quarta-feira, 11 de junho de 2008

Adeus às Armas


Hugo Chávez é um presente dos deuses para os analistas políticos da América Latina. Primeiro porque, faça o que faça, ele garante que nosso ofício será sempre agitado e emocionante. Segundo, seu comportamento errático reforça a necessidade de especialistas que o expliquem, o que ajuda a pagar as contas da minha categoria profissional. Sua mais recente declaração bombástica é o apelo às FARCs para que abandonem as armas e libertem unilateralmente seus reféns. Tudo isso coroado com frase de efeito digna de editorial da Veja ou do Estadão: “A guerra de guerrilhas passou para a história”.

O apelo de Chávez é, de fato, surpreendente. Em todos os seus pronunciamentos anteriores ele havia tratado as FARCs como um ator legítimo na política colombiana e até pleiteado seu reconhecimento como “beligerantes”. A meu ver, a guinada no discurso se explica por três razões:

1) As FARCs estão acuadas e enfrentam os maiores problemas de sua história. Nos últimos meses perderam três dos sete membros de seu Comitê Central (até então nenhum membro dessa instância havia sido morto), incluindo seu líder principal, Manuel Marulanda. Seus efetivos diminuíram muito, e segundo os relatos suas tropas passam por fome, escassez de equipamento, dificuldades de transporte e de comunicação.

2) O material apreendido com Raúl Reyes, um dos líderes guerrilheiros assassinado, tem causado constrangimentos para Chávez, Correa e aliados colombianos dos dois, como a senadora Piedad Córdoba. Os indícios apresentados até agora apontam para relações íntimas entre esses políticos e a guerrilha.

3) A situação econômica da Venezuela está bastante grave, com inflação acumulada de 30%, falta de alimentos e disputas eleições regionais em novembro. Muitos dos governos próximos a Chávez (como Evo Morales) também enfrentam problemas sérios.

Ou seja, nesse contexto, o apoio de Chávez às FARCs lhe traz mais dificuldades do que ganhos. A morte de Marulanda criou uma oportunidade para tentar algum tipo de rendição negociada por parte da guerrilha, à semelhança do que têm feito os paramilitares.

A reação internacional ao apelo de Chávez foi positiva, com Colômbia, França e Estados Unidos manifestando sua aprovação, ainda que cautelosamente.

Nenhum comentário: