quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Caminhos Diplomáticos na América do Sul


Nestes últimos dias dei uma maratona de aulas no MBA de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas. O tema foram as estratégias de política externa na América do Sul, que estruturei como a exposição e o debate sobre a diplomacia da Argentina, Chile, Colômbia e Venezuela. Embora o Brasil não fosse, explicitamente, o objeto da discussão, é claro que as posturas do país ficaram muito em foco.

Comecei a maratona comentando com os alunos sobre a temporada que passei em Buenos Aires e os debates acadêmicos dos quais participei a respeito da existência ou não de uma teoria latino-americana de RI, uma maneira própria ao continente de examinar os temas internacionais. Mencionei as conclusões principais, de que não há uma só corrente, mas várias, e que elas de fato apontam para perspectivas peculiares à região, sobretudo pela ênfase que dão ao desenvolvimento econômico e à integração regional.

De fato, foram as abordagens que predominaram nas aulas. A busca da Argentina por saber qual o lugar do país na nova ordem internacional, em que já não é mais a nação mais próspera da região, mas tampouco quer ser o Canadá do Brasil. As experiências do Chile que o conformam como um verdadeiro “laboratório do desenvolvimento” e seus esforços em reassumir papéis de destaque na América Latina – a secretaria-geral da OEA, o comando político da missão de paz no Haiti.



No caso da Colômbia, ressaltei o desenrolar do conflito armado no país, da década de 1940 à libertação de Ingrid Betancourt. O interesse dos alunos se concentrou nas implicações regionais das ações das FARCs, como a crise que envolveu Equador e Venezuela, e uma discussão sobre os significados das posições do Brasil. Opinei que a política externa brasileira tem sido omissa quanto à tragédia humanitária no país vizinho, e que esse vazio abriu caminho para a ação de atores de fora da região, como o presidente francês Nicholas Sarkozy.

Com relação à Venezuela, como não poderia deixar de ser, o foco dos debates foi a ascensão de Hugo Chávez e suas ações sempre controvertidas, ainda que eu tenha ressaltado a semelhança com o ideário terceiro-mundista dos governos dos anos 1970. Causou sensação um slide que exibi com fotos do programa de TV “Alô, Presidente”, mistura de Voz do Brasil com Hebe, que o mandatário venezuelano apresenta semanalmente. No dia 24 de agosto ele se dedicou a traçar novos limites marítimos entre seu país e a Colômbia. Como diz meu irmão, tenho a especialização profissional menos tediosa do planeta.



As aulas abordaram bastante a política doméstica de cada país, algo que considero fundamental para compreender as relações internacionais da região, mas que nem sempre é a tônica dos programas acadêmicos, ainda muito baseados em modelos abstratos que pouco lidam com a história local. E faz falta esse tipo de conhecimento aos alunos. O noticiário da imprensa é muito parco, quando não panfletário, e a falta de familiaridade com a realidade dos vizinhos, sério entrave a ser superado.

Naturalmente, sou pago para ajudar a resolver o problema e fiquei satisfeito pelo alto interesse dos alunos e pela qualidade das perguntas. Ao longo da maratona discutimos temas tão diversos quanto as rivalidades de poder dentro do peronismo, a ascensão do movimento estudantil chileno, as perspectivas (ou antes a falta delas) para que as FARCs se tornem um partido político, as guerras platinas travadas pelo Brasil no século XIX e o colapso do sistema político venezuelano após a rebelião do Caracazo, que abriu caminho para a Chávez. Uma história de altos e baixos, alegre ou triste, esperançosa ou dramática. Mas sempre a nossa história.

2 comentários:

Anônimo disse...

Maurício que blog maravilhoso, farei visitas constantes. Fui agraciada com muitas informações aqui expostas, tudo muito didático.

Um grande beijo

Bia

Maurício Santoro disse...

Obrigado, Beatriz, seja bem-vinda.

Abraços