segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

O Julgamento de Fujimori


Começa nesta segunda no Peru o julgamento do ex-presidente Alberto Fujimori por violações de direitos humanos durante os 10 anos em que governou o país. O processo é longo e pode durar até um ano, concentrando-se nas ações dos esquadrões da morte e em casos emblemáticos do terrorismo de Estado peruano, como os massacres de Barrios Altos e da Universidade La Canuta. O ex-presidente também é acusado do seqüestro de opositores, como o jornalista Gustavo Gorriti.

Fujimori tem longa e pouco edificante história. Foi eleito presidente em 1990 e deu um autogolpe em 1992. Ficou no poder até 2000, depois fugiu para o Japão e o Chile, cuja justiça o extraditou ao Peru em setembro deste ano. Apesar de sua ficha criminal, ainda é considerado um herói por muitos peruanos, por derrotar o grupo terrorista Sendero Luminoso e debelar a alta inflação do país. Ironicamente, Fujimori mantém popularidade mais alta do que a do atual presidente, Alan García. E como boa parte da elite política peruana apoiou a ditadura, seu julgamento será ameaçador para muita gente no país.

O Sendero Luminoso começou suas atividades no início dos anos 1980, quando o Peru vivia seu primeiro governo democrático após 12 anos de ditadura militar. O grupo assassinou milhares de pessoas e a repressão governamental foi igualmente brutal, torturando e matando muitos inocentes. As estimativas são de 70 mil mortos, a maoria camponeses de origem indígena da região andina, sobretudo de Ayacucho. A violência destruiu uma geração de líderes potenciais no país e criou cenário de pavor que abriu caminho para o autoritarismo de Fujimori. Durante seu decênio no poder, o Exército recebeu carta branca para combater o Sendero e o Tupac Amaru e como sempre acontece nessas ocasiões o abuso de poder tornou-se regra. Muitos militares, em particular dos serviços de inteligência se envolveram no crime organizado, com tráfico de drogas e contrabando. O homem que simboliza essa época é Vladmir Montesinos (foto), ex-oficial do Exército que se tornou o braço direito de Fujimori para a guerra suja e os negócios escusos.



Muita coisa mudou para melhor no Peru. O país teve uma Comissão da Verdade e Reconciliação que realizou trabalho primoroso em reconstituir as principais violações dos direitos humanos no período. E mais: as milhares de entrevistas que conduziu são um acervo impressionante sobre a história oral das pessoas mais pobres, aquelas que raramente são ouvidas pela História Oficial. Os acadêmicos já começaram a descobrir a riqueza do material e há planos de disponibilizá-lo num grande museu.

Como outros países da América do Sul, o Peru se beneficiou da alta demanda internacional por seus produtos de exportação, em particular minérios. Há boa base econômica para o presidente Alan García executar suas políticas. O IUPERJ publicou recentemente ótima análise da situação peruana, escrita por Ademar Seabra, diplomata que chefiou o setor político da embaixada do Brasil em Lima.

5 comentários:

Wanderley Garcia disse...

posso estar enganado, mas não me lembro de ter visto a imprensa brazuca bater no fujimori como agora bate no chavéz. Por que será?

Maurício Santoro disse...

Você não está enganado, Wanderley. A reposta é simples: a agenda de reformas econômicas e combate ao Sendero implementadas por Fujimori fizeram com que todos se calassem diante de seu regime autoritário.

Repare que a boa vontade com Fujimori permaneceu mesmo após a guerra que Peru e Equaor travaram em meados dos anos 90. Que eu me lembre não houve nenhuma capa de revista semanal falando da "ameaça Fujimori" ou da corrida armamentista que ele impulsionava.

Diante de tamanha diferença de critérios, é complicado levar a sério a suposta preocupação por democracia que move tanta gente no Brasil, quando o assunto é Venezuela. Até o Partido do DOI-CODI agora é democrata inclusive no nome...

Abraços

SAM disse...

O Fujimori era, aliás, visto como um símbolo de imigrante que pode chegar à liderança de uma nação, em todo o mundo!

Nenhum de nós esteve no seu lugar para saber o que faríamos de melhor ou pior, mas o seu julgamento não deve ser travado por isso: a verdade deve ser conhecida e todas as violações de Direitos Humanos sancionadas por ele devem ser pagas!

Obrigado por nos trazer esta notícia, neste dia.

Maurício Santoro disse...

É verdade, Sam. Inclusive o Fujimori manteve ótima imagem no Japão e chegou até a cogitar concorrer ao senado de lá.

SAM disse...

Conforme indico aqui (http://fenixadeternum.blogspot.com/2007/07/amrica-latina-mundo-latino.html), ele não cogitou, avançou mesmo!

Só que, apesar dos muitos votos que obteve, não teve o suficiente para ter um assento parlamentar.