segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Céu de Brasília, Traço do Arquiteto



Se você acompanha este blog há algum tempo, deve saber que há poucos meses fui aprovado no concurso para a carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (gestor), que prepara administradores de nível superior para o governo federal. Por conta disso, há uma semana me mudei para Brasília e no dia seguinte iniciei o curso de formação na Escola Nacional de Administração Pública.

O curso durará cerca de cinco meses, com dez horas de aulas por dia. É bastante puxado, com módulos sobre ciência política, economia, administração pública e políticas públicas. Nesta primeira semana houve uma série de atividades visando a integrar a turma e apresentar os pontos principais da formação, incluindo palestras excelentes que explicam a organização do Ministério do Planejamento e da Casa Civil, os dois órgãos responsáveis pela coordenação das ações do governo federal.

O Planejamento é o encarregado da supervisão e coordenação da carreira, mas poderei trabalhar em qualquer órgão federal. De fato, são cerca de 700 gestores no Estado, distribuídos de maneira bastante diversa pelos diversos ministérios: cerca de 30% na área econômica, 20% no campo social e a outra metade dividida em fatias menores de 10% na Presidência da República, Meio Ambiente etc.

Como a carreira de gestor tem um perfil generalista, atrai pessoas com formações e histórias de vida bastante variadas. Na minha turma os grupos mais numerosos são economistas, administradores, advogados, analistas de relações internacionais e oficiais militares. A maioria já morava em Brasília e tinha experiência no serviço público, federal ou estadual. Fiquei surpreso com a pequena quantidade de cientistas políticos – somos apenas quatro, entre quase 100 pessoas. É um número baixo para uma carreira que é um verdadeiro paraíso para essa profissão.

O Brasil tem cerca de 70 anos de tradição em formar tecnocratas de alta capacitação - é realmente impressionante o nível de qualificação dos técnicos que tenho conhecido – e isso se traduz numa prática bastante bem-sucedida em estabelecer políticas públicas de Estado, com grande capacidade de continuidade mesmo em meio às turbulências da história do país. É uma história longa, que vem das reformas empreendidas por Vargas após a Revolução de 1930 (lei do serviço público, criação do DASP e dos institutos de previdência), passa pela modernização administrativa dos anos 40/50 (SUMOC, BNDE, Petrobras) e pelas reformas do início da ditadura militar (Banco Central, unificação da previdência, Ipea).

Infelizmente, o regime autoritário optou por um modelo que privilegiou as empresas estatais em detrimento da administração direta, dos ministérios e da presidência, e que isolou a burocracia da sociedade. A crise fiscal dos anos 80/90 enfraqueceu ainda mais esse quadro, mas após a estabilização econômica a situação começou a melhorar. Nas conversas com os colegas mais experientes, é consenso que o ponto mais baixo foi a tragédia do governo Collor, e que o Estado atual, com todos os seus problemas, avançou muito em relação ao passado recente. É preciso reconhecer a importância das medidas moralizadoras da Constituição de 1988, como o estabelecimento da obrigatoriedade dos concursos para ingressar no serviço público. Minha própria carreira foi criada em 1989, mas ficou quase uma década sem novas contratações.

O ritmo puxado do curso me deixa praticamente sem tempo livre durante a semana, mas aproveitei sexta, sábado e domingo para visitar os amigos que moram em Brasília, e começar a passear por esta cidade, que agora também é minha. Acredito que a maioria dos brasileiros têm uma imagem ruim da capital, mas essa é uma visão injusta. A qualidade de vida é muito alta, há ótimas opções de lazer, um grupo de habitantes que inclui algumas das pessoas mais inteligentes e interessantes que conheço e beleza por toda parte, nos traços de Niemeyer, nas quadras arborizadas e no amplo céu que é o mar daqui. É bom ter chegado, para começar uma vida nova.

12 comentários:

Leandro Bulkool disse...

Meu amigo, aproveite o máximo que você puder deste capital. Que bom que você encontrou pontos positivos na cidade, pq pra mim ela é muito estranha. A começar pelo povo que parece incorporar que todos estão de passagem e não querem formar raízes.

Abraços e quando vier ao Rio, dê notícias.

Anônimo disse...

Mandou bem, Maurício !!!

Aclimate-se logo pra continuar postando ... E dê um jeito tb de escrever mais sobre o resto da América Latina :-)

Abcs !!!

Patricio Iglesias disse...

