sexta-feira, 12 de junho de 2009
O Groucho-Marxismo de Cuba na OEA
Na semana passada os países da América Latina comandaram votação na Organização dos Estados que autoriza o retorno de Cuba à instituição. O país estava suspenso desde 1962, quando seu governo se declarou marxista. No, entanto, Havana recusou a oferta, afirmando que a OEA é um “ministério das colônias ianques”. Para ficarmos com a ideologia dos Marx, de Karl para Groucho: aquele que não entrava para clubes que o aceitavam como sócio.
Meu palpite é que as razões da recusa cubana estão no medo do regime de que seus dissidentes usem contra o governo os instrumentos da OEA, como a Carta Democrática e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (que permite aos cidadãos apresentarem petições contra suas autoridades nacionais). No contexto atual, voltar à OEA provocaria riscos para a estabilidade política do país, num momento delicado em que por conta da crise voltam restrições econômicas, como racionamento de energia elétrica.
A OEA foi criada no início da Guerra Fria, na mesma lógica que levou os Estados Unidos a lançarem alianças regionais semelhantes na Europa, Ásia e Oriente Médio (OTAN, Seato, Pacto de Bagdá etc). Embora a retórica afirmasse a primazia da democracia, muitas vezes a organização apoiou ditaduras e golpes de Estado, e sempre se mostrou uma dócil ferramenta da política externa americana.
Isso começou a mudar na década de 1980, quando o diplomata brasileiro João Clemente Baena Soares foi secretário-geral da OEA e encontrou um importante nicho de atuação nas negociações de paz na América Central, então dividida entre ditaduras militares e guerrilhas de esquerda. Mais recentemente, a eleição do político chileno José Miguel Insulza tornou a OEA um fórum crítico às políticas dos Estados Unidos na região, em particular nos conflitos andinos, como as crises entre Colômbia e Venezuela.
O moral da História talvez seja o de que a participação na instituição ajuda a causa da democracia, e o isolamento, contribui para a permanência de regimes autoritários. Nesta perspectiva, vale a leitura do artigo que o embaixador Rubens Ricupero publicou no último domingo, no qual relembra a proposta do chanceler brasileiro, San Tiago Dantas, de uma solução alternativa para a crise que culminou com a suspensão de Cuba da OEA. San Tiago:
... percebeu que o isolamento e as sanções contra Castro apresentavam o mais grave defeito de qualquer política, a de ser contraproducente, tornando inevitável o que desejava evitar: a consolidação da influência soviética. (...) San Tiago não desistiu e continuou a insistir na sua proposta de “finlandização” de Cuba, isto é, um acordo pelo qual os americanos aceitariam a opção marxista de Havana em troca da neutralização da ilha nas questões políticas e estratégicas da Guerra Fria. Da mesma forma que ocorrera com a Finlândia em relação à URSS de Stalin após a guerra.
Nos livros de auxiliares de Kennedy, menciona-se o interesse que a proposta despertou. A fórmula de San Tiago teria poupado ao mundo a crise dos mísseis de outubro de 1962, o mais perto que se chegou do aniquilamento nuclear durante a Guerra Fria. Pena que a ideia fosse racional demais para o estágio de amadurecimento de americanos e cubanos.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
4 comentários:
Meu Caro:
Sempre aprendendo algo novo. "Finlandizaçäo". Pesquisei na Wikipedia, näo tinha nem idéia do tema.
Em minha opinäo, você situa o origem dà OEA no contexto dos tempos de postguerra. É sem dúvidas acertado, mas é importante näo esquecer que desde o século XIX houve antecedentes de intentos de conformaçäo dum conglomerado regional, coisa praticamente inédita na história mundial.
Saludos!
Salve, Patricio.
É, no caso da América Latina, a tentativa de criar uma organização regional é contemporânea à criação dos Estados nacionais, visto que Bolívar tentou organizar um sistema de congressos continentais.
Foi pena que esse formato não prosperou, e que quando a OEA foi criada, o resultado se deu de maneira bem mais próxima aos medos da Guerra Fria.
Abraços
Prezado Mauricio,
Sempre se fala em organizações regionais, mas como é possível integrar um país como o Brasil que não tem projeto de nação, acho que talvez o mesmo ocorra em alguns países vizinhos, por isso a integração com o Brasil sempre é complicada, por que os parceiros acreditam que temos uma direção, mas na verdade temos uma burocracia profissional (sentido do Max Weber e não pejorativo) que consegue via Itamaraty e Comercio Exterior fazer alguns acertos. Mas, parte da opinião política sempre vê com reservas principalmente países que tem um projeto.
Abs
Por sinal saiu isso hoje,
http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090614/not_imp386951,0.php
Olá, Marcelo.
No que diz respeito à burocracia de comércio exterior, obrigado pelo cumprimento. Mas, de fato, a integração regional é no Brasil (e creio que em grande medida nos países do continente) um projeto que nasceu no âmbito do Estado, e não na sociedade. Embora ele talvez esteja se expandindo, aos poucos.
Não consegui abrir o link que você enviou.
Abraços
Postar um comentário