quarta-feira, 4 de abril de 2007
A Construção do Inimigo
"Não há nada que o brasileiro odeie mais do que o argentino", me dizia uma colega de trabalho.
Não penso que seja assim. Mas reconheço que existe no Brasil um sentimento forte de hostilidade contra a Argentina. O oposto, digo de passagem, daquilo que experimentei no país vizinho. Por que isso acontece?
Rivalidade no futebol? A Itália é uma adversária tão ou mais perigosa e em geral os brasileiros tem pelo país da bota grande simpatia.
Histórico de guerras? Foram apenas duas em quase 200 anos de vida independente, sendo em que em uma delas na verdade o Brasil lutou aliado aos rebeldes argentinos que queriam depor o caudilho Rosas. E isto foi em 1852, muito tempo, em especial para um país com pouca memória nacional como o Brasil.
Disputas políticas internacionais? Tiveram lá seu peso, mas acho difícil que o Galvão Bueno pense nos conflitos dos anos 60 e 70 pela energia hidrelétrica no Cone Sul enquanto narra as partidas de futebol. Tampouco acredito que esteja em jogo a tarifa externa comum do Mercosul ou as brigas pelos subsídios do trigo e do açúcar.
Como se deu a construção do inimigo? Não tenho realmente a resposta. O tema pede boa pesquisa, nos moldes da que li em Buenos Aires a respeito da "imagem do outro" entre Argentina e Chile, estudo muito interessante que abordava manuais escolares, imprensa. Minha aposta é que a cultura da inimizade extrapolou em muito as discórdias político-econômicas entre brasileiros e argentinos e virou um entrave, em si mesma, ao processo de integração. Em outras palavras, foi irracional.
Me interessa saber como ela foi construída, porque é fundamental desmontá-la. Disse a minha colega que as novas gerações, nas duas margens do rio da Prata, têm visões muito mais positivas e abertas quanto aos outros países. Isso passa pelo turismo, pela admiração cultural e pela consolidação dos laços humanos, da amizade fraterna que surge tão fácil e naturalmente entre brasileiros e argentinos.
No fim, na Argentina nunca me senti em terra estrangeira, mas sim em casa de amigos.
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12 comentários:
Eu penso que a rivalidade é uma luta pela liderança no Cono Sul, já que os dois säo os paises mais relevantes da regiäo em demografia, economia, etc.
A propósito, a melhor forma de se inimigar com os argentinos mais chauvinistas é com um mapa que diga "Falkland Islands". HAHAHA
Saludos
Com todo respeito, acho que a origem dessa inimizade no imaginário popular realmente é o bestiário dos narradores esportivos (e aquela história de Maradona x Pelé).
Por falar em Argentina, tenho uma proposta a lhe fazer, caro Santoro. POde entrar em contato comigo? (não sei onde meti seu e-mail...)
sergioleoarrobahotmail.com
O problema com os argentinos é o mesmo nosso, cariocas, com os paulistas. Eles são terríveis como coletivo, em grupo, mas são espetaculares individualmente. (-;
Maurício meu amigo, fico feliz em perceber que qualquer rivalidade no mundo pode chegar ao fim. Mais ainda ao perceber que a grande mídia luta por isso, veja o Big Brother que trouxe e levou um Grande Hermano pra cá e uma "Big Sister" pra lá. Mais uma vez, Big Brother Brasil se mostra um pouco de cultura e responsabilidade social, quem diria, hein?
Os argentinos só apaziguaram o seu tom de voz ao perceber que, depois de quase viajarem ralo abaixo, estão em situação inferior a do Brasil, tendo que aceitar o fato de que somos, sim, a real força da América do Sul.
Nos anos 80 tive a chance de morar em Buenos Aires por um ano e, nessa estreita convivência com os porteños, vi a forma a qual eles se impunham em relação ao Brasil. Eles eram "superiores", nós os "malandros do samba e da praia, sem qualquer peso e força".
Claro que o contato pessoal entre argentinos e brasileiros sempre será ótimo e cheio de simpatias... A amizade entre pessoas sempre há de ser boa, muito além de rixas entre países.
A verdade é que as posturas mudam conforme muda a força e a imagem.
Acho que o problema é bastante complexo. Começa na rivalidade histórica do futebol, já que este esporte é idolatrado nos dois países. O Brasil enfrenta times argentinos com uma frequência muito maior do que times italianos, por exemplo. Brasil e Argentina buscam a hegemonia no futebol sul-americano. Estes confrontos também acontecem na busca da liderança em questôes econômicas.
