segunda-feira, 26 de setembro de 2011
A Primavera Árabe e o Conflito com Israel
Em meio às discussões pelo reconhecimento do Estado palestino, os nove meses da Primavera Árabe apontam para balanço duro: o acirramento do conflito com Israel. Nas últimas semanas, diplomatas israelenses foram expulsos ou fugiram do Egito, Jordânia e do país não-árabe que cada vez desponta como ator decisivo na região, a Turquia.
Muitos analistas de política internacional acreditam na teoria da “paz democrática”, isto é, a de que democracias tendem a ter relações mais estáveis e pacíficas com outros regimes da mesma natureza, em função do caráter público e negociado de suas deliberações e de muitos pontos de veto no sistema político à decisões que levem à guerra. No Oriente Médio, essa perspectiva reflete-se na esperança de normalização diplomática entre Israel e seus vizinhos árabes. Acredito que isso ocorrerá no médio prazo, em alguns anos, mas que nos próximos meses teremos mais convulsões e instabilidade, por duas razões
A primeira é a ocupação dos territórios palestinos por Israel e a persistência de tensões violentas por Jerusalém, pelo controle do rio Jordão e pelo direito de retorno de milhões de refugiados, desde a guerra de 1948. Para muitos países árabes, a questão palestina está numa fronteira tênue entre um tema internacional e política doméstica, particularmente para o Egito, onde a situação do Sinai está muito ligada à da Faixa de Gaza. Alguns regimes autoritários, como o egípcio, haviam controlado as demandas mais intensas pró-palestinos e agora essas reivindicações voltam com força.
A segunda é a existência de muitos bolsões autoritários na região – países, movimentos, instituições dentro de cada país – que agem no sentido de limitar ou contrapor-se às tendências democratizantes. Do Hamas aos colonos israelenses na Cisjordânia, do Irã ao partido extremista Israel Nossa Terra, passando por fundamentalistas de várias cores e matizes, há um excesso de grupos cujo interesse não está nos diálogos ou negociações, mas na permanência do conflito violento. E mesmo os atores democráticos desse jogo têm que chegar a acordos com esses parceiros ou adversários, buscando atrai-los para suas coalizões ou neutralizá-los por meio da adoção de versões mais moderadas de suas idéias.
O balanço atual da Primavera Árabe é que nos países mais homogêneos (Tunísia e Egito) as revoltas caminham rumo à transição para eleições democráticas. Nos estados mais fragmentados étnico-religiosamente, o quadro é sombrio guerra civil e intervenção da ONU na Líbia (talvez 25 mil mortos, numa população de 6 milhões) e massacres no Bahrein, Iêmen e Síria. Na Arábia Saudita, houve apenas protestos pouco significativos nas províncias de minoria xiita, e o rei reagiu com misto de repressão (inclusive mandando tropas ocupar a vizinha ilha do Bahrein), pagamento de benefícios financeiros e a decretação do direito de voto para as mulheres, em eleições municipais.
Também chama a atenção a mudança de comando na Al-Jazeera, emissora que foi tão importante na cobertura – e talvez na deflagração – das rebeliões. O jornalista palestino que a chefiava há oito anos foi substituído na semana passada por um membro da família real do Catar, país que sedia a empresa. O aristocrata não tem experiência com imprensa, era o presidente da estatal de gás natural. Tudo aponta para o fechamento político da Al-Jazeera, com maior controle por parte do emir do Catar.
Guerras e influências de potências externas no Oriente Médio forneceram aos ditadores o pretexto de um conveniente inimigo para aglutinar a população, ou um aliado internacional importante para ajudar a perseguir opositores. No caso da Síria, estabelecer o país como uma espécie de fiel da balança numa zona de enfrentamentos intensos, de modo que todos ficaram temerosos pela derrubada de governos que, bem ou mal, representam estabilidade.
