quinta-feira, 10 de julho de 2008

Quando Estados Fracassam



A revista Foreign Policy publicou seu Índice de Estados Fracassados de 2008. A expressão começou a ser utilizada com freqüência na década de 1990, para identificar países muito frágeis onde o colapso da ordem local resultava em ameaças internacionais, na forma de guerras, refugiados em massa ou crises econômicos. Atualmente também se destaca muito o impacto desses Estados como santuário para terroristas ou mesmo origem de tragédias ambientais que se espalharão por toda uma região. No Brasil em geral se usa a expressão “Estado falido”, tradução errada do termo em inglês, Failed State.

O Índice identifica 40 Estados em maior risco de colapso, a maioria deles na África central, no Oriente Médio ou no sul da Ásia. Os dez mais graves são Somália, Sudão, Zimbábue, Chade, Iraque, República Democrática do Congo, Afeganistão, Costa do Marfim, Paquistão, República Centro-Africana. A América Latina só comparece na lista dos piores com o Haiti (15o) e a Colômbia (37o).

O que faz com que um Estado seja considerado fracassado? A equipe que criou o índice formulou 12 indicadores, que procuram mensurar tensões étnicas, perda de controle sobre o território, existência de grupos armados ilegais, ruptura do respeito às leis etc. Conferindo a lista elaborada pela revista, me pareceu que ela está correta quanto aos casos mais graves, mas é bastante questionável quanto a outros aspectos. Por exemplo, acredito que a situação da Bolívia e da Venezuela foi subestimada pelos avaliadores. E muitos argentinos dariam um sorriso cético ao ver seu país classificado como “o mais estável” da América Latina, ao lado do Chile e do Uruguai.

Um elemento interessante da análise da Foreign Policy é cruzar o Índice dos Estados Fracassados com o Índice dos Poderes Parlamentares. O resultado, abaixo, mostra que países com congressos frágeis diante do Executivo tendem a apresentar mais riscos de colapso, já que possuem menos controles e verificações das autoridades (clique na imagem para ampliá-la). Gostaria de ver cruzamento semelhante com os índices de liberdades de imprensa preparados pela Repórteres Sem Fronteiras ou pela Freedom House.



Outro achado da pesquisa é confirmar que a alta dos preços do petróleo não trouxe benefíciou significativos para a estabilidade política dos países que são grandes produtores dessa commodity. O motivo, claro, é a extrema concentração de poder e a corrupção das elites petrolíferas de países como Angola e Nigéria.

Há melhoras nessa quadro sombrio: Costa do Marfim, Haiti e Libéria avançaram bastante desde a avaliação do ano anterior. Os três são países que contam com a presença de missões de paz da ONU e com todos os seus problemas, essas iniciativas têm ajudado na estabilização política e na manutenção de cessar-fogo, ainda que não consigam resolver a pobreza extrema.

Aliás, encomendei na Amazon um livro sobre Estados fracassados: “The Bottom Billion: Why the Poorest Countries are Failing and What Can Be Done About It”, de Paul Collier. Espero apenas que a greve dos correios não dure muito e o pacote chegue na próxima semana, como estava previsto.

8 comentários:

SAM disse...

Falhado ou Fracassado, é muito mau que um índice desses sequer exista (não pela análise em si, mas pelo que ela representa e nos diz).

Maurício, como creio que lhe disse anteriormente, pondero essa área de politologia ou relações internacionais para meus estudos doutorais. Será que lhe poderia mandar um email pedindo algumas informações?
Obrigado!

Maurício Santoro disse...

Caro Sam,

é realmente assustador saber que há tantos Estados fracassados ao ponto de eles estarem para se tornar uma especialidade de ciência política, e com índices anuais, ainda por cima...

Terei o maior prazer em ajudar no que for possível, me escreva em msantoro@iuperj.br

Abraços

Patricio Iglesias disse...

Meu caro Maurício:
Comparto a pena de você e o Sam. Sim, adivinhou: dou um sorriso cético. Diria que o Brasil é mais estável que a Argentina, pensando na crise de 2001.
Tenho uma dúvida. Muito bonito o gráfico, mas, Cómo cuantificar a proporçäo da participaçäo do Poder Legislativo em relaçäo com o Executivo?
Saludos

Maurício Santoro disse...

Salve, Patricio.

Para medir isso em geral se criam uma série de indicadores, cada um dos quais tem uma escala (digamos, de 0 a 10) para tentar quantificar os poderes do legislativo, como a capacidade de definir o orçamento ou vetar propostas do Executivo.

Na América Latina, via de regra, os poderes parlamentares são reduzidos com relação aos do Executivo, ao ponto que se fala em um "hiperpresidencialismo" na região.

Abraços

Patricio Iglesias disse...

Caro Maurício:
Obrigado pela resposta.
Beijos

Aloisio Milani disse...

Maurício,
Legal esse assunto. Sempre acompanho suas reflexões por aqui. Fiz um comentário em seu post sobre o Haiti recentemente, mas não sei se você viu. Meu nome é Aloisio, sou jornalista, mantenho um blog sobre Haiti e outras coisas... amigo do Pedro Serrano. Bom, fiz um post hoje sobre o crime de guerra e a operação na Colômbia de Uribe. Depois veja lá.
http://aloisiomilani.wordpress.com/2008/07/17/crime-de-guerra-sim-na-colombia-de-uribe/

Maurício Santoro disse...

Salve, Aloisio.

Que belo blog você tem!

Sigo acompanhando as notícias sobre as FARCs, talvez escreva mais a respeito em breve.

Abraços

Aloisio Milani disse...

Que legal... Então, quem me falou sobre você primeiro foi o Pedro Serrano. Qualquer hora vamos conversar sobre Haiti?