terça-feira, 3 de maio de 2011

As Duas Mortes de Bin Laden



Acabou. Durante 15 anos Osama Bin Laden foi um inimigo perseguido pelos Estados Unidos e o responsável pela maior mortandade cometida em solo americano desde a guerra civil. Bin Laden teve duas mortes. A de sábado foi a biológica. A mais importante foi a política, e aconteceu quando começaram as revoltas democráticas árabes, que marcaram a completa rejeição do projeto da Al-Qaeda e apontaram que o caminho escolhido pelos povos locais é algo muito diferente das ambições teocráticas dos terroristas.

O presidente Barack Obama é o grande vitorioso com a morte de Bin Laden. Conseguiu realizar em dois anos e meio o que George W. Bush falhou durante oito. E mais do que isso: mostrou que tinha razão em afirmar, desde a campanha presidencial, que os Estados Unidos deveriam deixar o Iraque e concentrar-se no Afeganistão e no Paquistão, verdadeiro foco da guerra contra a Al-Qaeda.

Obama já havia anunciado o desejo de retirar as tropas americanas do Afeganistão até o fim de seu primeiro mandato, o que fica mais fácil diante do assassinato de seu inimigo. Para a maior parte da opinião pública americana, a vitória foi alcançada e a justiça foi feita. Contudo, se por triunfo no Afeganistão entendemos a construção de um país estável e sólido, evidentemente isso não ocorreu. Os Talibãs iniciaram no fim de semana uma ofensiva de primavera e diversos grupos armados ilegais continuam a operar no país, sendo uma ameaça ao menos no nível regional da Ásia Meridional.

A Al-Qaeda fica sem um líder capaz de ser uma referência importante para todas as diversas facções locais que agora compõem a rede: Norte da África, Iêmen, Somália... O número 2 de Bin Laden, Ayman al-Zawahiri, é muito mais um ativista ligado à política no Egito, e uma figura que encontra muitas resistências mesmo entre os demais grupos fundamentalistas, por seu dogmatismo e temperamento explosivo. No entanto, é provável que ocorram ataques de pequena escala por parte da Al-Qaeda, nas próximas semanas, como atentados contra diplomatas americanos, para tentar vingar Bin Laden.



Há a questão ainda não esclarecida do envolvimento do governo do Paquistão com a operação conduzida pelas forças especiais americanas (SEALS da Marinha) que culminou com o assassinato do líder da Al-Qaeda. Obama teve o cuidado de ressaltar a cooperação das autoridades paquistanesas, mas não acredito que isso tenha ocorrido. Há longa história de falta de interesse delas em capturar Bin Laden e o terrorista havia se instalado numa casa confortável numa cidade de turistas e aposentados, que abriga também a principal academia do Exército.

Pós-Escrito:

Segue o link para a entrevista que dei ao Globo News Documento, sobre a morte de Bin Laden, com ênfase nos impactos para os Estados Unidos, tanto disputas domésticas quanto política externa.

15 comentários:

marcelo l. disse...

Prezado Mauricio,

Queria saber de onde saiu a idéia de se livrar do corpo tão rápido e joga-lo ao mar...é um procedimento inusitado para um "exercito vitorioso" quando atinge seu objetivo.

Abs

Glaucia Mara disse...

Por enquanto tudo isso me gera mais pergutnas que respostas. O tempo dira se isso é mesmo o inicio do fim de uma era. Pessoalmente, eu duvido. Espero estar totalmente enganada.

Saludos

Unknown disse...

Timing

Na pior das hipóteses, o anúncio da morte de Osama Bin Laden é uma farsa equivalente àquelas fotografias de tubulações que os EUA usaram para justificar a invasão do Iraque. Se o anúncio for ao menos verdadeiro, significará que o Pentágono agiu de novo segundo conveniências políticas, aproveitando os primeiros movimentos do calendário eleitoral para “descontinuar” outro de seus antigos colaboradores.

Por que justo agora, quando o Wikileaks expõe o caráter despótico do governo, quando as forças “pacificadoras” da ONU chacinam os familiares de um chefe de Estado e quando o cinturão de ditaduras financiadas pelos EUA para proteger Israel começa a balançar? Porque o momento exige uma escalada paranóica e xenófoba que ajude os EUA e as potências aliadas a recuperarem seu destaque na arena geopolítica.

Depois de todas as dúvidas suscitadas pelo 11 de setembro, os mercenários de Barack Osama, digo, Obama podiam fazer alguma força para deixar suas versões mais plausíveis. Essa história de jogar o presunto do supervilão no oceano e vir com testes de DNA e fotos de um barbudo cheio de furos, convenhamos, soa bem fraquinha.

http://www.guilhermescalzilli.blogspot.com/

Davi disse...

