fisco, acho que ele tem uma carreira política sólida, bastante experiência como governador, e é sem dúvida o candidato mais forte na disputa com Obama.

A economia vai ser o tema principal da eleição e acredito que os sucessos externos do presidente (como a morte de Bin Laden) vão dar dividendos eleitorais menores do que o esperado há um ano.

Tenho a impressão de que muita gente no Partido Republicano simplesmente não irá votar em novembro, caso o candidato seja Romney. Mas abstenção eleitoral nas presidenciais americanas é tradicionalmente alta, 2008 é que foi a exceção.

Salve, Diogo.

A razão principal para a saída da Palin foram uma série de desastres de relações públicas na campanha, em particular a incapacidade dela em discutir temas de Defesa e de segurança nacional.

Ela ganhou muito destaque no partido eletrizando a base conservadora em 2008, e é uma espécie de madrinha do Tea Party, mas não conseguiu se consolidar como uma mediadora com os setores mais moderados dos republicanos.

abraços