sexta-feira, 4 de junho de 2010
De Ataturk a Erdogan
A aproximação entre Brasil e Turquia tem me inspirado a ler sobre a política e história contemporânea do país, em especial os últimos 20 anos. Estou impressionado com o alto nível de formulação diplomática turca, como se pode ver no artigo assinado pelo primeiro-ministro Recep Erdogan.
O Império Otomano foi um dos principais poderes globais entre os séculos XV e XVII, entrando depois num prolongado declínio. Ele foi destruído na I Guerra Mundial, perdendo seus domínios árabes e sendo ocupado militarmente pelas potências ocidentais. Mustafá Kemal, (foto) o mais competente de seus generais, liderou uma revolta contra a invasão e tomou o poder. Depôs o sultão, aboliu o califado islâmico e proclamou uma república secular, centrada no povo turco.
O general passou a ser conhecido como Kemal Ataturk (“pai dos turcos”) e as Forças Armadas se tornaram as guardiãs do caráter laico do Estado. Em diversos momentos intervieram na política, promovendo golpes militares para afastar governantes que o Exército julgava estarem se inclinando demais para o islamismo. A Turquia é membro fundador da OTAN e foi aliada constante dos EUA e da Europa na Guerra Fria.
O mundo pós-11 de setembro abalou várias destas certezas. A opinião pública turca tem se mostrado cada vez mais dividida diante das duas linhas mestras da política nacional – Estado laico e aliança com o Ocidente. O parlamento turco negou aos Estados Unidos o direito de usar seu território para atacar o Iraque. O partido Justiça e Desenvolvimento (AK), fundado em 2001, governou a Turquia nos últimos 10 anos, com agenda de reformas econômicas que renderam crescimento acelerado mesmo diante da crise européia. Mas o AK é considerado por muitos de seus adversários como uma sigla “islâmica”, ameaça ao secularismo turco. Erdogan (foto abaixo) ficou preso durante meses por conta dessa acusação, mesmo depois de ter exercido cargos-chave, como prefeito de Istambul.
No poder, o AK contra-atacou com uma série de processos contra o grupo Ergenekon, que reúne principalmente oficiais de alta patente do Exército, acusando-os de tramar um golpe de Estado e planejar atentados terroristas, como assassinar o escritor Ohran Pamuk, Nobel de Literatura e crítico do militarismo turco. Os acusados afirmam ser inocentes e dizem que o AK tem forjado provas, utilizado escutas clandestinas e outros métodos ilegais. O mais conhecido economista turco, Dani Rodrik, professor em Harvard, é um dos que condenam o AK – seu sogro, um general, foi preso sob acusação de conspiração.
Para além das disputas pelo poder, uma das novidades mais interessantes da política turca é o movimento Fetullah Gulen, uma rede de ativistas sociais organizada em torno de um escritor e líder religioso moderado. Gulen vive há mais de uma década nos Estados Unidos, temendo ser atacado na Turquia, e tem coordenado iniciativas de destaque como a Plataforma Abant, um fórum internacional pelo aprofundamento da democratização turca, mudanças nas relações com a minoria curda e diálogo entre culturas.
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