terça-feira, 18 de março de 2008
Cinco Anos de Guerra no Iraque
Nesta semana a guerra no Iraque completou cinco anos (já é mais longa do que a Primeira Guerra Mundial) e os principais jornais e revistas dos Estados Unidos deram destaque à data, com reportagens detalhadas sobre o assunto. A mais completa foi a da Newsweek que avalia entusiasmada a nova estratégia de contra-insurgência colocada em prática pelo general David Petraeus.
Petraeus assumiu o controle das tropas americanas e de seus aliados no Iraque em 2007 e tem conseguido resultados expressivos, ainda que controversos. Ele basicamente tem encorajado seus oficiais a trabalharam em parceria com as comunidades locais, passando bastante tempo com líderes de vizinhança e até mesmo negociando com antigos inimigos. A revista tem um excelente perfil de um capitão americano que liderou esforços assim no Iraque e no Afeganistão, chegando a subornar líderes insurgentes para tornarem-se aliados dos americanos. Naturalmente, a prática revolta muitos militares, que se indignam ao ver inimigos que mataram alguns de seus colegas agora trabalhando por salários pagos pelos Estados Unidos.
A Newsweek fala na “geração de Petraeus”, jovens oficiais veteranos do Iraque e do Afeganistão com mentalidade mais autônoma e independente, versados em contra-insurgência e com capacidade de lidar com assuntos políticos, negociações com líderes religiosos, etc. Esses capitães e majores teriam aprendido, “com freqüencia por contra própria, como operar com independência sem precedentes nas complexidades das culturas muçulmanas. Diante de governos centrais ineficientes, atuaram como prefeitos, mediadores, policiais, engenheiros civis, geralmente em ambientes devastados.”
Tenho minhas ressalvas com a apreciação elogiosa da revista. Petraeus tem, de fato, currículo brilhante: o general serviu nos EUA, Itália, Bélgica (OTAN), Bósnia, Haiti, Kuwait e Iraque, e ainda conseguiu tempo para cursar o doutorado em relações internacionais. Contudo, suas ambições políticas são bem conhecidas e especula-se que ele possa concorrer à presidência pelo Partido Republicano. A maneira com a Newsweek lhe dá crédito por uma série de iniciativas que foram criadas por muitas pessoas dentro do Exército reforça minha desconfiança de que estamos diante de uma campanha em construção. O governo Bush o tem favorecido nas lutas burocráticas, como a que levou à renúncia do almirante William Fallon, que encabeçava o Comando Central das Forças Armadas (responsável pelo Oriente Médio e Ásia Central) e queria mais tropas para o Afeganistão, que afirmava ser principal front da “guerra contra o terror”.
Na New York Review of Books, excelente artigo de Michael Massing trata do perfil dos recrutas do Exército, a partir dos relatos de veteranos do Afeganistão e do Iraque. Sua principal conclusão: “esses soldados se alistaram para escapar de empregos sem futuro, relacionamentos fracassados, famílias desestruturadas, contas, dores de dente e tédio. As Forças Armadas ofereceram um refúgio das lutas e tensões da América moderna, um lugar para ganhar segurança e habilidades profissionais, disciplina e auto-estima”.
Apesar dos atrativos, Massing informa que o Exército chegou a enfrentar um déficit de quase 7 mil recrutas em 2005, mas que conseguiu resolver o problema aumentando o número de recrutadores e os bônus pagos aos novos soldados. Contrariamente ao que pensava, o percentual de negros caiu muito – despencou de 23,5% (2000) para 13% (2006), devido à impopularidade da guerra entre esse grupo da população americana.
Os dados dizem respeito apenas aos soldados – os oficiais do Exército continuam a ser, majoritamente de classe média. Suas expectativas e frustrações foram tema de meu post anterior, vale acrescentar apenas o artigo de um jovem capitão no Washington Post, no qual explica porque está deixando as Forças Armadas, apesar de adorar a carreira militar: “Primeiro, estou prestes a me casar, e quero uma família. Segundo, posso ganhar um salário no mundo civil tão alto ou maior do que no Exército. E finalmente, minha experiência com a guerra me deixou irritado, frustrado e sem rumo.”
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4 comentários:
De acordo com o Iraq Body Count, fonte nem um pouco oficial e não sei dizer quão segura é, essa guerra já levou entre 82.240 e 89.751 mortes. Mais de 25 vezes o número de mortes do WTC.
Vergonhoso.
Salve, Leandro.
Os mortos iraquianos ninguém sabe ao certo quanto são. O Lancet, uma revista acadêmica de medicina, chegou a estimá-los em 600 mil. Depois a imprensa trabalhou com um número bem menor, em torno de 200 mil.
Mas as baixas americanas foram modestas, creio que em torno de 4 mil. Poucas para tanto tempo de guerra, em dois países.
Abraços
E acredito que eles, os americanos, devem se vangloriar disto. "Limpamos em 200 mil e só perdemos 4 mil."
Grande abraços.
Mais ou menos... 4 mil mortes representam as piores baixas americanas desde o Vietnã. Na Guerra do Golfo eles perderam pouco mais de 100 homens e nos conflitos dos Bálcãs e da África, só algumas dezenas.
As decisões políticas dos EUA podem ser desastrosas, mas os militares de lá não são loucos, nem assassinos, nem cruéis. Eles sabem que o tipo de conflito do Iraque e do Afeganistão só pode ser vencido conquistando apoio da população e há uma consciência clara em evitar o tipo de massacre que aconteceu no início da guerra do Iraque, como a tomada de Falluja.
O ponto é que talvez isso seja impossível, não dá para invadir um país, distribuir um pouco de aspirina e chocolate e achar que tudo estará resolvido. Ao mesmo tempo, se os americanos saírem do Iraque, provavelmente os xiitas e sunitas vão cair se matando, isso para não mencionar os curdos.
Mundo complicado, muito complicado...
Abraços
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