segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Leila Diniz


Toda mulher quer ser amada
Toda mulher quer ser feliz
Toda mulher se faz de coitada
Toda mulher é meio Leila Diniz


Rita Lee, Todas as Mulheres do Mundo

Será que é divina a vida da atriz?
Chico Buarque e Edu Lobo, Beatriz


A coleção "Perfis Brasileiros", da Editora Companhia das Letras, publicou algumas das melhores biografias recentes dos grandes vultos da pátria, com ênfase em líderes políticos, como os dois imperadores e Getúlio Vargas. Sempre homens. Portanto, é boa nova a inclusão de uma mulher na série de "Leila Diniz: uma revolução na praia", do jornalista Joaquim Ferreira dos Santos. Dono de um texto fluente e agrádavel, ele conta a história da moça que fez época posando de bíquini quando grávida e liberando costumes e linguagem. E que inventou aos trancos e barrancos uma nova maneira de ser mulher, num país que tentava avançar em meio a uma ditadura que queria parar o relógio da cultura.

Leila entrou no teatro, cinema e televisão na década de 1960, quando essas atividades estavam na transição de uma ação entre amigos para um negócio moderno. Começou na TV ainda no tempo dos folhetins ambientados em terras exóticas e enredos melodramáticos, à la "O Sheik de Agadir", que não combinavam com seu jeito moleque contemporâneo, de jovem mulher que queria lidar com os homens de igual para igual, e não ficar restrita aos esteriótipos de mãe ou femme fatale. Consta que Janete Clair, que não gostava dela, teria dito que não havia lugar para a moça em uma de suas novelas, pois não estaria disponível um papel para prostituta.



Se Leila cavava um posto com dificuldade na televisão, encontrou um canal mais fácil de expressão no cinema, onde fez mais de uma dúzia de filmes, com destaque para "Todas as Mulheres do Mundo" (de 1966), escrito e dirigido por seu primeiro marido, Domingos de Oliveira. Por meio da história ele fez uma espécie de mea culpa do fim do casamento entre os dois. Na tela grande, o enredo tem final feliz, o que me lembrou o celébre encerramento de Annie Hall, onde Woody Allen afirma que a vida real é tão complicada que ao menos na ficção as coisas precisam acabar bem.

A vida amorosa, sentimental e sexual de Leila causou escândalo na época, mas para os padrões de hoje passaria tranquilamente como capa da Nova, ou quem sabe programa de debates no GNT, para sadia instrução da mocidade. Claro que em 1969 provocaram o risco do colapso da pátria, como na célebre entrevista ao Pasquim, que é uma espécie de canto de guerra da revolução sexual no Brasil. Foi a edição mais vendida do jornal oposicionista.

A bela biografia de Joaquim Ferreira dos Santos nunca coloca explicitamente a pergunta se Leila era feliz, mas o questionamento está lá, implícito. Como na declaração da atriz: “Nós, mulheres, queremos e não queremos ser independentes”. Um dos momentos mais bonitos é seu romance com o cineasta Rui Guerra, com foi casada brevemente e teve uma filha, Janaína, com quem aliás militei no movimento estudantil. A história de amor entre os dois foi diferente dos casos geralmente rumorosos de Leila, e é narrada com sensibilidade numa crônica de Danuza Leão, "O Homem Certo", citada de passagem no livro.

A ditadura perseguiu a atriz e lhe brindou com o chamado "Decreto Leila Diniz", que proíbia manifestações culturais contrárias "a moral e aos bons costumes". Mas Leila ganhou amigos inesperados, como o apresentador de TV Flávio Cavalcanti, um apoiador do regime autoritário, que no entanto a protegeu, oferendo-lhe emprego e até escondendo-a com sua família. Como é bem conhecido, Leila morreu tragicamente, num acidente de avião, em 1972. Ainda não tinha 30 anos. Falecer jovem e bonita é receita certa para se tornar um mito, mas cabe perguntar o que teria sido de sua carreira artística se ele tivesse continuado a trabalhar. Em seus últimos anos de vida já havia atuado em pornochanchadas de gosto bastante duvidoso. Será que teria se transformado numa versão mais bonita de Dercy Gonçalves? Ou teria continuado a se reinventar e apontar novos caminhos às mulheres brasileiras?

