sexta-feira, 6 de novembro de 2009
Mercosul Hoje
O Valor publicou uma série de pequenas reportagens nesta semana sobre as negociações entre o Mercosul e a União Européia. Os textos, do excelente repórter Assis Moreira, chamam a atenção para propostas de alterar as regras do bloco, para torná-lo mais flexível e permitir ao Brasil mais espaço para fechar acordos comerciais internacionais.
O Mercosul é uma união aduaneira, isto é, os países que são membros plenos do bloco (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) liberalizam o comércio entre si e têm uma Tarifa Externa Comum (TEC), aplicada a produtos importados de outras nações. A TEC varia entre 0% e 20%, com valor médio de 11,52%. É alta para os padrões internacionais. Ela foi negociada na primeira metade da década de 1990, quando havia no Brasil uma série de receios tanto dos empresários quanto da burocracia em abrir demais a economia. A ênfase é nos negociadores brasileiros, porque à época os parceiros do bloco queriam uma TEC mais baixa. Eles não tinham, por exemplo, um setor de bens de capital pouco competitivo para proteger. Mas aceitaram a barganha em troca do acesso facilitado ao imenso mercado consumidor do Brasil.
Contudo, o Mercosul nunca conseguiu se consolidar inteiramente. Diversos setores importantes permanecem fora da liberalização comercial, como automóveis e açúcar, e a união aduaneira tampouco foi implementada de forma completa, em função da persistência do problema da dupla cobrança da TEC, para produtos que precisam atravessar fronteiras dentro do bloco. Outro obstáculo sério é a ausência de coordenação macroeconômica. Cada país faz o que quer, por exemplo, em sua política cambial, o que com freqüência acarreta desequilíbrios no comércio.
Nos momentos de decepção com o Mercosul, volta e meia surgem propostas de transformá-lo simplesmente numa área de livre-comércio, à semelhança do Nafta. Esse é um modelo mais simples de integração, que em grande medida diminui a relevância política do regionalismo. O projeto atual é reduzir a abrangência da TEC para cobrir somente o núcleo de produtos mais importantes, desse modo permitindo maior flexibilidade nas negociações, pois cada membro do Mercosul teria liberdade para definir suas tarifas para uma ampla gama de mercadorias. Ao mesmo tempo, se manteria um certo caráter estratégico do bloco, ainda que em grau bem menor do que pensaram seus formuladores em 1991.
A proposta reflete os novos rumos do comércio exterior brasileiro. O Mercosul chegou a representar o destino de cerca de 20% das exportações do país, às vésperas da crise de fins da década de 1990. Hoje, não é nem a metade disso. Em números absolutos, o volume de mercadorias aumentou, mas houve decréscimos em termos relativos porque o intercâmbio com o resto do mundo, em particular com a China, cresceu muito mais rápido. Em quase 20 anos de existência, o Mercosul conseguiu assinar apenas um acordo de livre comércio com um país de fora da América do Sul (com Israel, ainda não entrou em vigor).
O pilar do Mercosul sempre foi o relacionamento entre Argentina e Brasil. Desde a crise de 1998-2002, o governo argentino tem recorrido a uma série de barreiras ao comércio dentro do bloco, como tarifas mais altas do que a TEC, licenças não-automáticas de importação e até a negociação de um mecanismo bilateral de salvaguardas que enfureceu os outros membros do Mercosul. As autoridades brasileiras com freqüência falam na necessidade de “paciência estratégica”, isto é, aceitar custos econômicos em nome da estabilidade política com o importante vizinho. Os últimos meses foram bastante difíceis nesse aspecto e me parece que os negociadores já começam a se preocupar com as adaptações exigidas pela iminente entrada da Venezuela no bloco.
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2 comentários:
Meu caro:
Um dos problemas que vejo na integração da América é a grande qüantidade de organismos existentes que se multiplicam com os anos (OEA, ALADI, União Andina, Mercosul, Unasur, Caricom, SICA... já provoca maréios quando você tenta aprender os nomes anteriores); realmente, há que ser um erudito (e eu não sou) pra conheçe-los todos!
"Outro obstáculo sério é a ausência de coordenação macroeconômica. Cada país faz o que quer, por exemplo, em sua política cambial, o que com freqüência acarreta desequilíbrios no comércio."
Sim, concordo. E sem dúvidas é perjudicial pra os sócios mais pequenos, como o Uruguai, que tivo que devaluar no 2002 obrigado pela devaluação argentina.
Abraços!
Patricio Iglesias
Caro,
Também os especialistas se confundem com tantas siglas, e há uma enorme dificuldade em dividir bem o trabalho entre as diversas organizações.
Minha sensação é que é necessário arrumar a casa para que a integração possa prosperar.
Abraços
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