Na semana passada, a Suprema Corte do Egito ordenou a dissolução do Parlamento e a junta militar que governa o país decretou medidas que restringem a possibilidade de manifestações contra o regime (como a possibilidade de prender ativistas por bloquear o trânsito). O novo Legislativo será nomeado pelas Forças Armadas e irá elaborar a Constituição do país. Ambas as iniciativas aconteceram às vésperas do 2º turno das eleições presidenciais que opõem o ex-primeiro-ministro da ditadura e um representante da Irmandade Muçulmana e significam o esforço das Forças Armadas em controlar a transição política, limitando os poderes dos partidos islâmicos que despontam como os principais grupos do país. É um golpe de Estado judicial.
Os diversos partidos religiosos formavam cerca de dois terços do Parlamento. A Irmandade Muçulmana, o maior deles, tem longa e contraditória relação com os militares que governam o Egito desde 1952. Já foram aliados, inimigos e nos últimos anos da ditadura Mubarak ensaiaram um pacto de não-agressão e um certo nível de colaboração, embora a entidade não pudesse, oficialmente, participar da política. A força que ela ganhou com a queda do regime levou a uma disputa feroz pelo poder.
O Egito tem um poder judiciário considerado razoavelmente independemente, mas isso não se aplica aos tribunais superiores, cujos juízes são indicações políticas do governo. Não é surpresa, portanto, que a Suprema Corte tenha ordenado a dissolução do Parlamento. Foi alegada uma obscura razão técnica, a respeito de artigos ambíguos na lei eleitoral, mas considera-se que o real objetivo é afastar os partidos islãmicos do Legislativo, que entre outras tarefas irá elaborar a nova Constituição do país.
Enquanto escrevo, ainda não há o anúncio do vencedor das eleições. As análises sobre a conjuntura política do Egito estão bastante sombrias, com estudiosos prevendo a deflagração de conflitos violentos pelo poder, inclusive uma guerra civil. É uma possibilidade bastante alta. Somando a ela os riscos das eleições na Líbia e a persistência da brutalidade na Síria e no Iêmen, temos o Oriente Médio mergulhado numa gravíssima situação, em meio à crise na Europa e nos Estados Unidos.
7 comentários:
"O Egito tem um poder judiciário considerado razoavelmente independemente, mas isso não se aplica aos tribunais superiores, cujos juízes são indicações políticas do governo"
Igualzinho ao Brasil, à Argentina e aos EUA. Curiosidade ou temeridade?
A Junta Militar está cavando uma guerra civil, deixando poucas escolhas seja para a irmandade muçulmana, outros islamistas ou para a multidão que outrora ocupou a praça Tahir.
Uma justiça controlada por homens do Mubarak, um estado maior com homens do Mubarak, uma assembléia constituinte escolhida a dedo pelos mesmos. Como poderíamos confiar no resultado da eleição desse fim de semana?
O único resultado que não estaria imediatamente manchado de ilegitimidade seria uma vitória da irmandade.
Mas mesmo assim, teria esse "presidente" poder para reformar os outros poderes?
Salve, Diogo.
Com a única - e profunda - diferença de que Argentina, Brasil e Estados Unidos têm governos eleitos democraticamente, ao passo que até o dia de hoje o Egito nunca havia escolhido um governante nas urnas.
Caro André,
Os números iniciais indicam vitória expressiva do candidato da Irmandade, embora eu acredite que muito sangue ainda vai rolar nas ruas do Cairo e de outras cidade egípcias.
abraços
Mauricio, e ainda por cima quando há pleito democrático dá essa zona toda de ambos os lados declararem vitória.
Temo por um cenário argelino, onde o partido islâmico ganhou, mas não levou - o que implicou em guerra civil.
Salve, Diogo.
Exato. O fantasma da Argélia ronda o Egito. E se estourar uma guerra civil por lá, impacta na Faixa de Gaza, em Israel, tem fortes consequências regionais.
abraços
Por sinal, muitos boatos no Cairo entre eles o Sharif irá ser dado como vencedor do pleito com vantagem de 260.000 votos...
Se ocorrer esse "golpe" qual seria a reação da comunidade internacional?
Salve, Marcelo.
Acredito que pela importância política do Egito, EUA e União Européia provavelmente aceitariam um eventual golpe militar no país. Desconfio inclusive que respirariam aliviados.
abraços
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