Não sei, torço pela segunda hipótese. Mas sem dúvida, Leila Diniz tem uma história de vida bem mais divertida do que a do imperador Pedro II. Já Pedro I, naturalmente, teria adorado o livro.

6 comentários:

Patricio Iglesias disse...

Caro Maurício:
Me faz lembrar um pouco à Evita, por ser uma atriz acusada de prostituta; outro pouco ao Gardel, pela morte num acidente aéreo; e um pouco aos dois, pelo fim das suas vidas em plena juventude.
Tenho a impressäo (com os enormes respeito e carinho que sinto pelo Brasil, näo confundir) que vocês säo um pouco menos andróginos que nós. Vejo que muitas atividades säo PARA GAROTOS e outras PARA GAROTAS. Me fez rir que me contaram que os balöes säo inflados só PELAS GAROTAS. Aqui você näo va ficar como "la nenita" por inflar "globos" (que pouco se usam, salvo en festas infantis)! O, por exemplo, você falou uma vez (no artigo sob o novo presidente do Paraguai) de "chevar a namorada ao cinema". Acá vas al cine con tu novia, punto. Nadie paga nada a nadie. Isso terminou faz umos vinte anos, até no interior näo se estila mais!
Saludos!

Maurício Santoro disse...

Dom Patricio,

Nunca havia olhado Leila Diniz pela comparação de Evita, mas sabe que é uma perspectiva interessante? Pelo menos no sentido de confrontar certos valores.

A comparação entre as liberdades femininas nos diversos países sul-americanos é algo muito polêmico e tenho a impressão que as pessoas sempre acham que o jardim do vizinho é mais verde.

Me parece que no Brasil as relações entre os genêros continuam bastante tradicionais, sobretudo nas cidades menores. Ainda somos um país bastante machista.

Abraços

IcaroReverso disse...

Tão machista que a presença marcante de mulheres atuantes, quer na arte, política ou noutra instância, instila forte influência. Indivíduo atuante não é o mesmo que produto circunscrito à cultura, então o que parece fazer falta são figuras da cultura que atuem em planos mais determinantes, como na política. sinto isso ainda pouco frequente no Brasil.

Patricio Iglesias disse...

Caro Maurício:
No meu caso, e em este tema, vejo o meu jardim mais verde! Mas claro que en políticas de longo termo ou burocracia vejo ao vizinho (e hermano) Brasil täo verde que já näo me parece jardim senäo uma silva! HA HA HA HA
Sem dúvidas, é un tópico difícil. Na Argentina ainda há problemas, aunque gräo parte do caminho está feito: na UBA o 60% dos alunos säo mulheres, temos uma presidente mulher, etc. De todos modos, ainda näo está instalada a imagem da mulher como intendente (prefeita) ou gobernadora. Há pouquinhas mulheres intendentes e recém no 2007 ganhou por primeira vez uma mulher como gobernadora, Fabiana Ríos, do ARI (partido da Carrió), na Tierra del Fuego.
Saludos!

Maurício Santoro disse...

Hola, Patricio.

É possível que em breve o Brasil também tenha uma presidente, já que a ministra da Casa Civil é uma forte candidata ao cargo. E temos, evidentemente, o exemplo do Chile, com Michelle Bachelet. Mas não tenho os dados para outras dimensões das mulheres na política, como deputadas e senadoras.

Abraços

Anônimo disse...

o que ela fez de extraordinario? ao meu ver nada...foi uma mundana...ser mulher e muito mais que sair dando pra todo mundo....mulheres nao percam sua dignidade e amor proprio...leila nao teve nenhum...