sexta-feira, 23 de abril de 2010

Os BRICs e o Câmbio Chinês



Dias atrás os BRICs fizeram sua segunda reunião de cúpula, em Brasília. O bom desempenho dos países do grupo (com exceção da Rússia) em meio à crise econômica global os tornaram estrelas em rápida ascensão também na política internacional. Contudo, muitos analistas mantém-se céticos quanto à capacidade de constituírem uma aliança coerente, devido à diversidade dos perfis comerciais, dos regimes de governo e do longo histórico de rivalidades entre os membros asiáticos da sigla. Os debates sobre o câmbio chinês são um teste importante para a possibilidade dos BRICs se tornarem uma coalizão coesa. Tema, aliás, de excelente artigo publicado nesta semana na Economist.

A China tem mantido sua moeda subvalorizada em relação ao dólar, o que a deixa ainda mais competitiva no comércio internacional. O lado ruim, para o governo chinês, é que isso cria pressões inflacionárias, que até aqui tem sido mantidas razoavelmente sob controle. O problema pode ficar mais sério: a inflação de grande porte ao fim do período nacionalista (décadas de 1910-1940) é um trauma nacional, e o surto de menor escala ocorrido nos anos 80 contribuiu bastante para a eclosão dos protestos da Praça da Paz Celestial.



Os Estados Unidos têm pressionado a China para que mudem sua taxa de câmbio e diminuam um pouco a pressão sobre os mercados americanos. Os chineses têm se recusado de maneira resoluta. O Brasil tem uma moeda sobrevalorizada com relação ao dólar, e portanto ainda mais no que diz respeito ao yuan chinês. Resultado: a política cambial de Pequim prejudica bastante o comércio exterior brasileiro com a China, principal destino das exportações do país. A novidade é que agora Brasil e Índia se uniram para solicitar ao governo chinês que valorize sua moeda. Será que os pedidos dos amigos em Brasília e Nova Délhi serão ouvidos com mais simpatia do que as demandas de Washington?




À primeira vista, a resposta seria "não", dada a rigidez com a qual a China defende seus interesses econômicos. Mas Pequim tem buscado, de modo muito consistente, apresentar uma face suave para os parceiros no mundo em desenvolvimento, participando de todas as principais coalizões desses países (acima). Não é impossível que as concessões pudessem abarcar também aspectos econômicos significativos, em especial pela mensagem que passaria à comunidade internacional: a de que os BRICs virariam interlocutores essenciais para as grandes questões globais, inclusive as que lidam com assuntos duros, como economia.

Ainda sobre os BRICs: não deixem de ler o perfil de Jim O´Neill, o executivo do banco de investimentos Goldman Sachs que criou a sigla num estudo sobre perspectivas da economia internacional. O texto foi publicado pelo Financial Times e é uma jóia do jornalismo de política e de negócios.

4 comentários:

Edu disse...

Mauricio, vi algo sobre a possibilidade das trocas comerciais BR e China passarem a sr feitas em moedas locais. Como ficaria esse cenário? E, mais importante, como ficaria os BRICs num cenário em que o comércio entre os mesmos fosse feito inteiramente em moedas locais?

Maurício Santoro disse...

Edu, sou um tanto cético com isso. Já existe um mecanismo assim para o comércio Argentina-Brasil e é pouco usado, porque os custos com a burocracia não compensam muito os ganhos em não precisar de dólares.

No mais, como a moeda chinesa é muito subvalorizada diante das dos demais parceiros comerciais, inclusive dos BRICs, não faria muita diferença. O essencial é que Pequim mexa no câmbio.

Abraços

Patricio Iglesias disse...

Meu caro:
Tinha ouvido do acordo Argentina-Brasil, mas não savia que tinha custos administrativos altos. Qué extranho... em nossos paises... He, he!
E uma correção: "A novidade é que agora Brasil e Índia se uniram para solicitar ao governo chinês que DESVALORIZE sua moeda". Suponho que pensava em revalorizar.
Abraços!

Patricio Iglesias

Maurício Santoro disse...

Dom Patricio,

Pois é, os custos são altos, entre outras razões porque as empresas e seguradoras de comércio exterior não estão acostumadas a lidar com pesos e reais.

Obrigado pela correção, você está certo. Vou alterar o texto.

abraços