quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Holbrooke



Richard Holbrooke, talvez o melhor diplomata dos Estados Unidos, morreu nesta semana. Marcado pelo trauma do Vietnã, teve o ponto alto de sua carreira como o negociador da paz na Bósnia e falhou em seu último posto, ao lidar com Afeganistão e Paquistão. Além disso, foi importante na criação e consolidação da revista Foreign Policy (reação ao conservadorismo da mais tradicional Foreign Affairs durante a guerra do Vietnã) e teve lucrativa carreira como banqueiro de investimentos. Sua trajetória ilustra a oscilação do poder americano nos últimos 40 anos, com o declínio na década de 1970, a ressurgência nos anos 90 e a inquietação atual com as crises na Ásia Meridional e a ascensão de novas potências.

Holbrooke decidiu entrar para a carreira diplomática ainda no ensino médio, após ouvir um discurso inspirador de Dean Rusk, um político que tornou-se Secretário de Estado no governo Kennedy. Holbrooke era bem o homem da “Nova Fronteira” de JFK, servindo na África como diretor do Peace Corps no Marrocos, mas vivendo também o lado sombrio do idealismo, em longos anos de serviço no Vietnã, acompanhando o aprofundamento da tragédia no país.

De volta a Washington, trabalhou na equipe que preparou o longo estudo sobre o envolvimento americano na guerra. Anos depois os documentos seriam vazados para a imprensa por um de seus colegas, Daniel Ellsberg, e ficaram conhecidos como “Pentagon Papers” (pois é, essas coisas aconteciam mesmo antes do Wikileaks).
Holbrooke escolheu o caminho público em suas críticas ao Vietnã, lecionando em Princeton, escrevendo artigos para revistas e editando com sucesso a Foreign Policy. Foi sua guinada de burocrata para político, pois dali em diante ele virou um emissário de confiança de todos os presidentes democratas, servindo como embaixador e em altos postos no Departamento de Estado, embora nunca tenha obtido o status ministerial.

Ele era descrito com freqüência como um homem de temperamento difícil, muito vaidoso e ocasionalmente arrogante e agressivo. Os defeitos tiveram lá sua utilidade, em especial na década de 1990, quando ele intimidou diversos presidentes e políticos nos Bálcãs, trancou-se com os principais negociadores por três semanas e saiu com um importante acordo de paz de Dayton, que encerrou a guerra na Bósnia. Foi o auge dos Estados Unidos como o “honest broker”, a nação capaz de garantir a estabilidade mundial no turbulento mundo do pós-Guerra Fria.

As complexidades da situação no Afeganistão e no Paquistão estão provavelmente além da capacidade individual de qualquer um, e a sucessão de guerra, terrorismo, violência e instabilidade faz com que a região seja considerada como a mais perigosa do planeta. Um final inglório para uma carreira extraordinária.

4 comentários:

Wellington Amarante disse...

Boa tarde Maurício!

Gostaria de saber se Holbrooke escreveu algum livro? Ler coisas dos diplomatas que estiveram presentes em negociações importantes é um bom exercício para compreendermos um pouco melhor o mundo diplomático.

Forte abraço!

Maurício Santoro disse...

Salve, Wellington.

Escreveu sim. "To End a War", sobre suas negociações na Bósnia.

Abraços

Anônimo disse...

Santoro, meu velho, como vai?

Cara, li o especial que a Foreign Policy fez sobre ele e achei fantástica uma citação do Kissinger:

"If Richard calls you and asks you for something, just say yes. If you say no, you'll eventually get to yes, but the journey will be very painful"

Abração, old chap.

Gabriel Trigueiro

Maurício Santoro disse...

Salve, dom Gabriel.

Quem sou eu para discordar de Henry K :-)

Aliás, o Holbrooke foi assessor de HK, o que sempre é uma grande escola para aprender relações internacionais.

Abraços