domingo, 30 de janeiro de 2011

A Dança dos Generais Egípcios



Os acontecimentos do fim de semana mostram o regime de Hosni Mubarak (foto acima, relaxando com o então presidente dos EUA) à beira do colapso. O ditador mudou todos os ministros e lançou a cartada de recorrer às Forças Armadas, criando o cargo de vice-presidente e nomeando para o posto o general Osmar Suleiman, comandante do serviço de inteligência. Ele tornou-se, na prática, seu herdeiro político. Isso significa que Mubarak abriu mão do projeto de criar uma dinastia, que prosseguiria com seu filho Gamal lhe sucedendo na presidência. A idéia era rejeitada pelos militares, que derrubaram a monarquia em 1952 justamente para acabar com o nepotismo e outras práticas que avaliavam manter o Egito no atraso econômico e na submissão às grandes potências.

A guinada de Mubarak explica-se pelo caos que se espalhou pelo país. Há protestos significativos em todas as principais cidades. No Cairo, a capital, os manifestantes queimaram a sede do partido do general e ocuparam prédios públicos importantes, como o Museu Nacional e Ministério das Relações Exteriores. O governo decretou toque de recolher das 16h às 8h, mas ninguém respeitou a ordem. Celulares ficaram fora do ar por 24h e a Internet foi derrubada, na tentativa (falha) de conter a rebelião. O Nobel da Paz, Mohamed El-Baredei, foi preso. A segurança pública foi afetada, com muitos saques e relatos de fugas de presidiários - segundo boatos difundidos pela população, eles teriam sido soltos de propósito pelas autoridades, que assim esperariam criar um clima de pânico que enfraquecesse os protestos e favorecesse a repressão política em nome da manutenção da lei e da ordem.

A polícia foi retirada das ruas e seu lugar foi ocupado por tropas do Exército, saudadas pela população, que sobe nos blindados para abraçar os soldados e lhes oferecer flores. O Egito é uma ditadura militar há 60 anos, mas as Forças Armadas têm excelente imagem junto à opinião pública, que em geral vê nelas as defensoras da soberania e da grandeza nacional (o Egito lutou 4 guerras entre 1948 e 1973, enfrentando Israel, França e Grã-Bretanha). Muitos manifestantes ainda levam fotos e cartazes que homenageiam o coronel Gamal Nasser, que governou o Egito nas décadas de 1950-60, quando o país liderava o movimento pan-arabista. A polícia, em contrapartida, é associada à corrupção e à tortura.



O general Suleiman (foto acima), o novo vice-presidente, viveu intensamente esse período turbulento. Serviu nas guerras de Nasser, treinou na União Soviética e nos Estados Unidos, seguindo as cambiantes alianças do Egito. Suas tarefas à frente da Inteligência são enormes: ele é responsável pela espionagem externa, por ações policiais domésticas e por muitos temas diplomáticos, em particular nas sensíveis relações com Israel, a Autoridade Palestina e os EUA. É, em suma, um homem de fidelidade extrema ao regime, e alguém em quem os países ocidentais confiam.

O apoio internacional a Mubarak se deteriorou rapidamente ao longo da última semana. Os Estados Unidos começaram elogiando seu regime, mas a partir do discurso de Barack Obama, na sexta-feira, passaram a solicitar que ele aceitasse a legitimidade dos protestos, e o ameçam com corte de ajuda militar, caso continue a usar a violência contra os manifestantes. Documentos oficiais divulgados pela imprensa britânica mostram que os EUA têm apoiado a oposição democrática, protegendo ativistas e financiando a organização de atividades. A União Européia também critica Mubarak pelas ações repressivas e os países árabes têm mantido silêncio, com exceção da Arábia Saudita, que o defende. A Liga Árabe emitiu declarações moderadas pedindo por soluções pacíficas, a mesma posição adotada pelo Brasil, de quem o Egito é um parceiro de importância crescente - há um recente acordo de livre comércio com o Mercosul, que ainda não entrou em vigor.

Os protestos continuam apesar das mudanças no governo. É improvável que as Forças Armadas aceitem ordens de reprimir com violência as manifestações, seria um banho de sangue. Mubarak pode se deparar com pressões dos militares para deixar a presidência, ou mesmo ser deposto por um golpe. Há relatos de que a família do general já teria fugido para a Inglaterra, por precaução. A crise continua, e as probabilidades agora estão contra o ditador.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

A Batalha do Egito



Nada é mais poderoso do que uma idéia cujo tempo chegou.
Abraham Lincoln

Hoje é sexta-feira, dia sagrado no islã. A rebelião no Egito prossegue com duas notícias contraditórias e explosivas: a entrada da Irmandade Muçulmana nos protestos e a chegada ao Cairo do homem que é o principal adversário político do presidente Hosni Mubarak: o diplomata Mohamed El-Baradei, que chefiou a Agência Internacional de Energia Atômica e recebeu o Nobel da Paz por seu trabalho na instituição. Simultaneamente, a onda de manifestações alcançou o Iêmen, onde a população pede ao presidente que siga o exemplo do ditador deposto da Tunísia, e fuja para a Arábia Saudita.

