segunda-feira, 10 de maio de 2010

O Que Resta do Tempo



Em “O Que Resta do Tempo – crônica de um presente ausente”, o cineasta Elia Suleiman conta a história de 60 anos de conflito árabe-isralense por meio de quatro episódios na vida de uma família palestina de classe média, residente na cidade de Nazaré, que se vê incorporada a contragosto no Estado de Israel. Político, poético e autobiográfico, Suleiman criou uma obra de arte comovente que mostra que a resistência à opressão passa por muitos caminhos, inclusive os gestos cotidianos, como pescar, manter a língua afiada, dançar durante o toque de recolher e jamais perder a capacidade de indignação e surpresa com os absurdos da guerra.

A narrativa começa em 1948, com a guerra que criou Israel. O pai de Elia é um rapaz que fabrica armas e integra uma mílicia árabe desorganizada, que não é páreo para o exército israelense, que rapidamente ocupa Nazaré. Preso após ser traído por um companheiro palestino, ele passará por momentos dramáticos com seus captores.

No episódio seguinte, em 1960, o cineasta é um menino sonhador e inquieto, que estuda numa escola israelense voltada para a minoria árabe que vive no país. Os alunos cantam canções em hebraico que falam da alegria da criação de Israel, mas Elia se mete em confusão por suas opiniões heterodoxas. Os palestinos enfrentam a humilhação da derrota: o vizinho da família se embriaga e ameaça se autoimolar, enquanto tece teorias mirabolantes para pensar maneiras de vencer o inimigo. A tia do garoto desenvolve uma obsessão com o escapismo da TV, e acredita sempre ver na tela a irmã que emigrou para a Jordânia.



No trecho posterior, em 1970, Elia é um adolescente cujos problemas vão se tornando mais sérios, incluindo enfrentamentos com as autoridades israelenses por conta de atividades na resistência à ocupação. A causa palestina vive um momento de desorientação, abalada pela morte do presidente egípcio, Gamal Nasser, que havia sido seu principal patrono.

O último episódio mostra um Elia já maduro, retornando a Nazaré para visitar a mãe doente. A cidade enfrenta a turbulência da Segunda Intifada, e o cineasta visita também Ramalah, a capital da Autoridade Palestina. O cineasta vê com humor os detalhes surreais do conflito e as contradições entre a modernização da sociedade – imigrantes e turistas de várias partes do mundo, cultura pop – com a persistência dos ódios étnicos, nacionais e religiosos.

“O que Resta do Tempo” é um filme com surpreendentemente poucos diálogos, Suleiman tem um estilo cômico que lembra o humor mudo de Buster Keaton ou Jacques Tati. E, como Keaton, seus personagens não sorriem. É fascinante como ele mostra a passagem de 60 anos por meio de pequenas mudanças, no cenário, no figurino, nos objetos em cena.

3 comentários:

Marcelo L. disse...

Prezado Mauricio,

Parece coincidência,mas Israel prendeu dois líderes israleistas árabes esses dias...Amir Makhoul e Omar Sayid...a coisa está preta para aquele lado menos democracia a cada dia.

O que resta do tempo ainda não encontrei infelizmente, mas já assisti Libano e é um bom filme.

Maurício Santoro disse...

Salve, Marcelo.

A retórica israelnse subiu muito de tom nesta semana, chamando Irã, Síria e Coréia do Norte de "o novo eixo do mal".

Mas acredito que isso se deve a outros fatores: um esforço da Rússia de se reaproximar da Síria, e a apreensão de um carragemento de armas da Coréia do Norte para o Irã.

Abraços

Bruna disse...

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