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7 comentários:
Prezado Mauricio,
bem, pensando no que li dos próprios agentes da revolução que ocorreu chamada de Primavera Árabe, Israel é um assunto menor, claro que vai ocorrer novos alinhamentos e principalmente é sensível no Egito até por que tanto eles quanto os sauditas apoiram o Mubarak e houve pressões para os americanos tentassem impedir a queda da múmia.
E não devemos nos esquecer que já havia um clima ruim por causa de suspeitas de espionagem no cairo, além disso é normal dentro de uma democracia, assim como há na Europa pressões para o governo atue de certa forma a pressionar outros países, nós brasileiros é que infelizmente como você já colocou no passado não temos esta prática, aliás relações internacionais quando lembrando nos nossos tempos parecem mais dentro do flaxflu nacional de a favor ou contra os americanos (por sinal, já me perguntaram por que se os brasileiros gostam tanto do Gaddafi por que ele não vira nosso presidente...triste né).
Até acredito que as relações serão mais estáveis e pacíficas, mas Israel agora terá maior cobrança dos governos democráticos da região que emergiram até por que alguns pontos da política interna afetam a sensibilidade árabe como você bem colocou a ocupação dos territórios palestinos e também diga-se que mesmo quando da última guerra em Gaza, Israel se portou asperamente com as críticas ocidentais e principalmente os protestos que ocorreram na maioria das capitais européias, não duvido que pessoas como o Liberman não estejam preparados para o que vem.
A democracia dos árabes do facebok, twitter, e foruns que acompanhei vai por protestos de rua pelo que consideram correto, eles acreditam que agora devem participar ativamente, e que um dos erros do passado foi ter deixado o espaço público para uma pessoa controlar.
Esse ativismo muitas vezes poderá levar a conflitos e eu não sei se tanto os governos que emergem como no caso até Israel qual será a reação a essa nova realidade, se vão enxergar apenas um bando de fanáticos religiosos ou como diziam dos europeus alguém que não conhece a realidade do Oriente Médio.
O lado bom que apesar do caso libio ter havido o apoio externo para queda do ditador (como houve tropas estrangeiras o apoiando), os árabes derrubaram os governos por eles mesmo no solo, com série de levantes, alguns como o reporter da CNN em Zawya disse tem que ter muita coragem para tentar se libertar três vezes, sendo que das outras duas vezes foram massacrados, a reporter da Sky ao entrar na cidade estava emocionada, apesar das mortes da luta a dura realidade das covas coletivas demonstra o que era viver sob o regime de um psicopata.
Para Egito, Tunisia e Libia há possibilidade de um futuro melhor, eu sempre me lembro que na América Latina dizia que todos países virariam uma nova Cuba, e tirando a democracia venezuelana que retrocedeu, todos apesar dos sobressaltos marcham para governos mais ou menos afeitos as liberdades constitucionais.
Os outros é o que você colocou, apesar deu ver o Marrocos com maior vontade da monarquia de avançar e o caso do Baheim, o mais problemático por ser um país com 50% de estrangeiros, além de um país estrangeiro considera-lo sua província nos livros escolares e este ser ligado a maioria árabe que luta contra o rei, por seu lado os sunitas consideram os xiitas seus piores inimigos e apostatas, o que não faz o diálogo ser fácil entre partes.
Mas, como foi difícil na América Latina, Europa Oriental, agora uma nova onda democrática percorre o mundo árabe, inevitávelmente teremos sobressaltos, mas como nos casos todos acreditavam que não daria certo por razões culturais, institucionais nessas parte do globo, poderemos quem sabe ter boas surpresas, a democracia chegando ao Egito, Tunisia, Libia, Marrocos e Jordania que será inspiração para nova onda contra regimes que vivem pelo medo, medo dos estrangeiros que desconhecido e medo de sua população de ser presa e morta.
Prezado Amigo e Mestre, Mauricio
Desculpe-me pelo ceticismo, mas existem dados nessa equação que ainda não estão devidamente claros p/ que possamos vislumbrar a dita "primavera árabe" como sendo um período de flores e cores dominando a região.