O Egito é a peça-chave na engrenagem das revoltas, ocupando um espaço semelhante ao da Alemanha em 1989. Além de ser o país mais populoso e de maior economia entre as nações afetadas pelos protestos, é um ator importante nos processos de guerra e paz no Oriente Médio e foi o centro tanto do pan-arabismo quanto do fundamentalismo islâmico. Agora, uma vez mais, os acontecimentos do Cairo ditam o ritmo para o resto do mundo árabe.

A Irmandade Muçulmana foi fundada na década de 1920 e ao longo do século XX foi uma força minoritária diante do nacionalismo secular que predominou no Egito sob o governo de Nasser, nos anos 50 e 60. Mas ela ganhou influência devido ao fracasso dos projetos de desenvolvimento econômico e das derrotas militares para Israel. A Irmandade realizou diversos atos terroristas, desde os tempos da monarquia e passou a maior parte de sua existência como uma organização clandestina. Atualmente, é proibida no país, mas exerce seu poder por meio de instituições de fachada. Sua decisão de entrar nos protestos é explosiva, e pode alterar o rumo das manifestações.

Já El-Baradei é uma alternativa de peso para os Estados Unidos, caso a situação de Mubarak chegue a um nível de tal fragilidade que ele não consiga mais se manter no poder. O reformismo moderado defendido por El-Baradei responde aos anseios americanos de um Egito estável que apóie Israel e seja uma barreira ao fundamentalismo islâmico. A questão é saber se o político conseguirá dialogar com os jovens e dinâmicos ativistas que têm sido o motor dos protestos egípcios.

Eles têm se mostrado extraordinariamente criativos e corajosos, sobretudo no uso das novas tecnologias de comunicação. Em resumo: usam o Facebook para marcar a data dos protestos, o Twitter para discutir logística e maneiras de atuação, e o You Tube para divulgar imagens dos enfrentamentos com a polícia. Impressionante por qualquer padrão de análise.

Seu exemplo contagiou até o mais pobre dos países árabes, o Iêmen, onde aliás o Egito de Nasser interveio de modo desastrado numa longa guerra civil. Os manifestantes reagem a uma decisão do parlamento que permitiria a reeleição sem limites do presidente Ali Abdullah Saleh e criticam em especial o péssimo estado da economia local.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Protestos no Egito: um 1989 árabe?



É possível que estejamos vivendo um "1989 árabe", ou ao menos, magrebino. Depois da rebelião na Tunísia, os impressionantes protestos contra a ditadura de Hosni Mubarak no Egito levantam a chance de uma mudança importantíssima, com consequências para o Norte da África e para o Oriente Médio.

escrevi neste blog sobre o longo declínio do Egito nos últimos 30 anos. O país que foi um dos centros mais importantes do pan-arabismo tornou-se uma ditadura estagnada economicamente, com um regime decrépito e sem apelo ideológico. As especulações sobre a capacidade do general Mubarak em transmitir o poder a seu filho ganharam nova intensidade com o impacto da rebelião democrática na Tunísia, cujo efeito no Egito tem sido devastador.

Os protestos atuais são as mais impressionantes manifestações públicas desde os dias de Nasser - ainda mais significativos porque desta vez ocorrem contra o governo, o que não é pouca coisa diante de um regime autoritário com longo histórico de violência contra seus opositores, sejam os democráticos, sejam os fundamentalistas islâmicos - e o Egito é um dos berços do movimento.

À semelhança da Tunísia, a incipiente rebelião egípcia é motivada pela falta de oportunidades econômicas e pelo desgosto com a corrupção no governo. Internet, celulares e novas mídias desempenham papel importante na organização e mobilização dos manifestantes. A juventude tem sido protagonista, de modo trágico: enquanto escrevo, já foram seis os rapazes que atearam fogo ao próprio corpo, seguindo o exemplo do rapaz tunisiano cujo suicídio detonou a rebelião.

Há, porém, um elemento fundamental que torna o Egito um caso muito mais explosivo que a Tunísia: o país tem papel-chave no conflito árabe-israelense, sendo desde a década de 1970 um aliado dos Estados Unidos e tendo assinado um acordo de paz com Israel. A guinada diplomática veio após 25 anos de guerras e uma aliança malsucedida com a União Soviética, e custou a vida ao presidente Anwar Sadat. Seu sucessor, Mubarak, aprendeu a lição e reprimiu duramente os dissidentes, introduzindo reformas muito tímidas, sobretudo no sentido de um pouco mais de autonomia ao judiciário.