Caro Mauricio,

Muito interessante sua análise sobre os últimos acontecimentos.

Ressaltaria, apenas, que a saída de Petraeus do comando militar no Afeganistão, do último dia 28/04, para assumir a CIA não pode ser mera coincidência. Uma vez que o Gen. Petraeus era um entusiasta da continuidade do teatro de guerra afegão, sua ida à CIA, juntamente com a morte de Bin Laden, abriram as portas para a retirada norte-americana do Afeganistão.

Abraços,

Davi Alvarenga
twitter.com/davi_alvarenga

Mário Machado disse...

Nenhuma prova nunca será suficiente para algumas linhas de pensamento.

Eu penso que podemos traçar um paralelo com a morte de "al Zarqawi" e o impacto que isso trouxe para a Al-Qaeda no Iraque.

E mais quem for ser sucessor terá que se esconder ainda mais o que vai dificultar que esse se torne uma figura carismática que consiga levantar os recursos financeiros que o terror preciso.

Flavio Faria disse...

Caro Maurício,

Penso que os EUA mais uma vez utilizaram da política externa para abafar crises importantes que aocntecem dentro do país. O mês de abril foi um mês importante para a evolução do processo sobre a naturalidade do Obama, que finalmente vai ser julgada ou já foi nas cortes americanas. A grande mídia não está dando atenção a esse fato de grande importância. Aliado à isso, a invasão do Obama na Líbia não votada pelo congresso também está causando mal-estar nos americanos. Portanto, é claro que, matando Osama, nada mais será dito na mídia sobre esses fatos. O que eu acho mais engraçado disso tudo é que as grandes notícias do mundo hoje são o casamento na casa real britânica, a beatificação do papa e a morte de um chefe mouro importante. Voltamos a Idade Média.

Flavio Faria disse...

Caro Maurício,

Penso que os EUA mais uma vez utilizaram da política externa para abafar crises importantes que aocntecem dentro do país. O mês de abril foi um mês importante para a evolução do processo sobre a naturalidade do Obama, que finalmente vai ser julgada ou já foi nas cortes americanas. A grande mídia não está dando atenção a esse fato de grande importância. Aliado à isso, a invasão do Obama na Líbia não votada pelo congresso também está causando mal-estar nos americanos. Portanto, é claro que, matando Osama, nada mais será dito na mídia sobre esses fatos. O que eu acho mais engraçado disso tudo é que as grandes notícias do mundo hoje são o casamento na casa real britânica, a beatificação do papa e a morte de um chefe mouro importante. Voltamos a Idade Média.

Maurício Santoro disse...

Car@s,

começando pela pergunta do Marcelo, acredito que livrar-se do corpo foi o modo que os americanos encontraram para evitar que o túmulo de Bin Laden se transformasse num centro de peregrinação para extremistas.

Sobre Bin Laden estar vivo e Obama ser africano, penso que as pessoas que crêem nas duas afirmativas continuarão a fazê-lo independente do que aconteça no mundo.

Naturalmente, a morte de Bin Laden alivia bastante a pressão sobre Obama num momento de crise interna, em particular o alto desemprego. Mas esse alívio é temporário, dura apenas alguns meses. Lembremos que Bush pai venceu a Guerra Fria e Saddam Hussein, e depois perdeu a eleição para Clinton por conta da economia.

abraços

brunomlopes disse...

Aparentemente há muitas pessoas que se ressentem do fato que o presidente do país com o maior poder militar do mundo é:
1) negro,
2) descendente de um africano e
3) para completar, tem um nome estranho (com direito a Hussein no meio).
Hoje eu estava lendo no Slashdot uma discussão de como essa questão da naturalidade do Obama é ridícula: nenhum jornal ou meio de comunicação sério questiona sua naturalidade (incluindo a Fox News), mas blogueiros continuam a levantar dúvidas sobre os documentos que ele apresentou (e foram vários).

Agora vão começar as histórias duvidando que Osama morreu, pedindo fotos, vídeos, etc. Daqui a pouco vão aparecer histórias de pessoas que o viram em uma mesquita ou treinando tiro ao alvo, no estilo Elvis Presley e Jim Morrison. Mas acho muito difícil, em tempos de Wikileaks, que o presidente americano esteja envolvido em uma fraude de larga escala para criar um teatro e fingir que o Osama foi encontrado. Vejam bem: os documentos que vazaram (como e-mail do comandante dos SEAL) corroboram a versão de que Osama morreu.

