quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008
China e América Latina
No congresso da Associação de Estudos Latino-Americanos em setembro passado preenchi uma ficha de cadastro no estande do Woodrow Wilson Center for International Scholars. Já acompanhava o trabalho do centro desde que fui aluno do diretor de seu programa para a América Latina, e de lá para cá li material de excelente qualidade produzido pela instituição. Há poucos dias me chegou pelo correio sua mais recente publicação, o estudo “Enter the Dragon: China´s presence in Latin America”, coletânea de artigos coordenada por Cynthia Arnson, Mark Mohr, Riordan Roett e Jessica Varat.
A relevância do tema é grande. O comércio entre a China e o continente cresce em média 24% anuais desde 1990. A América Latina exporta para os chineses principalmente soja, minérios e petróleo. Importa componentes eletrônicos, máquinas e têxteis. A China já é o segundo ou terceiro maior parceiro comercial de vários países do continente, inclusive o Brasil (está atrás da União Européia e dos EUA, e em vias de ultrapassar a Argentina).
Pela pauta exportadora-importadora enunciada acima é fácil entender porque a China desperta diversos receios nos países mais industrializados do continente. A indústria têxtil, de calçados e de brinquedos da Argentina e do Brasil perde muito com a competição dos baratíssimos produtos asiáticos. O impacto mais forte é sentido no México, cujas maquiladoras enfrentam em desvantagem de condições as fábricas chinesas que exportam para os EUA.
Dito de outra maneira, o interesse da China na América Latina é que o continente forneça alimentos, combustível e matéria-prima para impulsionar seu processo de desenvolvimento econômico e industrialização. Não é um padrão tão diverso daquele que a região experimentou com a Inglaterra e os EUA nos dois séculos anteriores.
Há alguns anos a China anunciou de maneira bombástica que iria investir US$100 bilhões na América Latina, principalmente em infra-estrutura – portos e rodovias que diminuam os custos de transportar os produtos daqui até a Ásia. Tal promessa não se concretizou. A China tem cerca de 16% do total de seus investimentos externos na América Latina, mas 90% estão em paraísos fiscais do caribe, como as Ilhas Caimã. Talvez isso mude no futuro, mas por enquanto é um assunto que provoca mais desapontamento do que entusiasmo.
Um ponto curioso é a importância da disputa entre a República Popular da China e Taiwan para as relações com a América Latina. Metade dos Estados que reconhecem Taiwan como a China legítima estão na América Central e Pequim tem conduzido uma ofensiva para fazer com que o quadro mude. De fato, no congresso da Associação de Estudos Latino-Americanos me impressionou a quantidade de acadêmicos de Taiwan presentes ao encontro. Creio que seu futuro é sombrio, porque à medida que se intensficam os laços comerciais do continente com Pequim, a balança política pende inexoravelmente para esse lado.
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