A teoria da paz democrática afirma que regimes dessa natureza não travam guerras entre si. Essa formulação foi feita pensando basicamente nos casos da Europa e da América do Norte e não num cenário regional marcado pela polarização política e intensos conflitos nacionais, religiosos e culturais. Uma mudança de regime no Egito provavelmente trará, pelo menos no curto prazo, mais instabilidade ao Oriente Médio, pois os líderes do país terão que lidar com fortíssimas pressões de sua base social para, digamos, ações mais decisivas em defesa dos palestinos em Gaza. Contrabalanceada pelo que será enorme campanha internacional para que o governo no Cairo mantenha sua posição diplomática diante das alianças da região.

Ainda é cedo para prever se os manifestantes conseguirão depor Mubarak, ou se o ditador conseguirá se manter no poder por meio de uma combinação de repressão e reformas pontuais. Mas me impressionou a declaração de um dos rapazes rebeldes, afirmando que quer mudar o regime, e não apenas o presidente. Ventos de mudança sopram pelo mundo árabe.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Rebelião na Tunísia e Democracia no Mundo Árabe



O acontecimento político mais importante do mês de janeiro foi a revolta popular na Tunísia, que derrubou a ditadura de um quarto de século de Ben Ali e instalou um governo provisório que pode, se as coisas correrem bem, transformar o país numa democracia. Seria o primeiro movimento desse tipo no mundo árabe e um precedente perigoso para os regimes autoritários no Norte da África e no Oriente Médio.

A Tunísia é um país bastante próspero para os padrões árabes. Cerca de um terço da população pode ser considerado de classe média, a renda per capita é o dobro daquela registrada no Egito e o crescimento econômico era exatamente um dos pilares da ditadura de Ben Ali, junto com sua repressão implacável aos fundamentalistas islâmicos.

O regime era considerado muito estável, mas agora está claro que suas fissuras foram subestimadas. A mais importante delas era a insuficiência do nível de desenvolvimento econômico em suprir as expectativas de uma população cada vez mais educada, sobretudo entre os mais jovens.

O estopim da crise foi a tragédia de Mohamed Bouazizi. O rapaz havia se formado na universidade, mas sem emprego teve que trabalhar como vendedor de rua. Quando autoridades corruptas confiscaram sua barraca, sua angústia foi tão grande que ele se suicidou em plena rua, colocando fogo ao próprio corpo. Muitos se identificaram com seu sofrimento e ele virou um símbolo para as injustiças do país, inclusive para a rede de corrupção que ia da família Ben Ali aos funcionários mais subalternos do Estado.

Embora Ben Ali fosse militar, em seu longo governo o Exército foi reduzido a um papel secundário e a polícia política ganhou proeminência. As Forças Armdas se vingaram recusando proteção ao ditador em meio às grandes mobilizações populares que derrubaram seu regime. As novas mídias foram importantes, das transmissões da Al-Jazeera às redes sociais da Internet.

Reza a crônica de 1789 que quando foi avisado da queda da Bastilha, Luís XVI perguntou se era uma rebelião. O nobre que o alertou respondeu: “Não, sire, é uma revolução.” Ainda não está claro se os acontecimentos na Tunísia resultarão na transformação estrutural do país, mas os ditadores árabes estão assustados, em especial na Argélia e no Egito, os países cuja situação social mais se parece com a tunisiana.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Bailarina



Maritza Garrido era uma promissora bailarina e professor de dança no Peru, até ser presa em 1992, numa operação policial espetacular que capturou, em sua casa num bairro de classe média de Lima, o líder do Sendero Luminoso, Abimael Guzmán. O “presidente Gonzalo”, ou a “quarta espada do comunismo”, como ele se autodenominava, já havia sido objeto da excelente biografia escrita por Santiago Roncagliolo. Mas Maritza continuava pouco conhecida, até que esta semana o jornalista inglês Nicholas Shakespeare publicou um ótimo perfil sobre ela.

Shakespeare escreveu dois romances sobre o Sendero, sendo que o mais famoso deles, The Dancer Upstairs, foi adaptado para o cinema, no filme “Guerrilha sem Face”, dirigido por John Malkovich. A trama é uma ficcionalização da ascensão e queda do Sendero, no qual a personagem Yolanda, inspirada em Maritza, tem papel decisivo. Mas Shakespeare não a conhecia pessoalmente até agora, ao visitá-la na cadeia onde ela cumpre pena de 25 anos por ter abrigado Guzmán em sua casa.

Yolanda é uma mulher misteriosa e o espectador nunca sabe por que ela aderiu ao Sendero. A conversa de seis horas de Shakespeare com Maritza ajuda um pouco a compreender seu percurso. Jovem de família privilegiada, muito religiosa, que pensava em ser missionária. O Sendero apareceu como uma promessa de idealismo e de mudança radical da sociedade, mesmo que às custas de um banho de sangue que matou 70 mil pessoas em 12 anos de confronto.

O grupo não foi totalmente desmantelado com a prisão de Guzmán e remanecentes atuam na Amazônia peruana, há pouco foi descoberto que tinham planos de assassinar o ministro da Defesa para marcar o aniversário de 30 anos do Sendero. É certo que o idealismo pode com frequência ser a recusa em aceitar a realidade imperfeita em que vivemos e levar a surtos de violência, mas ainda assim é difícil ligar os pontos que transformaram Maritza numa seguidora fanática de Guzmán, em vez de uma simpatizante de salão, que executasse pequenas tarefas.

Entender essa trajetória é um desafio para todos que se interessam pelo Peru, pois só desse modo será possível compreender como o movimento político mais sanguinário da América do Sul foi fundado e comandado por pacatos professores de província .

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A Agenda Internacional da Defesa



Há duas semanas recebi convite de uma revista chilena para escrever um artigo sobre a agenda internacional da política de Defesa do Brasil. Preparei um texto analisando as principais iniciativas ao longo do governo Lula e apontando para a importância crescente do tema – afinal, no Chile e na Colômbia políticos chegaram à presidência em função de seu desempenho como ministros da Defesa.

Naturalmente, o quadro brasileiro é outro. O país não tem 60 anos de conflito armado, como os colombianos, e as feridas da ditadura militar não tem a abrangência daquelas dos chilenos. A própria dimensão econômica e territorial do Brasil e as ambições de sua política externa, dão à Defesa outras características. Destaquei dois pontos: a importância das políticas de compras governamentais na indústria bélica e as ações de segurança internacional na América do Sul.

O orçamento da Defesa cresceu muito sob Lula, embora em grande medida o aumento seja na verdade para remediar o sucateamento dos equipamentos militares e melhorar (ainda não de maneira satisfatória) a remuneração dos oficiais. As decisões mais expressivas foram o programa de compras de US$22, 5 bilhões em caças, submarinos e helicópteros, com a transferência de tecnologia para as Forças Armadas e para empresas privadas de fortes vínculos com o Estado, como a Embraer. A jóia da coroa é, claro, o projeto do submarino nuclear.

Abordei as polêmicas que envolvem a aliança com a França e ressaltei que o Brasil também desponta como fornecedor de tecnologia, via contratos de offset, para países vizinhos como Argentina e Colômbia, na sempre importante área da aviação militar.

A América do Sul é foco de diversas preocupações de segurança do país e frisei a agenda que se consolidou a partir da publicação da Estratégia Nacional de Defesa, envolvendo temas como a proteção de comunidades de brasileiros no exterior, a criação do Conselho de Defesa Sul-Americano, a mediação de crises na região, em particular nos Andes, os receios na Tríplice Fronteira, a integração sul-americana na missão da ONU no Haiti... Observei, no entanto, que há muitas discrepâncias entre a visão das Forças Armadas e as posições do Itamaraty e da Presidência da República. Como lidar com a Venezuela é um exemplo explosivo dessas disputas.

Abordei ainda a chamada “Amazônia Azul”, isto é, o Atlântico Sul, com os debates da Marinha acerca do pré-sal, da proteção à zona econômica exclusiva e os planos de criação de uma segunda esquadra, baseada no Norte e no Nordeste, com uma ampla base naval na foz do Amazonas.

Foi, enfim, uma bela encomenda dos amigos chilenos, que me fez pensar bastante a respeito da Defesa. Quero ler, pesquisar e escrever mais sobre ele em 2011.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Um Balanço da Cooperação Brasileira



Na semana passada, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em parceria com a Agência Brasileira de Cooperação, divulgou um importante estudo sobre a cooperação do Brasil para o desenvolvimento internacional. A pesquisa é a primeira abrangente a respeito do tema e cobre o período entre 2005 e 2009. Examina mais de 100 órgãos governamentais e concluiu que o país gastou cerca de R$2,9 bilhões em cooperação internacional nesses anos. A quantia é baixa para os padrões das nações desenvolvidas, ou mesmo para a de potências emergentes como China e Índia, mas os dados recolhidos pelo Ipea apontam características fundamentais da abordagem brasileira.

Cerca de 75% do total dos recursos foi em doações a organizações internacionais, sobretudo do sistema ONU, como FAO, OMS, Unesco, OIT. Outros 10% foram bolsas de estudo que o Brasil concede a estudantes estrangeiros oriundos de países em desenvolvimento.

