quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Passado Imperfeito



Toda idéia falsa termina em sangue, mas é sempre o sangue alheio.
Albert Camus

Tony Judt é um historiador inglês que leciona na Universidade de Nova York, e de quem tinha lido o bom Postwar, abrangente análise da Europa contemporânea. Seu novo livro é ainda melhor: “Passado Imperfeito: um olhar crítico sobre a intelectualidade francesa no pós-guerra” . Judt examina a batalha de idéias na França entre a libertação do jugo nazista (1944) e um momento chave da Guerra Fria, a invasão da Hungria pela União Soviética (1956).

O tema central do livro é a relação dos intelectuais franceses com o comunismo e seu duplo padrão de julgamento, ou mesmo o silêncio, diante dos crimes da URSS e de seus governos-satélites. O período examinado por Judt foi o auge da esquerda na política da França. A direita estava desacreditada por seu apoio a malfadada República de Vichy, o regime colaboracionista do marechal Pétain, que mostrou um notável entusiasmo em ajudar os nazistas em suas atrocidades, em particular quando elas envolviam a morte de judeus. Embora houvesse diversas correntes ideológicas na esquerda, o comunismo prevalecia em função de seu papel central na Resistência, e também na admiração pelos triunfos da URSS na guerra contra a Alemanha.



O paradoxo é que os mais importantes intelectuais franceses da época não eram membros do Partido Comunista, apenas simpatizantes como Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir. Judt parece sentir um tipo de prazer perverso em apontar as (muitas) bobagens laudatórias que Sarte escreveu sobre Stálin, mas o mais interessante são as posições ambíguas adotadas por Albert Camus ou pelo pensador católico Emmanuel Mounier.

Camus, aliás, é retratado no livro como o mais lúcido entre todos os grandes pensadores franceses. Ele demonstra a rara capacidade de mudar de idéia e admitir seus erros. Não foi o único, claro. Para Judt, muitos ex-admiradores da URSS trocaram de posições quando houve o golpe comunista em Praga (1948), seguido do tipo de julgamento-espetáculo que era comum na época, mas que chocou os franceses por se abater sobre pessoas com quem tinham laços de amizade ou mesmo de luta comum na Resistência e na Guerra Civil Espanhola.

Judt é bastante crítico dos erros cometidos pelos intelectuais franceses, mas seu livro tem também uma certa nostalgia daqueles tempos de maîtres-à-penser e quando ele comenta a vida cultural da atualidade, é nítido seu desencanto com a falta de debates profundos. Enfim, como ele mesmo escreve, intelectuais são cronicamente descontentes com si mesmos.

No site da Editora Nova Fronteira, é possível baixar o primeiro capítulo, gratuitamente.

2 comentários:

Maria-Sem-Vergonha do Cerrado disse...

olá, cheguei ao seu canto virtual e gostei muito do que vi.
Voltarei mais vezes.
Um abraço

Maurício Santoro disse...

Obrigado, Maria, seja bem-vinda ao blog.

Abraços