sexta-feira, 8 de janeiro de 2010
(Bi)Centenários
Em 2010 se comemoram 200 anos da independência da América Espanhola, e cem da Revolução Mexicana. Será uma estranha celebração: no México e na Argentina, os dois maiores países da região, o clima é de desalento pelas oportunidades perdidas. Na América Latina como um todo, o crescimento econômico tem se concentrado em nações menores – Chile, Peru e Colômbia – em meio às divisões políticas entre bolivarianos, sociais-democratas e conservadores. O Brasil está cada vez mais afastado dos vizinhos de língua espanhola, consolida a identidade internacional como potência emergente/BRIC e suas preocupações são diversas daquelas da região.
(Imagem acima: pintura representando o encontro entre Bolívar e San Martin, abaixo, foto da reunião entre Pancho Villa e Emiliano Zapata, durante a Revolução Mexicana).
Tudo era muito diferente em 1910, quando a Argentina parecia ingressar de forma definitiva no grupo de países mais ricos do mundo, e o México deixava para trás a longa ditadura de Porfirio Díaz para iniciar o que aparentava ser uma revolta liberal-democrática. Foi um século turbulento para ambos os países, mas o que se vê atualmente é a sociedade argentina presa a um ciclo infindável de crises e de confrontações políticas, ao passo que os mexicanos amargam o fracasso de seu modelo de atrelamento aos Estados Unidos e enfrentam o colapso da segurança pública em função do tráfico de drogas.
A ascensão da China valorizou muito os produtos de exportação da América Latina, mas não há um modelo de desenvolvimento conjunto associado à nova conjuntura. Nos países bolivarianos (Venezuela, Bolívia, Equador), predomina o retorno de governos fortemente nacionalistas, que procuram usar os recursos naturais (sobretudo petróleo e gás) para custear políticas sociais e a expansão das atividades do Estado na economia. Em menor grau, essas diretrizes são observadas em mandatários de ideologia semelhante, mas que dispõem de capacidades ainda mais frágeis (Paraguai, Nicarágua, El Salvador).
Nas nações cujos presidentes são sociais-democratas (Chile, Uruguai) as redes de proteção social também crescem, mas sem aumento correspondente do ativismo econômico estatal. Naquelas de orientação conservadora (Colômbia, Peru) a agenda está mais voltada para temas como segurança pública, defesa nacional e ampliação da infraestrutura.
O retrato da América Latina contemporânea é bastante matizado. Há muitos aspectos positivos: novos movimentos sociais que representam os setores mais pobres, melhor gestão macroeconômica e considerável crescimento do PIB. Também há sombras diversas: persistência de autoritarismo, manipulação demagógica, ameaças de golpe de Estado, insegurança pública, forte influência do crime organizado e dificuldade da região em se inserir de maneira qualificada na economia global, para além do formato tradicional de exportadora de matérias-primas, produtos agrícolas, minerais e combustíveis.
Para onde vai o continente? Que objetivos os povos e governos da região almejam? Qual o papel da integração nesse processo? São algumas das perguntas a se fazer neste ano que pode ser tão rico em debates políticos para a América Latina.
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12 comentários:
Olá Mauricio,
Este post foi muito bem vindo. Oportuno, eu diria. Excelente momento para se fazer uma análise do Bicentenário. Que tal ao menos um post mensal sobre o tema? Fica a sugestão.
Sua frase "O retrato da América Latina contemporânea é bastante matizado", foi feliz e perfeita para definir o continente e me fez pensar como somos criativos (até demais rsrsrs) na busca de soluções para políticas sociais e econômicas.
É interessante, do ponto de vista acadêmico, observar como mesmo os países que estão alinhados (seja esquerda/direita popular, ou populista) possuem características que o diferem muito de seus parceiros.
A integração latino americana ainda é um sonho, que ficará mais próximo a medida que os países resolverem seus maiores conflitos internos.
Oi, Márcio.
A sugestão é muito boa e com certeza escreverei outros posts sobre o tema ao longo de 2010. Talvez me concentrando em alguns países, talvez focando em questões específicas.
Acho que parte da dificuldade da integração do continente vem justamente dos modelos de desenvolvimento muito distintos, mesmo entre países que estão politicamente próximos.
Além disso, há a questão da multiplicação de instituições de integração (Mercosul, CAN, Alba, OEA, Unasul) e do modo fragmentado e frágil pelo qual elas trabalham.
abraços
Esse ano por conta dos eventos citados, Chavéz discursará pra valer..
É uma oportunidade e tanto para o bolivarianismo, mas será que a Venezuela tera pernas econômicas para tanto? Li hoje que o país acaba de realizar uma maxidesvalorização em sua moeda, chamada justamente... Bolívar. Bela ironia para comemorar o bicentenário.
abraços
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Genial: o spam do bem.
Primeiro span ego booster que vejo, pena que não tardará para vender soluções de ampliação anatômica. rs
Chegou esta semana a minha mais recente aquisição da Amazon: "Americanos", do Chasteen. Impossível parar de ler! (o que não é nada bom ha 10d para o TPS).
Mas o que mais me impressionou é a participação muito mais ativa das mulheres da américa espanhola. Por que isso, heim?
Olá, Dani.
Sou tradicionalmente um adepto do relaxamento às vésperas do TPS!
Com relação à participação feminina, como o processo de independência na Améria espanhola foi muito mais turbulento do que no Brasil, as estruturas tradicionais da sociedade foram bem mais abaladas, o que significou, entre outras coisas, mais espaço às mulheres.
A história mais fascinante é a da Manuela Saenz, a "libertadora do libertador", companheira de Bolívar. O que temos de mais próximo no Brasil é Anita Garibaldi, só que Manuela teve influência sobre uma área muito maior.
abraços
Gde Mauricio !!!
Estou te trazendo mais um indício que o golpe Hondurenho está em pleno funcionamento. Mais uma rádio comunitária fechada por causa de suas posições políticas e socias. Nenhum morto dessa vez, mas os golpistas continuam com os dentes à mostra:
http://www.resumenlatinoamericano.org/index.php?option=com_content&task=view&id=1657&Itemid=48&lang=en
O site é totalmente alinhado com as esquerdas americanas, mas isso não tira o mérito de mostrar que as engrenagens do golpe continuam, mesmo depois da "eleição" a ditar como os hondurenhos devem se comportar.
Acho que uma hora dessas vc vai ter de escrever um looooooooongo artigo sobre Honduras, após o dia 27 de janeiro :-)
abcs
Salve, Athalyba.
Como reza o provérbio, pau que nasce torto nunca se endireita, e todo o processo que começou com o golpe contra Zelaya tem sido torto, autoritário e violento.
Na melhor das hipóteses a posse de Lobo pode estabilizar uma situação social que já é péssima. E caso isso aconteça, passar um recado perigoso para novos golpistas...
abraços
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