O tipo de projeto social que a maioria das pessoas associa à cooperação internacional foi classificado pelo Ipea sob as rubricas de “assistência humanitária” e “cooperação técnica”. São atos como doações de alimentos e remédios após um desastre ambiental, ou a ida de missões brasileiras para treinar funcionários públicos estrangeiros em desenvolvimento agrícola ou vacinação contra a febre aftosa. São os chamados “projetos estruturantes”, para fortalecer a capacidade institucional dos Estados beneficiários. Ao contrário dos países ricos e organizações multilaterais de crédito, o Brasil não impõe condicionalidades para fornecer auxílio.

Essas modalidades de cooperação tem crescido bastante – 6 vezes no período analisado – e tendem a aumentar, com os planos do governo em fortalecer a Agência Brasileira de Cooperação. Em termos geográficos, concentram-se na América Latina e Caribe (76%), Ásia (16,5%) e África (7,25%). A maior parte foi para distribuição de suprimentos a países caribenhos devastados por furacões,creio que o grande percentual asiático se explica por Timor Leste e talvez pelo auxílio à Indonésia, após o Tsunami. Na cooperação técnica, 70% das verbas foram para o treinamento de funcionários estrangeiros. De modo geral, a ajuda brasileira está ficando mais intensa no nível bilateral, com menor envolvimento de organizações multilaterais.

Outro ponto interessante do estudo são os dados sobre refugiados. O Brasil acolheu no período apenas 4.300 pessoas, a maioria de Angola (40%) ou da Colômbia (14%). É uma quantidade modesta e certamente o país poderia fazer mais.

A pesquisa lançada pelo Ipea já é uma referência fundamental para aqueles que querem entender os novos papéis internacionais que estão sendo desempenhados pelo Brasil e a força da agenda de cooperação para o desenvolvimento irá aumentar, com a atuação mais intensa das empresas brasileiras no exterior, e o engajamento crescente das Forças Armadas em missões de paz da ONU.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Fora da Lei



O cineasta Rachid Bouchareb já havia nos brindado com "Dias de Glória" (Indigènes) um ótimo filme sobre os laços dolorosos e contraditórios entre Argélia e França a partir da experiência dos soldados argelinos que ajudaram a libertar os franceses do jugo nazista na Segunda Guerra Mundial. "Fora da Lei" é um novo épico, igualmente poderoso, que conta a história de uma família devastada pelas lutas de independência da Argélia.

O filme cobre o período de 1925 a 1962 e é centrado na saga de três irmãos que crescem na pobreza quando seus pais perdem as terras durante o corrupto regime colonial. Adbelkader é um intelectual preoce que se junta aos militantes pró-independência e participa dos protestos de Sétif, quando o Exército francês matou diversos ativistas nacionalistas no mesmo dia em que acabou a Segunda Guerra Mundial. Preso, Abdelkader vai cumprir a pena na França. Messaoud alista-se nos páraquedistas e luta na Indochina, onde testemunha a derrota do império francês para os vietnamitas. Said quer ficar fora da política, e temeroso da guerra, leva a mãe para morar numa favela nos arredores de Paris, onde acaba por se tornar um pequeno gangster, explorando prostituição e cabarés.

Na prisão, Abdelkader torna-se um aguerrido militante da Frente de Libertação Nacional, e uma vez solto reune-se aos irmãos e começa a organizar os argelinos na França para apoiar a guerra de independência. Messaoud, transformado pelo que viu na Indochina, alia-se a ele. A causa da FLN pode ser nobre, mas seus métodos são questionáveis e envolvem assassinato de rivais e dissidentes e a estratégia de provocar o Estado francês, esperando ganhar adeptos com a radicalização.

A maior parte do filme é centrada nesse esforço de organização política - uma espécie de "A Batalha de Argel" centrado no front francês e com algumas passagens na Alemanha e na Suíça, países em que a FLN montou bases importantes. O foco do cineasta é nas relações de família e nos ciclos de amizade, afastamento e lealdade entre os três irmãos. Há poucos personagens franceses de destaque, como um coronel do serviço secreto que persegue Abdelkader e uma simpatizante do FLN que se sente atraída por ele.

"Fora da Lei" é um épico com heróis falhos e cheios de defeitos e possivelmente sua visão sombria da história não agradará nem a franceses nem a argelinos. Que bom. O mundo tem nacionalismo extremista em excesso, um pouco de senso crítico diante da tragédia da política não fará mal a nenhum espectador.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Terrorismo à Americana



O atentado contra a deputada americana Gabrielle Giffords (foto) é uma demonstração assustadora do nível de polarização política no país. No entanto, é difícil acreditar que o ataque tenha impacto significativo na des-radicalização dos debates. As causas são muito profundas e dizem respeito ao acirramento das desiguldades sociais e da erosão da classe média dos EUA ao longo dos últimos 30 anos.

Giffords era um alvo improvável para um atentado. A parlamentar pertence a ala mais conservadora do Partido Democrata e havia discordado do governo Obama em temas importantes como controle de armas e orçamento. O que a tornou vítima do ataque foi, provavelmente, sua posição contrária à polêmica lei de imigração do Arizona. Embora a deputada defenda medidas mais rigorosas, não endossou a legislação aprovada pelo estado.

