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Os presos políticos de Cuba enviaram um apelo ao presidente Lula para que ele interviesse em defesa de seus direitos humanos, aproveitando a visita que faz ao país. Isso não ocorreu. A viagem do mandatário brasileiro coincidiu com a morte de um dissidente, encanador por profissão, que faleceu em decorrência da greve de fome que adotou na prisão. O ex-torneiro mecânico que preside o Brasil deve ter se identificado com o drama, pois usou o mesmo método quando foi encarcerado pela ditadura militar brasileira. À parte as diferenças ideológicas, todos os regimes autoritários se parecem em sua truculência e desrespeito à dignidade básica do ser humano.
Nesta semana comecei a lecionar a segunda versão do curso sobre Ditadores Contemporâneos, agora para o MBA em Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas. A aula inicial foi justamente sobre Cuba, e comentei sobre os acontecimentos recentes relativos às violações de direitos humanos na ilha, como a “Primavera Negra”, a onda de prisões em massa contra os dissidentes. Mencionei o surgimento do movimento das “Damas de Branco” (foto), formado por mães e mulheres dos presos políticos e fiz a analogia com grupos semelhantes em outros países, como as Mães da Praça de Maio. Citei o escritor peruano Mario Vargas Llosa: “As mulheres são sempre as primeiras vítimas das ditaduras”. Mas talvez possam ser suas opositoras mais ferrenhas e eficazes.
Não é da política externa brasileira criticar países que violem direitos humanos, salvo raras exceções como as condenações ao golpe em Honduras e às tentativas na Venezuela e no Paraguai. Desde que as relações diplomáticas foram reestabelecidas com Cuba, durante a redemocratização do Brasil na década de 1980, nenhum presidente condenou o regime de Havana. A posição brasileira contrasta com as sanções adotadas pela União Européia após a Primavera Negra, e mesmo com as críticas efetuadas por alguns governos na Argentina e no México, embora estas tenham ocorrido como parte de uma estratégia de rejeitar a agenda diplomática terceiro-mundista e reforçar as reformas liberalizantes na economia.
Em sua visita a Cuba, o presidente Lula anunciou financiamento oficial brasileiro para reformar o porto de Mariel. Ironias da história. Trata-se do local por onde partiu uma geração inteira de emigrantes cubanos para os Estados Unidos, na década de 1980. O chamado “êxodo de Mariel” ocorreu sobretudo por razões econômicas e seus participantes hoje são parte importante da comunidade cubano-americana.
A economia de Cuba está novamente em dificuldades, sentindo os efeitos da crise internacional. A escassez de divisas levou o governo a adotar medidas que prejudicaram as empresas brasileiras, como retenção de dólares no país ou simplesmente calote de dívidas relativas a comércio exterior. Tal como na questão dos direitos humanos, o presidente Lula optou por ignorar o problema durante a visita.