sexta-feira, 29 de abril de 2011

Dilma: a política externa dos 120 primeiros dias



Na terça-feira participei de mesa redonda sobre os 120 dias do governo Dilma Rousseff no Laboratório de Estudos Políticos da Fundação Getúlio Vargas. Falei sobre as mudanças na política externa, ressaltando três pontos: os esforços para retomar boas relações com os Estados Unidos, a nova ênfase no tema dos direitos humanos e a construção de um estilo próprio de diplomacia presidencial. Já comentei bastante a respeito do primeiro aspecto aqui no blog, portanto me concentrarei nos outros dois.

Dilma é a primeira chefe de Estado do Brasil a ter sido torturada e suas declarações sobre valorizar os direitos humanos na agenda diplomática criaram a expectativa de transformações significativas nesse campo, o mais frágil da política externa brasileira, sobretudo quando se trata de lidar com violações de liberdades civis e políticas. Opinei que podemos esperar ações de destaque relativas à memória das lutas contra as ditaduras no Cone Sul e discurso mais crítico com respeito a países vulneráveis como o Irã, mas que não acredito numa mudança abrangente.

Afinal, na visita de Obama ao Brasil e na viagem de Dilma à China, os direitos humanos estiveram ausentes, apesar da persistência das atrocidades cometidas pelo aparato de segurança dos Estados Unidos em suas guerras e das novas revelações do Wikileaks sobre a amplitute das torturas na base de Guantánamo. Com o dado novo de que na avaliação do governo americano, cerca de 40% dos quase 800 presos na instituição não oferecem perigo aos EUA. A situação também é grave na China, onde desde as Olimpíadas e dos protestos em Xinjiang e no Tibete, ocorreu uma onda repressiva que é a pior desde os massacres da Praça da Paz Celestial. A prisão do Nobel da Paz Liu Xiaobobo e do artista plástico Ai Weiwei são somente a ponta do iceberg da violência política chinesa.

Apesar do silêncio oficial brasileiro nos dois encontros de cúpula, na quarta-feira o chanceler Antônio Patriota falou no Senado sobre a necessidade de não tratar os direitos humanos como um responsabilidade exclusiva dos países em desenvolvimento, ressaltando que as nações ricas são também violadoras expressivas. Concordo com ele, e há também o racismo e a xenofobia cada vez mais presentes na Europa. Mas o discurso do ministro foi mais no sentido de não pressionar em demasia os regimes autoritários nos países do sul global, posição tradicional brasileira.

Outro ponto da minha palestra foi a rejeição do governo do Brasil à solicitação da Organização dos Estados Americanos para interromper as obras da usina de Belo Monte, no Pará, por conta das violações de direitos humanos da população indígena. Embora eu discorde de alguns pontos das orientações da OEA, todo o projeto sofre de um sério déficit democrático, marcado pelos interesses econômicos habituais do desenvolvimentismo brasileiro, com suas alianças entre o Estado e os grandes grupos empresariais e a pouca atenção dada aos setores mais pobres da população e aos temas do meio ambiente. Só que a sociedade – e o mundo – mudaram e hoje há muito mais sensibilidade social para esse tipo de discussão. Acredito que veremos bons debates, mas dependerá da capacidade dos movimentos sócio-ambientais em articular coalizões com outros segmentos da opinião pública.

Por fim, abordei a diplomacia presidencial de Dilma, frisando que ela tem brilho próprio, pela conjunção de sua história pessoal como vítima de tortura, o perfil gerencial-tecnocrata e por representar o Brasil no bom momento econômico vivido pelo país. Por sua trajetória de vida, pode falar a diversos públicos – imaginem, por exemplo, o impacto de discursos em que fale de sua experiência na ditadura para uma platéia como a dos países árabes onde ocorreram revoltas democráticas, ou em que examine as políticas públicas que coordenou como chefe da Casa Civil perante nações latino-americanas ou africanas, ávidas por medidas semelhantes. Não é por acaso que a revista Time a incluiu na lista das 100 pessoas mais influentes do mundo, à frente até de Hilary Clinton.

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