segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
O Mapa do Amor, Ahdaf Soueif
Continuando com a idéia de ler literatura árabe contemporânea, nesta semana é a vez do romance “O Mapa do Amor”, da egípcia Ahdaf Soueif (foto), uma bela mistura entre lirismo e política no Oriente Médio, por meio do contraste entre dois casais de apaixonados, no início do século XX e no fim da década de 1990, quando o livro foi publicado.
O enredo é dominado pela paixão entre dois aristocratas, a inglesa Anna e o egípcio Sharif, que se conhecem no Cairo no turbulento contexto da consolidação do poder britânico sobre o Egito. Anna é a jovem viúva de um militar que morreu na campanha para derrotar a rebelião islâmica no Sudão. Sharif, um líder nacionalista que luta pela autonomia de seu país.
O Egito nunca foi formalmente uma colônia britânica, mas a experiência de dominação foi semelhante. Oficialmente parte do Império Otomano, desde meados do século XIX o país era governado por um soberano, o quediva, com poucos laços concretos de vassalagem ao Sultão em Constantinopla. Os governantes egípcios lançaram ambiciosos projetos de modernização, como a construção do Canal de Suez, que os deixaram completamente endividados. Britânicos e franceses ganharam grande influência no país a partir do controle de suas finanças públicas e a ocupação militar da Grã-Bretanha começou após uma rebelião nacionalista em 1882.
Soueif faz de Sharif filho e sobrinho de líderes dessa revolta, e ele tenta encontrar maneiras de aproveitar ao máximo os espaços de liberdade criados pelos britânicos, como jornais, tribunais e um arremedo de parlamento, para defender a causa do Egito. Anna, uma aristocrata não-convencional e algo rebelde, revela-se uma parceira entusiasmada de seu projeto, enquanto ambos enfrentam a desconfiança da colônia européia no país.
Quase cem anos depois, as cartas e o diário de Anna são descobertos por Isabel, uma de suas descendentes, que vive em Nova York e apaixona-se por um músico egípcio, Omar, também parente distante de Anna. Ele lhe aconselha viajar ao Egito para descobrir os detalhes do documento e lá ela torna-se amiga íntima de Amal, irmã de seu namorado e as duas viajam pelo país e pela história, enquanto a política egípcia passa pelas dificuldades da ascensão dos radicais islâmicos e da repressão desmedida e injusta do governo de Mubarak.
O romance explora com habilidade as analogias entre os dois momentos do Egito e do Oriente Médio, ressaltando semelhanças como a questão palestina. Sharif se preocupa com o início da colonização sionista da região, que vê de modo semelhante aos projetos imperiais dos britânicos. Omar e Amal, filhos de mãe palestina, lamentam o rumo que a região tomou e desconfiam da ação dos Estados Unidos. Soueif também frisa a constante repressão política na história egípcia e fala com nostalgia do período de Nasser, como um tempo de esperança e de mudanças sociais, como reforma agrária.
Em “O Mapa do Amor” a utopia é menos política e mais pessoal, o romance entre pessoas de culturas diferentes oferece mais possibilidades do que os grandes projetos de transformação da sociedade. Uma das cenas mais bonitas é o encontro de Amal com ex-colegas do movimento estudantil da década de 1970, que comentam a ocupação da Praça Tahrir (pois é, desde então...) e como aquilo não levou a nada. Em outra passagem, os acertos imperiais entre Grã-Bretanha, França e Itália levam à invasão da Líbia pelos italianos, detonando o processo que até hoje reverbera naquele país.
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6 comentários:
Maurício, diante dessa análise vou mesmo ler O Mapa do Amor...
Ah, quanto à trilogia do Cairo, levarei comigo para a Alemanha!!! =)
Quando você quiser, moça, os livros estão todos à sua disposição.
beijo
Eu estou lendo este livro e estou gostando muito, é realmente um retrato muito fiel com personagens profundos e cativantes.
O Mapa do Amor, amei ler este livro!
O Mapa do Amor, amei ler este livro!
Esse livro toca em assuntos, como a educação da mulher?
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