O perfil do atirador se parece com o de tantos jovens violentos, descontrolados e mentalmente perturbados que cometem esse tipo de massacre. Há muitas semelhanças entre Jared Loughner e os pistoleiros dos atentados em escolas e universidades, como Columbine no Colorado. O que espantou em Loughner foi sua eficiência como assassino: matou seis pessoas (incluindo uma menina de 9 anos) e feriu 14. Giffords foi ferida na cabeça e sua recuperação é incerta.

Segundo os relatos de parentes e amigos, Loughner não era muito interessado em política. Podemos especular sobre o que o levou a cometer um atentado contra um comício onde o alvo principal era uma deputada. Ataques desse tipo são raros nos EUA, os últimos ocorreram no século XIX, nos anos de extrema tensão que antecederam a guerra civil, e no período posterior a ela, quando parlamentares negros foram agredidos.

É preciso um quadro de enorme polarização para transformar um solitário arredio como Loughner num terrorista político que tem como vítima uma democrata conservadora, muito longe do perfil de uma extremista de esquerda. Não é algo que venha do Tea Party, ou da reação de movimentos populistas a Obama. Nos anos 90, vale lembrar, houve atos semelhantes, como a explosão do prédio federal em Oklahoma.

Penso que não há uma ligação precisa do tipo causa-e-efeito - a lei de imigração do Arizona talvez seja o estopim mais próximo. Trata-se antes de um reflexo violento do clima de ansiedade, medo e desencanto que tomou conta dos Estados Unidos. Efeitos agravados pela persistência da crise econômica e com as reações assustadas dos segmentos mais conservadores ao declínio dos EUA e às mudanças na política, como a ascensão de Obama.

Diante desse quadro, não espanta que os progressistas nos Estados Unidos sonhem com um país melhor e outro modelo de nação.... como o Brasil.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

A Guerra Fria na América Latina



Um professor que tive na Argentina costumava dizer que quando estudamos apenas a história de nosso país, achamos que certas coisas aconteceram somente nele. Mas quando adotamos uma perspectiva mais ampla, que abarque toda a América Latina, vemos de forma mais clara as tendências regionais. O excelente e recém-publicado livro de Hal Brands, “Latin America´s Cold War” aplica esse enfoque cosmopolita ao conturbado período da Guerra Fria, com grande quantidade de fontes em diversos países.

Brands critica a literatura especializada nas relações entre Estados Unidos e América Latina – obras como “Talons of the Eagle”, de Peter Smith e “Beneath the United States”, de Lars Schoultz – por atribuir a Washington influência exerada sobre os destinos da região, deixando de ver os países do continente como atores de sua própria história. Sua abordagem é mais matizada e mostra como a ação política regional por vezes segue rumos inesperados e indesejáveis para os EUA, como nas negociações de paz nas guerras civis da América Central, no papel ativo desempenhado pela OEA e, claro, nos desdobramentos da Revolução Cubana.

A Guerra Fria representou uma “longa paz” para as grandes potências, mas na América Latina foi um período marcado por intensa violência política e polarização ideológica, lembra Brands. Ele vê a época como uma crise do processo de modernização regional, com classes médias em ascensão questionando regimes oligárquicos e galvanizada pelo modelo cubano. Idéias desempenharam papel de destaque nessa radicalização e Brands examina as doutrinas de segurança nacional, as teorias da modernização e da dependência, a teologia da libertação e os argumentos guevaristas do foco guerrilheiro.

Como em outras partes do planeta, a Guerra Fria latino-americana teve várias etapas, indo das tentativas de reforma social da Aliança para o Progresso patrocinada por John Kennedy à violência extrema que se seguiu à Revolução Sandinista na Nicarágua. Nos anos 70, o declínio dos EUA no Vietnã e foi percebido pelos países da região como a oportunidade para um intenso ativismo diplomático, no Brasil de Geisel, no México de Echeverría, na Venezuela de Carlos Andrés Pérez e em vertentes mais à esquerda no Chile de Allende e no Peru de Velasco Alvarado.

A Guerra Fria foi um período de intenso sofrimento na América Latina e podemos apenas especular como os conflitos sociais da região teriam transcorrido em um ambiente internacional mais ameno. Brands é pessimista em sua análise do continente na década de 1990, ao passo que tenho uma interpretação mais positiva, sobretudo diante do desempenho econômico dos últimos anos.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Política Externa e Combate ao Racismo



O Brasil é independente há quase 190 anos, e tem a maior população negra do planeta, depois da Nigéria. No entanto, é somente agora que o país tem seu primeiro embaixador de carreira negro (na década de 1960 houve políticos negros nomeados para o cargo). O diplomata em questão, Benedicto Fonseca Filho (foto), é filho de um funcionário administrativo do Ministério das Relações Exteriores e por conta disso viveu quando criança na Europa, estudando em boas escolas. Aos 47 anos, é também o mais jovem entre os embaixadores do Brasil.

