segunda-feira, 29 de setembro de 2008

A Nova Constituição do Equador



Com vitória estimada em 65% dos votos, o presidente Rafael Correa aprovou a nova Constituição do Equador – um texto surpreendente que é provavelmente o mais avançado da América Latina e reconhece a união civil entre homossexuais, estabelece direitos para imigrantes, declara a educação pública obrigatória até o término do ensino médio, concede benefícios em saúde pública, agricultura familiar, microcrédito e proíbe a instalação de bases militares estrangeiras em seu território, o que significará o fim daquela que os EUA mantém em Manta.

A Igreja Católica não gostou da agenda social e organizou várias “missas-protesto” contra a nova Constituição. A oposição também se queixa de diversos pontos, como a possibilidade de que o presidente fique no poder por mais uma década, além de questionar a viabilidade econômica do Estado de bem-estar que a Carta estabelece. Há até um ensaio de movimentos autonomistas nas regiões, capitaneado pelo centro econômico, Guayaquil, mas o Equador não é tão fragmentado politicamente como a Bolívia: a Constituição foi aprovada por 23 das 24 províncias do país.

Um ponto particularmente importante é a gestão da economia. A Constituição (re)cria instrumentos para a atuação do Estado nessa área, sendo o mais relevante a volta do controle sob o Banco Central, que era autônomo. O Equador havia dolarizado sua economia em 2000, com assessoria do ex-ministro da Economia da Argentina, Domingo Cavallo.

Esta é a vigésima Constituição equatoriana desde 1830 – a última era de 1998 – e muitos analistas apontam ceticismo diante da possibilidade de que a nova Carta possa consolidar mudanças e direitos sociais, até pela grande instabilidade política. Ao longo desta década, nenhum dos oito presidentes completou o mandato. O próprio Correa era pouco conhecido até virar ministro da Economia na curta gestão de Alfredo Palacio (2005-2007) e despontar como um líder sem vinculações aos partidos tradicionais.



Assim como Chávez e Morales, Correa fala da nova Constituição como a ferramenta para construir o “socialismo do século XXI”. Analiso brevemente os significados das mudanças, e seus pontos controversos, num pequeno texto que escrevi para a Democracia Viva, a revista do Ibase, cuja edição atual trata dos 20 anos da Constituição do Brasil. O trecho inicial:

No século 19, a América do Sul viveu guerras civis que opuseram liberais e conservadores em temas como relações de poder central/províncias e Estado/Igreja. Ao fim de cada conflito, os vencedores promulgavam nova Constituição. No século 20, direita e esquerda se enfrentaram nas urnas e, com freqüência, as forças de mudança social foram solapadas por golpes militares. Neste início de século 21, os confrontos políticos se dão na Bolívia, no Equador e na Venezuela, em batalhas por novas Constituições que procuram consolidar as mudanças sociais que estão em curso nesses países. Embora tais processos ainda estejam em andamento, já é possível identificar pontos comuns entre eles.

O primeiro é a insatisfação dos movimentos sociais locais com os mecanismos tradicionais da democracia representativa, e seu desejo de complementá-los e fortalecê-los com instrumentos de participação popular. O caso boliviano é exemplar e remonta às mobilizações da década de 1990 pela valorização da comunidade rural indígena, o ayllu, e dos sistemas de governo e de justiça dos povos aymara e quéchua.


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