sexta-feira, 22 de maio de 2009

John Lennon


John Lennon: a vida”, é uma ótima biografia escrita pelo jornalista inglês Philip Norman, autor também de uma história dos Beatles. Conhecedor profundo da música das décadas de 1960/70, sua pesquisa dá voz a muitas pessoas que conviveram com Lennon, em particular sua família. O ponto forte do livro é mostrar como o cantor e compositor estava em sintonia com as mudanças que aconteciam no mundo - a liberação da sexualidade, as posturas mais relaxadas com relação às classes sociais, a ascensão da juventude como protagonista social e política. O fraco, a tomada de partido de Norman com relação a Yoko Ono, que recebe uma apologia mais adequada a um advogado de defesa do que a um biógrafo.

Norman é cronista atento e sensível da adolescência dos Beatles em Liverpool – incrível pensar que os quatro rapazes cresceram a poucos quarteirões uns dos outros, no que era então uma cidade ainda marcada pela guerra (Lennon nasceu na noite de um intenso bombardeio nazista) e pelo austero cotidiano britânico após o conflito. Ao contrário do que o próprio Lennon apregoava, sua condição não era a de operário, sua família era da baixa classe média, ansiosa por status e respeitabilidade, mas de modo algum em dificuldades financeiras.

Seus pais tiveram um casamento turbulento, e as constantes brigas e infidelidades culminaram no menino sendo abandonado por ambos, e criado por uma tia materna, uma mulher que lhe deu segurança e apoio, mas não calor afetivo. No fim da adolescência, John se aproximou da mãe, mas ela morreu atropelada quando o rapaz tinha apenas 17 anos. O pai sumiu de sua vida na infância e só reapareceu quando o filho se tornou um astro do rock.

Lennon cresceu rebelde, desconfiado, irônico, às vezes mascarando a timidez numa camada de agressividade e sarcasmo. Mas também inteligente, sensível e com grande capacidade criativa – na música, literatura, desenho e pintura, o que o levou até a cursar a faculdade de artes. Ponto curioso: mesmo antes da parceria com McCartney, John precisava ter sempre um cúmplice à mão, alguém que compensasse suas inseguranças e lhe estimulasse a criar. Nos anos universitários, a pessoa foi seu colega de turma Stuart Sutcliffe, que chegou a tocar brevemente com os Beatles, mas morreu muito jovem – talvez em decorrência de uma surra que levou de Lennon, durante uma bebedeira.



A trajetória dos Beatles é bastante conhecida, e está toda no livro. Os primeiros shows no circuito alternativo de Liverpool, a temporada passada na zona de Hamburgo (bem mais selvagens do que no visual arrumadinho com que estouraram na mídia) e o crucial encontro com Brian Epstein, que transformou o grupo numa equipe profissional e os catapultou para o mundo. Mais do que empresário, foi amigo e pai substituto que os protegeu de muitos percalços da fama meteórica. Sua morte precoce em 1967 os lançou em tantos problemas que chego a pensar que se tivesse permanecido vivo, a história poderia ser outra. Claro, havia também George Martin e seu talento como produtor musical.

Há boas informações na biografia sobre a gênese das canções, e emociona ler como cenas e personagens cotidianos de Liverpool renderam pérolas como Penny Lane, In My Life, Strawberry Fields Forever, Eleanor Rigby. Curiosamente, a música mais executada dos Beatles (e de todos os tempos), Yesterday, é de autoria somente de McCartney, embora Lennon também a tenha assinado.

A vida pós-Beatles de Lennon é marcada por seu relacionamento com Yoko Ono, e não gostei do modo como Norman a retratou na biografia. Por ironia, ela desaprovou o livro. Em todo caso, mesmo discordando da interpretação que Norman dá ao relacionamento do casal, é possível fazer outras leituras, em que se destaca à descida de Lennon a um inferno pessoal marcado por drogas, mas o período de crises também resultou no enfrentamento de seus demônios e em canções magistrais que passam a limpo a complicada história com a família e com os Beatles, como “God”, “Mother” e “How?”.

A estupidez de seu assassinato é ainda mais ressaltada por ter ocorrido na época em que parecia, finalmente, ter encontrado a paz, curtindo cuidar do segundo filho, Sean. Felizmente, ele continua a inspirar.

5 comentários:

carlos disse...

caro santoro,

adorei o post, camarada.

sou beatlemaníaco desde a adolescência nos anos 60. sou avô da letícia, e meu filho gabriel de vinte anos, pai da garota de 10 meses, é cúmplice de minha trilha sonora.

seu post me lembrou a porrada sonora que senti quando ouvi pela primeira vez o lp revolver nos idos de 66.

hoje, com certeza, em casa, após a labuta diária, homenagearei os beatles, como também zé rodrix da belíssima casa de campo que encantou-se, infelizmente, ontem.

abçs

ps: aqui, em fortaleza, as bandas covers rubber soul e beatles forever botam pra quebrar nos barzinhos da cidade. uma beleza. já tocaram até em liverpool. acredita?

Maurício Santoro disse...

Acredito sim, meu caro. Até nos Andes eu já ouvi bandas tocando Beatles, com os instrumentos locais. Lindo.

A primeira vez que os escutei foi no início da adolescência, e nunca mais parei desde então. Só mudam as minhas canções favoritas.

Abraços

Patricio Iglesias disse...

Meu caro:
Li na sexta, mas näo cheguei comentar porque tinha tido um "hard work "day"" e foi mais forte a tentaçäo de aproveitar melhor a "night" pra "sleeping like a log". Ha, ha, ha!
Sinceiramente näo poderia especificar como você e o Carlos minha "primeira vez" com os Beatles. É täo comum ouvir sua música na TV...
Saludos!

Vinícius Reis disse...

Política externa, relações internacionais, América Latina, John Lennon, etc... Cada vez que acesso o seu blog aprendo um pouco mais sobre o mundo. Valeu!
Vinícius Reis (leitor de sempre)

Maurício Santoro disse...

Salve, dom Patricio.

Feliz então você, que desde sempre conheceu os Beatles!

Puxa, obrigado, Vinicius. Devo escrever mais sobre música esta semana.

Abraços