quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

O Protecionismo na Argentina

O governo da Argentina anunciou uma nova rodada de medidas protecionistas e o início de uma investigação contra a Petrobras por formação de cartel na venda de óleo diesel. Tudo indica que a relação bilateral com o principal parceiro econômico – o Brasil - vá piorar bastante nos próximos meses. O protecionismo argentino é uma tentativa de responder à deterioração das contas públicas do país e ao ambiente mais difícil da crise global, mas é também a marca da incapacidade de enfrentar o longo declínio da indústria na Argentina, acentuado desde a década de 1970.

Como mostra o gráfico acima, até a crise de 1998-2002 a Argentina era superavitária em seu comércio com o Brasil. Isso mudou desde aquele cataclisma econômico, e em 2011 o déficit do país com os brasileiros foi de US$5,6 bilhões. O comércio é só parte da história, e o fluxo de investimentos e turistas do Brasil para a Argentina ajuda bastante o país a ter um balanço de pagamentos positivo.

O problema é que a presidente Cristina Kirchner enfrenta um período difícil na economia, com inflação alta, situação fiscal complicada e reservas em queda por conta da fuga de dólares. Tentar controlar as importações é uma maneira de equilibrar esse jogo no curto prazo, por meio de decisões políticas. O homem que tem implementado essas medidas é o secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno (foto), figura odiada nos meios empresariais nas duas margens do Prata, por seus métodos truculentos e ameaças. Ele foi o principal negociador do governo nos conflitos com a Papel Prensa, a parceria entre Estado e os grupos de mídia na empresa de fabricação de papel-jornal. O último embate foi a decisão do Congresso em declará-la “de interesse nacional”, provável primeiro passo para sua nacionalização.

Neste contexto – e também de muitas denúncias de corrupção – foi anunciado que Cristina Kirchner tinha câncer. Ela se internou para ser operada e os médicos rapidamente disseram que ela não estava doente. Há três possibilidades na história: a) Erro médico coletivo por parte de alguns dos melhores profissionais do país; b) Milagre – as orações dos admiradores da presidente a curaram antes da cirurgia; c) Manipulação política, exagerando o diagnóstico para distrair atenções dos problemas do país. Medicina e milagres estão fora da minha jurisdição como cientista político.

O protecionismo argentino visa não só a remediar a crise de balanço de pagamentos, mas é um esforço para atrair empresas para o país, para supostamente se beneficiar das barreiras contra produtores estrangeiros. Um pouco como o Brasil tenta fazer com a indústria automobilística. As medidas são controversas em ambos os países, e ainda mais na Argentina, que ao contrário do caso brasileiro, não tem grau de investimento e não é bem considerada pelos investidores – tem recebido menos recursos externos do que economias menores, como Chile e Colômbia.

O gráfico acima mostra o tamanho do declínio argentino. Até a década de 1950 o PIB do país era maior do que o Brasil. Hoje não só ficou bem abaixo do antigo rival, como perdeu também a proeminência para vários outros países da América do Sul, cujas economias têm crescido rapidamente e cujas políticas têm sido mais pragmáticas, pois não levam a carga de ter que lidar com a grandeza história perdida, como é o caso da Argentina. Escapar das tentações impossíveis de recriar o passado de glórias é um dos desafios para o país. Nada fácil.

6 comentários:

Anônimo disse...

Tudo muito certo, Mauricio.

Mas não me diga que a classe empresária argentina é o mocinho da história...

lnando2006 disse...

ATE QUANDO O BRASIL VAI SER BONZINHO PRA TODO MUNDO?
PQ SO ELES PODEM NOS SACANEAR E ESSE GOVERNO FROUXO FICA COMPRANDO TUDO DELES?AHHH VAMOS MOSTRAR PRA ELES QUE ELES DEPENDEM MAIS DE NOS QUE NOS DELES. PAREM DE IMPORTAR OS CARROS DELES...JA KEBRA AS PERNAS DELES......

Maurício Santoro disse...

Nada como a fraternidade entre os povos.

Bruno disse...

O Moreno é um workaholic: além de estar à frente dos limites à importação de papel de imprensa, também processa estatísticos e economistas que medem um índice de preços diferente do oficial e acusa as empresas de petróleo de formarem um cartel por subirem os preços ao mesmo tempo (lembrando que os preços são controlados pelo próprio governo). Ele não pára de trabalhar!

Mas ele prejudicaria menos o povo argentino se fosse mais como nossos ministros. Aqui os ministros só fazem obras contra enchentes ou auxiliam dependentes de crack nos seus estados e municípios de origem. Mas pelo menos não atrapalham os outros brasileiros, como Moreno atrapalha todos os argentinos.

Nixon disse...

Certamente não interessa ao Brasil um vizinho com a economia em declínio. As consequências podem ser desastrosas.

Maurício Santoro disse...

Salve, Bruno.

Sem dúvida, o Moreno é muito dedicado ao trabalho. O curioso é que o posto dele é, oficialmente, de comércio interior - existe uma secretaria de comércio exterior, Beatriz Paglieri.

Caro Nixon,

A ironia da história é que a economia da Argentina tem crescido muito, mas sobretudo pela expansão do mercado interno e pelas exportações para a China. A renda per capita, inclusive, é mais alta do que a brasileira.

Mas na comparação com o Brasil, o resultado é um declínio acentuado de influência regional e internacional. É uma situação bastante difícil para a política externa, e acredito que teremos turbulência pela frente.

abraços