Desde a década de 1990 a China deixou de ser um país no qual o poder político é exercido de forma hiper-centralizada por um só homem, como fora no tempo de Mao Tsé-Tung ou mesmo no de Deng Xiaoping. O modelo atual é o de um sistema colegiado, cuja base são cerca de 200-400 pessoas que constituem o Comitê Central do Partido Comunista. Destas, 25 formam o Poliburo. O coração do Estado é o Comitê Permanente do Poltiburo, composto por um número variável entre 5 e 9 integrantes (foto). Todos civis – marca da notável subordinação das Forças Armadas ao Partido, ao contrário do que ocorre em outros regimes comunistas, como Coréia do Norte ou Cuba.
No outono deste ano o Comitê Permanente será renovado e um novo presidente será escolhido. Duas facções disputam o poder: a do atual mandatário, Hu Jintao e do premiê Wen Jiabao, é classificada como “esquerda” ou “populista”. É formada majoritariamente por tecnocratas que ascenderam de famílas pobres ou de postos políticos no interior do país. sua principal preocupação é com as desigualdades e problemas sociais trazidos pelo crescimento econômico acelerado e pelas reformas pró-mercado dos últimos 30 anos, com atenção para segmentos como camponeses e operários.
O outro grupo é chamado de “direita” ou “elitista” e se apóia sobretudo na nova classe empresarial e na nova classe média, com a manutenção do processo de modernização econômica. Dentro do Partido, seus expoentes são os “príncipes”, pessoas que ascenderam no aparato político a partir de postos ministeriais ou na cúpula militar ocupados por seus pais, como foi o caso do ex-presidente Jiang Zemin. Em geral são pessoas cujas carreiras estão ligadas ao próspero sul chinês, em cidades como Xangai e Cantão.
Hu e Wen terão que se aposentar em 2012 por conta de limites de idade e há, evidentemente, enorme especulação sobre quem poderia sucedê-los – Bo Xilai e Xi Jinping pela direita, Li Keqiang pela esquerda. As disputas entre as duas facções não são um jogo no qual o vencedor leve tudo: há inúmeros acordos, barganhas, distribuição de cargos etc. O grupo da esquerda tem prevalecido mas ambas as linhas compartilham objetivos essenciais, como a manutenção da alta taxa de crescimento econômico, a preservação da estabilidade e o desejo de restaurar o status chinês como uma grande potência. Os métodos desejados variam muito e pode-se esperar um acirramento de tensões nas circunstâncias da crise global, da redução do aumento do PIB, do agravamento de problemas ambientais e das pressões para que a China assuma maiores responsabilidades na política internacional.
4 comentários:
Maurício,
Sim, compreendemos mal a China. Muito mal. O país não é, como a antiga União Soviética não era (nem podia ser), nenhum monolito. Mas os jargões e preconceitos da Guerra Fria ajudam a embaralhar nossa visão. Hoje, a China é uma aristocracia no sentido clássico do termo: um governo de melhores, de iluminados, por um acaso, os membros do partido hegemônico (e não único), escolhidos dentro do seu esquema de cooptação e que ascendem mediante critérios "meritocráticos". A participação popular está essencialmente ligada à legitimidade dada, o que ao mesmo tempo em que dá mais blindagem aos dirigentes, também cria fantasmas - como das gigantescas manifestações do fim dos anos 80, o que levou a todas essas reformas estruturais na forma de mando, ascensão e liderança.
Não só: desde que uma profunda reforma política pôs fim às incertezas e inseguranças que prevaleceram até os anos 80, vivemos, hoje, o momento mais agitado no que toca à disputa entre as forças internas do Partido, uma vez que a crise mundial obriga o país a mudar o paradigma da política econômica, já que o mercado externo perde força e a saída volta-se para dentro. Isso tem impactos políticos profundos, pondo em xeque a direita do Partido, pois afeta a forma de administração - relativamente cômoda - do mundo do trabalho chinês, instituído há três décadas, e força muitas das reformas que a sua esquerda sempre desejou - além de provocar desconfortos no mito da estabilidade. Até bem pouco, dava-se como certa a ascensão de Xi Jinping, homem forte dos príncipes de Shangai, mas hoje nem tanto. Digo mais, mesmo que for, ele governará com muito menos tranquilidade que o seu antecessor, Hu Jintao.
abraços
Salve, Hugo.
Penso que a China é uma oligarquia - um governo de poucos. O Partido é uma via de ascensão social com caminhos abertos à meritocracia, mas também uma instituição extremamente autoritária e corrupta, na qual os laços de família e as relações pessoais contam muito.
O que a China tem de melhor, no meu entender, é o extraordinário espírito empreendedor de seu povo e sua capacidade de resistir às mais trágicas situações, como guerras, fome e os delírios grotescos de líderes como Mao.
Abraços
Me recordo de analisar as fraquezas estratégicas da China há 10 anos atrás. Como a política internacional mudou rápido, aquela análise já era...
Um dos grandes debates sobre a China é sobre seu papel internacional, se vai seguir sua realpolitik ou se seguirá o desenvolvimento pacífico. Tudo a ver com o grupo político que comanda o país. O que permanece ainda válido daquela análise de 10 anos atrás é o fato da região na qual a China se insere seguir um forte padrão "alliance against the threat". Não se fala muito, mas Taiwan, Coréia do Sul e Japão incrementaram muito seu poderio naval para manter o equilíbrio. viva o realismo na Ásia Oriental! bem mais interessante do que essas análises institucionalistas na UE.
abração,
Helvécio.
Pois é, meu caro. E ontem a estratégia de segurança nacional anunciada por Obama coloca a China como prioridade. Vamos ver para onde ruma esse gigante.
abraços
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