Fonseca assumirá a direção do departamento de Ciência e Tecnologia da chancelaria, e torço para que o segundo, terceiro, quarto e por aí vai embaixadores negros apareçam num tempo mais curto do que os dois séculos necessários para que surgisse o primeiro. De fato, a política externa tem se aproximado das políticas sociais, inclusive no combate ao racismo e na promoção de igualdade racial.

Há dez anos o Ministério das Relações Exteriores estabeleceu um programa de ação afirmativa que concede bolsas de estudos a negros que querem ingressar na diplomacia. Tive muitos bons alunos beneficados pela iniciativa e vários deles tornaram-se diplomatas. Neste ano, a chancelaria instituiu outra modalidade, pela qual haverá acréscimo de 10% das vagas na segunda fase do concurso de admissão (são quatro etapas, no total), reservadas a negros.

Ter um serviço diplomático que reflita a composição étnica da população brasileira não é somente uma questão de justiça, é também um ativo importante para a política externa. Quando o Brasil iniciou sua reaproximação dos países africanos, na década de 1960, um dos elementos mais frágeis da retórica era a aposta no mito da “democracia racial” brasileira. Essa imagem desmoronou no contato dos líderes das novas nações da África com a sociedade do Brasil, e no apoio do governo brasileiro ao colonialismo de Portugal no continente.

Hoje é outro Brasil que dialoga com uma África renovada e talvez o melhor exemplo sejam os movimentos políticos e culturais da diáspora negra, abarcando também Estados Unidos, Caribe, os migrantes na Europa. As conferências da ONU contra o racismo têm sido um marco importante na internacionalização desse movimento, e poderiam ter ocorrido no Brasil, caso o governo e a sociedade tivessem se mobilizado para isso.

Os esforços brasileiros também passam uma mensagem importante para a América Latina, sobretudo para aqueles países nas quais as questões indígenas estão em grande evidência (Bolívia, Equador, Peru). Os equatorianos tiveram uma chanceler indígena, Nina Pacari – a quem entrevistei em Quito, e que muito me impressionou.

E o Brasil está deixando de ser uma nação marcada pela exclusão para tornar-se uma espécie de farol, quase de conto de fadas, de possibilidades de ascensão social. Um lugar meio mágico onde operários e mulheres torturadas viram presidentes, negros servem como embaixadores e pessoas de todas as cores e trajetórias de vida acreditam piamente que sua vocação é a felicidade. Oxalá seja assim. O mundo precisa de esperanças desse tipo

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Wikileaks e as Funções da Diplomacia



Passadas algumas semanas da polêmica da recente onda de documentos oficiais vazados pelo Wikileaks, continuo a acreditar que a discussão foi exagerada, e que as revelações dos textos foram pouco expressivas, bem menos do que os Papéis do Pentágono provocaram durante a Guerra do Vietnã, por exemplo. Contudo, conversas com amigos, me convenceram da enorme importância pedagógica dos Wikileaks para explicar o que afinal fazem os diplomatas.

Comecemos com um pouco de história. A diplomacia como a conhecemos hoje é bastante recente. Na Antiguidade e na Idade Média, não havia embaixadas e consulados permanentes, apenas enviados temporários que iam negociar um acordo de paz ou um tratado qualquer. A mudança se iniciou no Renascimento, mas foi lenta e gradual. O quadro que ilustra este post, “Os Embaixadores”, de Hans Holbein, é de 1533 e mostra um dos esforços clássicos de curta duração: uma delegação conjunta de um nobre e um bispo franceses, para tentar convencer o rei inglês a permanecer na Igreja Católica. Imagine o que Wikileaks teria feito com Ana Bolena...

As três funções clássicas do diplomata são representar, informar e negociar. Talvez se possa dizer que elas tiveram seu apogeu entre os séculos XVI e XIX. O advento de comunicações e viagens mais rápidas retirou muito do poder que os antigos embaixadores possuíam em falar em nome de seu soberano ou de seu país. Hoje em dia, muito da política internacional de alto escalão se dá diretamente entre chefes de Estado ou ministros das Relações Exteriores. O próprio cargo de embaixador era muito restrito, quase sempre vinculado às relações entre grandes potências ou países que se valorizassem bastante mutuamente – o Brasil só teve seu primeiro no século XX, Joaquim Nabuco, em Washington - e só se generalizou depois da Segunda Guerra Mundial.

