segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Por que Orwell Importa



Devo ao amigo Gabriel um excelente presente: o livro "Why Orwell Matters", de Cristopher Hitchens, que acaba de ser lançado em português comm o título "A Vitória de Orwell". Ambos compartilhamos a admiração pelo estilo literário de Hitchens e por sua verve de polemista franco-atirador, absolutamente imprevisível em suas contendas, que abarcam de Madre Teresa de Calcutá (!) a Henry Kissinger e incluem pérolas do jornalismo como seu artigo "Belive me, it´s torture", no qual descreve de forma impagável como mudou de idéia a respeito dos métodos de interrogatório usados para combater o terrorismo.

Hitchens naturalmente se identifica com George Orwell, o escritor e jornalista britânico de vida breve mas com uma obra rica em romances e ensaios, que tratam de temas como o imperialismo europeu na Ásia, o totalitarismo soviético, a guerra civil espanhola e os dilemas liberais e progressistas em meio à crise da democracia na década de 1930 e no alvorecer da Guerra Fria.

O livro não é uma biografia tradicional, e sim um perfil intelectual, no qual as idéias de Orwell são apresentadas em capítulos que sintetizam suas posições - e oposições - em relação ao imperialismo, à direita, à esquerda, ao feminismo, aos Estados Unidos e à Inglaterra, com seções um pouco menores abordando seus romances e sua recepção pelos críticos culturais contemporâneos.

Hitchens só é Hitchens se estiver defendendo ou criticando uma causa, e ele assume a defesa de Orwell com relação a seus opositores ideológicos mais ferozes, em todos os espectros políticos. É preciso ao mostrar como muitas vezes as idéias de Orwell foram deturpadas por seus críticos, mas admite que o escritor mantinha certos preconceitos com relação aos homossexuais e às mulheres emancipadas.

Naturalmente, todos temos nossas limitações, mas o que impressiona em Orwell é como ele foi capaz de superar várias delas. Criado numa família de elite, optou por não cursar a universidade e serviu como policial na então colônia britânica da Birmânia, experiência que o deixou enjoado com o imperialismo. Pediu demissão e viveu frugalmente como escritor e jornalista. Lutou na Espanha com uma milícia anarquista e foi testemunha - e quase vítima - do autoritarismo dos comunistas locais.

A rejeição ao totalitarismo se manteve mesmo durante a Segunda Guerra Mundial, quando a URSS era fundamental para a derrota da Alemanha nazista, mas ao contrário de muitos, Orwell nunca embarcou na ilusão de acreditar que o regime stalinista era algo mais do que uma máquina terrivelmente repressora. Daí surgiram seus romances mais famosos, "Revolução dos Bichos" e "1984".

Intelectuais independentes e críticos costumam ser leitura bem mais interessante do que aqueles que jogam as cartas marcadas das quase sempre tediosas contendas das igrejinhas partidárias. Por isso Orwell importa e os pontos que Hitchens levanta são de suma importância para manter acesa a chama da inquietação. Sempre

3 comentários:

Anônimo disse...

"Intelectuais independentes e críticos costumam ser leitura bem mais interessante do que aqueles que jogam as cartas marcadas das quase sempre tediosas contendas das igrejinhas partidárias."

That's my fucking point, old chap.

Fico contente que tenha gostado.

Pretendo ler o meu em breve.

Abração.

Gabriel

daniel disse...

Esse livro é a melhor coisa que o Hitchens já escreveu. Lindão!

Maurício Santoro disse...

Salve, Gabriel.

E como fazem falta!

Olá, Daniel.

Li muitos artigos do Hitchens, mas este é o primeiro livro. Tenho vontade em ler outros. Quem sabe ele escreve algo sobre o irmão, Peter Hitchens, um tory religioso que parece uma paródia do próprio Cristopher!

abraços