Mas há problemas mais sérios do que essa rivalidade... Estou assustado com aquela sua mini-pesquisa sobre o problema dos aeroportos. Ao votar, notei que 100% (ou 5 pessoas) haviam escolhido a opção da imprensa "sensacionalista". Será que a capacidade analítica do brasileiro acabou ? Será que os problemas que estão acontecendo nos aeroportos são invenção da imprensa sensacionalista ? Será que as pessoas estão ficando presas nos aeroportos aparecer nas montagens dos telejornais ? Há uma opção em que a responsabilidade é dividida entre o governo e os operadores. Ninguém a acha adequada ? Será que o governo é tão competente e só teve o azar de não conseguir resolver absolutamente nada nestes últimos 6 meses ? Acho que a pior rivalidade não é aquela entre brasileiros e argentinos, mas sim entre a esquerda burra e teimosa e qualquer outra alternativa política. As pessoas vão continuar votando em pesquisas como estas, não para expressar o resultado de sua análise, mas para defender o seu candidato e sua posição ideológica. E boa sorte nos aeroportos e aviões brasileiros ! Ô imprensa maldosa e sensacionalista !
O que você pensa sobre a crise nos aeroportos brasileiros?
Mistura incompetência do governo com o oportunismo dos controladores de vôo, que tomaram o país como refém
Boa oportunidade para reformar o setor e tirá-lo do controle das Forças Armadas
Gostaria de entender o que acontece de verdade, porque a cobertura da imprensa é sensacionalista e manipula os fatos contra o governo
Bom, há muitas coisas para responder. Vamos lá.
Patricio,
Desculpe pelo Falklands, armadilhas do Google Images... E descuido bravo meu. Mas tento me redimir com o post desta quinta. :-)
Patrick, Paulo, com certeza o futebol desempenha um papel muito importante no imaginário da hostilidade entre os dois países e vale ressaltar o uso político que as duas ditaduras militares fizeram do tema. É um veio rico para pesquisar.
Leandro,
Não cheguei a ver as edições deste ano do Big Brother, mas pelo que acompanhei na Internet parece que foi uma experiência bem interessante, das dificuldades inciais com os idiomas até um certo entendimento entre os grupos.
A TV, e outras formas de cultura de massa, sempre desempenham papel importante na imagem que um povo tem do outro.
Anônimo,
Todas as pessoas que conheci na Argentina me disseram que o país mudou muito após a crise de 2001 e se aproximou bastante dos vizinhos da América Latina.
Será que o comportamento dos argentinos era diferente em outros momentos históricos? Acho possível, mas realmente me impressionou muito a maneira amável pela qual sempre fui recebido por lá. Em tudo diferente do esteriótipo.
Sergio, te mando logo mais uma mensagem para conversarmos.
Por fim, Paulo, penso que a enquete reflete um sentimento de inquietação com a cobertura jornalística sobre a crise. É claro que há um problema enorme nos aeroportos, mas quais são as causas reais do problema?
Me sinto muito mal informado sobre o tema e pelo visto a sensação é compartilhada por outros.
Abraços
Maurício, näo tem problema com o mapa; só é muito agrasado um artigo "proargentino" com um mapa sem as Malvinas. Saludos riopratenses.
Maurício, o último anónimo sou eu, justo nesse momento tive problemas com o computador. Abraços!
Maurício,
francamente, essa rivalidade com a Argentina é uma das maiores bobagens que os brasileiros podem nutrir, mas, é uma das imagens coletivas mais fortes que os brasileiros partilham. Assim como você, já me interessei outras vezes por pensar essa questão e ela quase foi meu tema de dissertação, mas resolvi não mexer com isso porque o tema me trazia muito mais negativas (não é por isso, não é por aquilo) do que uma resposta positiva das razões que levaram a tal rivalidade. Concordo também que ela não existe individualmente, entre as pessoas, assim como paulistas e cariocas. Mas é verdade também que ela acaba atrapalhando a integração e isso tem conseqüências negativas para ambos.
Sobre o futebol, creio que há uma inversão de causa e conseqüência aí. Ele é talvez o elemento da relação onde a rivalidade mais se manifesta, mas não a sua causa. Se fosse assim, deveríamos muito mais odiar os uruguaios. Eles venceram duas copas e duas olimpíadas antes de ganharmos o primeiro mundial. Uma delas, no Maracanã, na maior tragédia do futebol brasileiro. Os argentinos só passaram a ser nossos rivais no futebol depois de 78, quando venceram de forma um tanto vexatória a Copa que organizaram.
A política explica um pouco, mas então não seria melhor odiarmos os ingleses, ou os americanos mais tarde, ou mesmo os portugueses, o pá!
Acho que o tema merece exame aprofundado, quem se habilitar, me avise que estarei atento ao resultado. Quem sabe no futuro eu mesmo não me anime novamente.
Grande abraço
Salve, Rodrigo.
Bem, aí você tem uma sugestão de tema para sua tese de doutorado... Concordo com você quanto ao futebol, nenhuma derrota brasileira para a Argentina foi tão traumática quanto o massacre uruguaio em pleno Maracanã e ainda assim....
Meu palpite é que as ditaduras militares acentuaram muito essa rivalidade, mas para comprovar isso seria preciso pesquisar na imprensa de épocas anteriores e ver se o sentimento da rivalidade já existia, por exemplo, na época das disputas navais do início do século XX.
Que diabos, onde estão os construtivistas quando a gente precisa deles?
Abraços
Obrigado por Blog intiresny
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