quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A Economia Política do Chavismo

Javier Corrales e Michael Penfold são dois raros acadêmicos americanos que estudavam política venezuelana antes da ascensão do chavismo. Seu recém-lançado "Dragon in the Tropics: Hugo Chávez and the political economy of revolution in Venezuela" é o mais completo panorama crítico da última década no país de Bolívar e desde já está incorporado à bibliografia dos cursos que leciono sobre América Latina.

Corrales e Penfold avaliam negativamente o governo Chávez, sobretudo pelo seu impacto sobre a democracia. Para os dois autores, a Venezuela tornou-se um "regime híbrido", que mescla elementos democráticos (eleições) com práticas autoritárias, como censura e ataques contra a imprensa e opositores - rivais do presidente foram presos ou perderam o cargo sob acusações de corrupção. Eles examinam como as reformas chavistas eliminaram ou enfraqueceram as instituições de freios e contrapesos do sistema representativo, como o Senado e a Suprema Corte, concentrando uma enorme quantidade de poderes nas mãos do presidente. Examinam também, brevemente, a nova lei eleitoral, que favorece as regiões rurais e pobres, nas quais Chávez agora tem a maioria dos votos.

Não há grande novidade nas críticas de Corrales e Penfold sobre a erosão da democracia na Venezuela, o destaque do livro é como analisam a política do petróleo da Venezuela. Eles argumentam, a meu ver corretamente, que a alta do petróleo tornou o chavismo viável em termos financeiros, mas que não explica sua ascensão. Os diversos ciclos políticos venezuelanos (ditaduras, democracias) sempre foram dependentes do petróleo e o sistema partidário se articulou em torno das rendas do Estado, gerando uma máquina corrupta e ineficiente. Chávez cresceu em cima do descrédito dos partidos tradicionais e nesse sentido faz falta no livro o exame aprofundado das tentativas de reconstrução de partidos de oposição, sobretudo a partir de ONGs.

Os autores discutem em detalhes os embates que levaram Chávez a assumir o controle da estatal petrolífera, PDVSA, que anteriormente era quase autônoma diante do presidente, e há também boa análise de como a política de nacionalizações e restrições afastou boa parte do capital estrangeiro europeu e americano, atraindo em seu lugar empresas públicas da China, Rússia e Irã. A diplomacia petrolífera do chavismo é muito bem estudada, e os autores mostram como ela tem por eixo a busca de preços mais elevados dentro da OPEP, o que significa tensões com a Arábia Saudita e um vínculo mais forte com os iranianos.

A política externa de Chávez é vista pelos autores como construída sobre dois pilares: soft balancing aos Estados Unidos (criar problemas e obstáculos, sem usar força militar) e poder social (difusão da influência do chavismo junto a partidos e movimentos de esquerda, em geral via pacotes de ajuda petrolífera e financeira). Faltou um pouco mais de debate a respeito dos objetivos chavistas na América Latina, mas o texto dá bons elementos para pensar a questão.

As principais ausências do livro são discussões sobre as políticas sociais de Chávez e sobre as idas e vindas da oposição a ele. Há breves referências a seus programas, incluindo uma explicação da apreciação da taxa de câmbio como explicação para a extraordinária redução da pobreza nos 12 anos de seu governo. É pouco, seria importante aprofundar a conversa. O mesmo vale para as estratégias oposicionistas, que por diversas vezes foi tão autoritária quanto o governo.

As recentes primárias que escolheram o governador de Miranda, Henrique Caprilles, como adversário de Chávez nas eleições presidenciais de 2012 tem despertado atenção internacional. Convém lembrar dos datos citados por Corrales e Penfold: desde meados do século XIX, só dois presidentes latino-americanos perderam reeleições: Daniel Ortega (Nicarágua, 1990) e Hipólito Mejía (República Dominicana, 2004). O chavismo disputou uma dúzia de eleições e perdeu somente uma, um referendo sobre mudanças na constituição. A questão central é o estado de saúde de Chávez e as muitas especulações sobre a real expansão do câncer do qual padece.

2 comentários:

Marc Jaguar disse...

Prezado Amigo Mauricio....

Nao ha mal que dure para sempre, sobretudo quando esse mal tem sua origem nos delirios de poder de uma unica pessoa.

Abraco, Mauricio!

Maurício Santoro disse...

Salve, meu caro.

Me parece que a doença de Chávez é mesmo bastante grave e não tem dado sinal de melhorar, o que abre caminho para mudanças na política da Venezuela.

abraços