A queda dos ditadores do Egito, Líbia e Tunísia é, sem dúvida alguma, uma boa notícia para o mundo. A questão agora é saber qual o caminho que esses países irão seguir em relação ao grau de incidência da visão fundamentalista islâmica em seus processos de reorganização política e social e suas consequências nas relações com Israel.
Atores como a Irmandade Muçulmana e os grupos jihadistas que participaram dos levantes que culminaram com a queda dos ditadores devem ser analisados com cautela, pois, a depender do grau de influência desses mesmos atores, estaremos, muito provavelmente, presenciando uma piora significativa no quadro da segurança regional, com importantes consequências nas relações israelo-palestinas.
Eu, de minha parte, prfiro classificar a "Primavera Árabe" ainda como um "Outono"...
Grande abraço!
Gonçalez
Salve, Marcelo.
No primeiro momento, tanto Israel quanto EUA estiveram quase ausentes dos protestos, mas acredito que a tendência é que isso mude, na medida em qe os novos governos forem tomando posse e começarem a redefinir a agenda externa. Ainda veremos muita turbulência pela frente.
Grande Gonçalez,
Até aqui houve pouca influência dos fundamentalistas nas revoltas - eles parecem tão ou mais perdidos do que os próprios regimes autoritários, e no Egito a Irmandade Muçulmana se fragmentou em várias facções, com muitos abandonos, sobretudo entre os ativistas mais jovens.
Os riscos maiores neste momento me parecem ser o aumento da violência de fundo tribal (Líbia, Iêmen) ou sectário, como sunitas x xiitas. Nesse sentido, coisas bem ruins podem acontecer. Mas até agora tudo tem corrido até melhor do que poderíamos esperar.
abraços
Prezado Maurício
A Folha de São Paulo traz uma entrevista extremamente ilustrativa feita pelo jornalista Marcelo Ninio com um dos líderes do grupo Hamas (Talal Nasser)feita no escritório do grupo em Damasco - Síria.
Vale a pena conferir para se ter uma idéia do quão complexa é a situação que envolve a questão palestina e Israel.
Grande abraço!
Gonçalez
Prezado Mauricio,o caso libio a questão das armas parece que é o que mais preocupa e ainda para quem lutou o apoio da Argélia a Gaddafi vai ficar atravessado na garganta, provavelmente nascerá um eixo Tripoli/Tunis/Rabat X Frente Polisário e Argélia.
Internamente a Libia tem tantos problemas econômicos e a unificação do país de fato.
No discurso externo de um país sem fronteira a "intervenção iraniana" na Síria tão fresca na memória com o massacre de sunitas, faz do o inimigo externo ser a ditadura do Bashir por um bom tempo.
Até acredito que Israel deva aparecer no discurso, vejo as relações ruins até por que o fundamentalismo religioso hoje já domina 20% do Knesset e deve crescer também não ajuda, eles hoje juntos com partidos nacionalistas extremados tem soluções unilaterais, só ver o duro pedido deles ao Primeiro Ministro em retaliação a criação palestino (http://www.haaretz.com/news/diplomacy-defense/israel-must-annex-west-bank-settlements-right-wing-mks-tell-netanyahu-1.387018).
Mas, acho que a primeira música da FM de Benguazi ser um rap dá para ver que alinhamento eles preferem. Sem acompanhar tanto a Tunisia, acho que eles mais querem de Israel é que não apareça no noticiário nem com mais poder a tribunais rabinicos nem novos assentamentos na palestina.
Salve, Gonçalez.
Obrigado pela dica, não tinha visto a entrevita, vou procurá-la.
Caro Marcelo,
A Argélia está preocupada sobretudo com estabilidade e inclusive anunciou que prenderá Kadafi caso ele entre no país - há rumores que estaria escondido próximo à fronteira argelina.
Israel anunciou a expansão dos assentamentos, mesmo em meio ao debate na ONU, o que é bastante significativo da posição do país. Pode mesmo ocorrer represálias ou choques armados nos territórios palestinos.
abraços
Mas em que a primavera arabe interfere nos conflitos entre judeus e arabes?
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