Quanto à informação fornecida pelos diplomatas, a leitura dos despachos da Wikileaks mostram que há pouco nos documentos que um leitor atento do noticiário internacional desconheça. As análises são corretas, às vezes até sofisticadas e divertidas, mas dificilmente superam um correspondente bem-informado, digamos, da Economist ou do Financial Times ou um acadêmico especializado no país em questão.

Há surpreendemente pouca reflexão dos diplomatas a respeito de como sua profissão tem sido transformada pelas novas tecnologias das últimas décadas, talvez pelo impacto que esses desenvolvimentos têm em seu prestígio e influência. A diplomacia continua a ser muito importante, naturalmente, mas a mer ver precisa mudar bastante, adotar perfis profissionais mais especializados e um ethos mais tecnocrático e menos preso aos rituais formais do passado. Há iniciativas promissoras como os esforços do Departamento do Estado dos EUA em lidar com a “diplomacia pública” dos meios de comunicação e dos cidadãos interessados pelos assuntos globais.

Temo que os Wikileaks, pelo medo que despertaram nos governos, detonem uma espécie de contrarrevolução nessa área, mas acredito que neste caso a história seguirá o ritmo da tecnologia, para frente.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Reconstrução



Neste semestre devo lecionar dois cursos que envolvem o tema das relações raciais nos Estados Unidos, sempre com a perspectiva de discuti-las na com respeito à formação e às mudanças da democracia americana. Comprei uma série de bons livros que tratam de períodos nos quais esses temas foram decisivos, em particular a guerra civil e a época imediatamente posterior, conhecida como “Reconstrução” (1865-1877), abordado no ótimo “A Short History of Reconstruction”, de Eric Foner.

Até recentemente, a narrativa oficial era de que a Reconstrução havia sido um erro histórico, um esforço vingativo dos nortistas vitoriosos em impor seu modo de vida aos sulistas derrotados na guerra civil. Essa abordagem começou a mudar nos anos 1960, quando o movimento dos direitos civis fez muitas pessoas olharem o passado de maneira diferente, questionando o racismo e a persistência da discriminação. Nessa nova perspectiva, a Reconstrução passou a ser vista como a tentativa de implementar a “segunda revolução americana”, ou seja, consolidar o ideal de 1776 também para os antigos escravos, incorporando os negros às instituições políticas do país.



Foner conta como esse projeto ambicioso fracassou. A derrota não era inevitável: os senhores de escravos do sul haviam sido vencidos na guerra, suas plantações destruídas e o governo federal tinha novos poderes e recursos financeiros à sua disposição, adquiridos ao longo dos anos de conflito. Cerca de 200 mil negros haviam servido no Exército da União e conquistado um novo sentido do próprio valor e dignidade. A escravidão fora abolida e novas emendas constitucionais garantiam os direitos de todos os cidadãos, independente da cor da pele. Os estados do sul promoveram reformas e promulgaram novas constituições, mais democráticas para os brancos pobres e em muitos casos incorporando negros aos cargos públicos, nos governos locais e no Congresso, em Washington.

Contudo, Foner mostra não havia consenso no partido Republicano, que conduzira a guerra, com relação ao nível de apoio que o governo federal deveria dar aos ex-escravos. Projetos de reforma agrária foram abandonados e muitas autoridades estavam mais preocupadas em forçar os negros a voltar a cultivar algodão, fundamental para o comércio exterior dos EUA. Em muitos casos as plantações apenas mudaram de dono, dos antigos aristocratas sulistas para os novos interesses empresariais do norte. A reação do sul foi intensa, e o partido Democrata correu para aproveitar a oportunidade – consolidou-se como a força hegemônica na região até a década de 1960!

Os conflitos não se limitaram à esfera das instituições. Os novos limites das relações entre brancos e negros foram definidos muitas vezes pela violência, com o surgimento de grupos paramilitares (como a Ku Klux Klan) e a explosão de tumultos, linchamentos e pogroms racistas que parecem saídos de um Estado como a Rússia czarista.



As disputas políticas foram agravadas com a eclosão da depressão econômica de 1873, que colocou os Republicanos na berlinda e aumentou a força da oposição. A eleição presidencial de 1876 foi uma das mais disputadas do país e terminou em empate no Colégio Eleitoral. O vencedor foi o candidato republicano, que negociou um amplo acordo com o sul, às custas dos direitos dos negros. O governo federal interrompeu seus esforços pós-Abolição e os sulistas implementaram as leis racistas conhecidas como Jim Crow, sob o pretexto de que a segregação significava apenas “separados mas iguais”.

A Reconstrução não foi inútil. Foner a chama de uma “revolução incompleta”. Promoveu um renascer e florescimento das instituições da sociedade civil negra – igrejas, escolas, associações de ajuda mútua. Elas acabaram por afastar-se da política nacional, voltando-se para suas próprias comunidades, mas foram o celeiro que gestou os líderes do movimento dos direitos civis.