quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
Transformações no Irã
Hoje termino de lecionar o curso sobre Ditadores Contemporâneos na Casa do Saber, e o principal tema da aula será o Irã. Acabo de ler um excelente panorama sobre a história recente do país, “Iran´s Long Reach”, de Suzanne Maloney, uma ex-diplomata americana que agora é pesquisadora da Brookings Institution.
Seu livro se concentra nos desdobramentos das décadas de 1990 e 2000 e nos conflitos da estrutura dual de poder no Irã – representada acima, num infográfico do Conselho de Relações Exteriores dos Estados Unidos. Basicamente, trata-se das tensões entre as autoridades teocráticas (o Líder Supremo e o Conselho dos Guardiões) e da influência dos presidentes eleitos pelo voto popular, embora em contexto de censura e fortes restrições às liberdades de associação.
Após a longa guerra contra o Iraque (1980-1988), o governo iraniano iniciou um programa de ajuste econômico que resultou impopular e deu origem a um grupo de descontentes entre a elite política do país. Liderados por Mohammad Khatami, eleito presidente em 1997, os reformistas empreenderam diversas iniciativas de abertura política e cultural.
As mudanças na conjuntura internacional abortaram esse período promissor. Após o 11 de setembro de 2001, o Irã assistiu aos EUA e seus aliados invadirem dois de seus vizinhos, Afeganistão e Iraque, e intervirem militarmente num terceiro, o Paquistão. O sentimento de cerco e insegurança ajudou bastante a fomentar a reação conservadora, que culminou com a ascensão de Mahmoud Ahmadinejad à presidência, em 2005, e sua aceleração do programa nuclear, que começou ainda nos tempos do xá.
Ironicamente, os Estados Unidos derrubaram dois inimigos ferozes do Irã, as ditaduras sunitas de Saddam Hussein e dos Talibãs. E o crescimento da influência xiita no Líbano (Hezbolá) e na Palestina (Hamas) tornou o Irã a principal potência regional, o grande beneficiário da política externa de George Bush.
Ahmadinejad também deve sua proeminência aos fatores domésticos, em particular às dificuldades econômicas e à inquietação dos grupos conservadores com as reformas dos anos 90. Apesar da alta no preço do petróleo, a maioria dos iranianos é pobre e a história pessoal de Ahmadinejad, oriundo de uma família de poucos recursos, constrasta com a criação privilegiada de diversos de seus oponentes, inclusive os reformistas democráticos. A repressão cultural em seu governo aumentou bastante, sobretudo na vigilância às roupas usadas pelas mulheres e na interrupção policial do circuito de festas clandestinas que acontece em Teerã e outras grandes cidades.
O tamanho da cisão no país pode ser medido pela Revolução Verde que eclodiu em junho de 2009, durante a disputa presidencial. As acusações de fraude na reeleição de Ahmadinejad são muito fortes, assim como é inegável a virulência da repressão, com prisões ilegais, torturas e assassinatos. As divisões na própria elite chamam a atenção – infelizmente, tema não coberto pelo livro - como protestos de setores das Forças Armadas e dos clérigos da cidade sagrada de Qom.
Para onde vai o Irã?
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3 comentários:
Mauricio,
Gostaria de saber sua opinião sobre a aproximação entre Lula e Ahmadinejad.
O que leva a diplomacia brasileira a fazer um erro não-forçado tão óbvio?
Afinal, será possível que não passa pela cabeça do Celso Amorim que passar a mão na cabeça do Irã aliena todos os outros países do Ocidente e além de todos os países árabes?
Anônimo,
Escrevi bastante sobre isso em outros posts do blog. Basta clicar no marcador "Irã", da coluna à direita, e aparecerão minhas críticas à essa decisão de política externa.
Obrigado!!
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