Para quem não aceitou ainda: Osama é história. Osama foi encontrar seu criador. Osama foi conversar com os peixes. Como Monty Phyton disse no esquete do papagaio: "This Osama is no more! He has ceased to be! This is an ex-Osama!".

Os Estados Unidos passam por uma crise interna seríssima. O déficit cresceu a tal ponto que agências de risco já sinalizaram que os títulos da dívida pública americana vão deixar de ser o "ativo de risco zero" se a atual trajetória não for retificada. O pior é que o governo precisa economizar em que a economia está fraca, e quando uma política fiscal expansionista poderia contrabalançar a diminuição de atividade do setor privado. E como os juros nos Estados Unidos já são baixos, também não há muito espaço para uma política monetária expansionista.

Boa parte do aumento do déficit ocorreu pelo aumento dos gastos militares (que os americanos gostam de chamar de "defesa", mesmo quando eles estão atacando outro país). Aí a morte de Bin Laden pode causar um efeito interessante: se ela criar uma crise de liderança na Al Qaeda, seus membros irão dedicar mais energia para a luta interna e deixarão de atacar o governo do Afeganistão ou as tropas americanas. Diminuindo a pressão no Afeganistão, o governo americano poderá desmobilizar algumas tropas e reduzir o déficit ou evitar mais gastos em atividades como educação e pesquisa.

Karin Nery disse...

Olá, Maurício!
Vi a entrevista sua na Globo News!
Muito boa!

Abs.

marcelo l. disse...

Prezado Mauricio,

Concordo com vc a minha leitura é a mesma sobre o porquê do mar, agora a rapidez é intrigante, todos os exércitos até hoje sempre mostravam o vencido (morto ou vivo), muitas vezes depois descartavam em locais "secretos" para não haver local de culto.

Nem é cisma com a operação, mas sim o inusitado que deve ter algum estudo já que a operação foi gestada a bom tempo.

Flavio Faria disse...

Bruno,

Me desculpa, mas seu primeiro parágrafo beira ao ridículo. O problema discutido não é o fato dele ser negro, muito menos de ser africano ou ter um nome árabe. Isso pouco importa. O que está em questão é a lei a constituição do país que foram quebradas. O cargo de presidente da républica só pode ser exercido por um americano. Arnold S. é governador da Califórnia porque o cargo de governador de um estado permite a elegibilidade de um estrangeiro; o que não acontece com a presidência.

Você ainda cita a Fox news como detentora da verdade, e se algo desse nível não está sendo divulgado pela FOX, CNN e pelo NY TImes é algo de pouca importância e deixa pra lá. Você só pode tá de brincadeira.

Maurício,

Concordo com o que você disse, mas acabei de ver no G1 aqui que a popularidade do Obama subiu 11% com a morte de Osama. Pura coincidência?

Sobre a naturalidade de Obama, se ele nasceu no Havaí ou não, não dá pra saber. Mas o fato de ele esconder sua certidão ou esconde a verdade sobre o local onde ele nasceu, ou tem alguma coisa escrita lá que ninguém pode saber. Seja qual for o caso é algo gravíssimo que merece ser pesquisado em defesa da constituição.

Maurício Santoro disse...

Bruno, caríssimo.

Concordo com você em gênero, número e grau. E etnia, que é o fator-chave na questão. Mas os fanáticos que acham que Obama é africano (ou Unamerican) são imunes à razão. Nenhum fato fará com que abandonem suas crenças.

Salve, Marcelo.

Penso que há três possibilidades para os americanos não terem divulgados fotos do cadáver de Bin Laden:

1- Foi divulgado que ele morreu com dois tiros na cabeça, o que provavelmente destruiu seu rosto ou ao menos lhe deu um aspecto assustador.

2- Os soldados podem ter mutilado o corpo.

3- Evitar a "síndrome de Che Guevara", isto é, uma imagem icônica do sacríficio e do martírio, como as últimas imagens do guerrilheiro argentino na Bolívia.

Olá, Karin.

Muito obrigado! A equipe do Sem Fronteiras, que gravou o programa, é excelente e dá um show na edição.

Abraços

Mário Machado disse...

Até O'Reiley e o Hannity nunca embarcaram nessa da certidão de nascimento.

No mais concordo com você quanto as razões para não liberar a foto.

Thiago Quintella de Mattos disse...

o roterista dos EUA é muito fraquinho atualmente! Mauricio, ótimo ensaio!!!