Caro amigo, fico feliz de que tenha se instalado em Brasília, cidade que espero conhecer. Boa sorte na carreira.
Você chegou visitar La Plata? Também foi planificada e tem uma estrutura bastante simétrica, mas claro que näo ao nível da cidade de Niemeyer. Eu estive pra fazer umos trámites faz umas semanas, aconselho recorre-la.
Saludos!

Anônimo disse...

Parabéns pelo ingresso nessa importante carreira! Soube que as provas do concurso foram dificílimas.
Brasília é uma cidade interessantíssima e tem de tudo, até excelentes grupos de chorinho.
E por perto vc. tem Goiânia, Goiás Velho e tantas localidades e paisagens diferentes e encantadoras.
Quem nasceu e se criou em Brasília ama a sua cidade e fica feliz quando vê uma pessoa inteligente e simpática como vc. valorizá-la.
Fico confiante e tranquila em saber que vc. estará cuidando da gestão pública de nosso país. Certamente fará uma brilhante carreira e ajudará a melhorar a vida de nosso povo.
Votos de toda felicidade pessoal e profissional.
Maria Lucia

Maurício Santoro disse...

Salve, Leandro.

Brasília é uma cidade muito agradável, tudo que a moça pede é que lhe dêem uma chance de apresentar seus encantos. E as pessoas estão sendo extremamente gentis, me ajudando muito nestes dias iniciais.

Olá, Athalyba.

Pode deixar, o blog continua, apenas num ritmo mais lento em função do horário puxado na ENAP.

Hola Patricio,

Já soube da semelhança entre La Plata e Brasília, mas não cheguei a visitar a cidade argentina. Você será muito bem-vindo por aqui, é um pedaço interessante e diferente do Brasil.

Cara Maria Lúcia,

Muito obrigado pelos votos tão carinhosos. O concurso foi difícil, mas no mesmo nível de provas semelhantes como Banco Central, Tesouro etc. O que aconteceu foi um teste de ciência política mais rigoroso, que atrapalhou muitos candidatos.

Abraços

Anônimo disse...

Parabéns, Maurício e boa sorte na nova empreitada.

Giovanni Gouveia disse...

Vez por outra eu entro aqui neste blog, mas não o acompanho religiosamente, apesar de vê-lo com extrema simpatia.

Também tenho formação em Ciência Política (na verdade graduação em ciências sociais com área de concentração em política).

Nossa formação/profissão é extremamente desconhecida, muitas vezes alguns concursos tem vagas que, por formação, seriam destinadas a cientistas sociais mas esses muitas vezes são preteridos, e, em seu lugar, são contratados economistas, assistentes sociais, admnistradores, médicos...

Política Pública é uma cachaça das melhores, mas, via de regra, são tratadas mais pela dimensão da "eficiência" do que da "eficácia", ou seja, dimensão financeira predominando sobre a dimensão política. Defendo, particulamente, a fusão, ou utilização mútua, das duas coisas.

Em tempo, por melhor que seja a carreira, minhas narinas não sobreviveriam a passar tanto tempo em BSB, são extremamente sensíveis à secura daí...

Paulo disse...

Olá,

Seja bem-vindo!

Chegaste numa boa época, quando as chuvas retornam.

Mas, no ano que vem, quando enfrentar sua primeira seca, tenha sempre água por perto e mantenha as narinas hidratadas (pode-se inspirar um pouco de soro fisiológico) - ajuda bastante.

Espero que a seca não seja tão dura quanto a deste ano, nem a temperatura - tivemos a mais alta da história, mais de 35ºC!

Maurício Santoro disse...

Caros Hugo e Paulo,

Obrigado, sei que a seca será dificil, mas tem tempo até lá.

Olá, Giovanni.

De fato, nosso belo ofício ainda é muito desconhecido, mas no caso do concurso me parece que o que pesou mais foi a dificuldade da prova de economia.

Abraços

Anônimo disse...

As vezes fico chateada com essa minha cidade,mas estou sendo injusta. Sei que não estou convivendo com as melhores cabeças e nem frequentando os lugares mais interessantes, espero começar "viver" em breve. Parabéns e benvindo.

Adriano Yamaoka disse...

Maurício, parabéns por sua conquista. Espero que goste de Brasília. Falo como brasiliense nascido e criado aqui apaixonado por sua cidade.
Não sei quanto aos outros que aqui comentaram, mas, a época da seca é a melhor...cachoeira, calor de dia, frio de noite... ótimo.
Abraços

Adriano Yamaoka

Anônimo disse...

caro mauricio. o tempo passou. creio que hoje vc ja é um apaixonado por brasilia. emocionei-me com a narraçao de sua primeira impressao de bsb. comigo tambem foi assim - amor à primeira vista e amor para sempre.