quarta-feira, 19 de março de 2008

O Rei (Brasileiro) da Soja no Paraguai


O Valor desta quarta traz uma entrevista com o empresário brasileiro Tranquilo Favero (o link vai para o blog do Hermenauta, que disponibilizou a reportagem) o maior plantador de soja do Paraguai, país que nesse mercado só fica atrás de EUA, Brasil e Argentina. Favero estima que entre 90% e 95% da produção de soja paraguaia seja controlada por brasileiros. Como essa é a principal commodity de exportação do país vizinho, pode-se imaginar o tipo de tensão política e econômica que envolve brasileiros, camponeses e o governo em Assunção.

O assunto me interessa de perto porque em 2007 visitei o Paraguai para conversar com lideranças camponesas, no âmbito da pesquisa sobre juventude sul-americana. Viajei pelo departamento (província) de Alto Paraná, na fronteira com o Brasil, cuja paisagem foi inteiramente transformada pela soja. A região é de colonização recente - a maioria da população se estabeleceu por lá a partir da década de 1970, com o início da construção da usina de Itaipu e graças aos incentivos agrícolas da ditadura Stroessner.

O Paraguai possui cerca de 40% de sua população na zona rural, índice alto para o padrão cada vez mais urbanizado da América Latina. O avanço da soja sobre as áreas tradicionais camponesas tem tido um impacto social profundo. A valorização da terra leva a muitos pequenos agricultores a venderem suas propriedades para as empresas sojeiras. O dinheiro que recebem com freqüência é dissipado em tentativas mal-sucedidas de montar negócios nas cidades, pois não possuem a instrução e a experiência necessárias. Terminam em biscates, serviços temporários e precários. Mas o mundo urbano fascina e atrai, em especial os jovens.

Além dos atrativos econômicos para deixar o campo, pesam os problemas trazidos pela soja. O uso intensivo de agrotóxicos polui os mananciais de água, estive em vilarejos onde muitas pessoas adoecem por causa da contaminação oriunda das grandes plantações vizinhas. Também ouvi relatos de violências e intimidação praticadas pelas empresas produtoras de soja, inclusive as brasileiras.

É esse o contexto que explica a ascensão da candidatura à presidência do ex-bispo jesuíta Fernando Lugo, que montou uma coalizão de partidos e movimentos que opõem aos colorados, há 70 anos no poder. Lugo tem um discurso duro contra os interesses econômicos do Brasil, tanto pela questão da soja quanto pelo preço da energia de Itaipu. Favero afirma que ele vencerá, e que acredita na moderação do ex-bispo, devido a seus aliados políticos liberais. O governo brasileiro preferiu apoiar o general golpista Lino Oviedo.

Não é impossível buscar acordos entre a expansão do agronegócio e o bem-estar dos camponeses paraguaios, bastaria criar um fundo de desenvolvimento para projetos sociais que beneficiem essa população - com recursos vindos da taxação das exportações de soja. Não é o que tem ocorrido e como tantas vezes ocorre nos debates oficiais sobre Mercosul, os pobres ficam de fora da festa da integração regional.

Evidentemente, pesa também a notável sensibilidade cultural dos nossos compatriotas no Paraguai, como ilustrado pela declaração de Favero: “Sou criticado publicamente por não falar guarani, mesmo estando aqui há 40 anos. Falo para os meus netos: aprendam língua de povo desenvolvido.“ Bela frase para dizer num país onde praticamente todos os vassalos falam o idioma desprezado pelo rei da soja. Não sei se é consolo para os paraguaios, mas os sentimentos da elite brasileira com relação a seus subalternos sociais e nacionais não é tão diferente, ainda que falem a mesma língua.

3 comentários:

Patricio Iglesias disse...

Caro Maurício:
Lamento muito a situaçäo dos camponeses paraguaios e a contaminaçäo das mananciais. Aqui näo säo bem tratados e säo até discriminados.
A propósito, extranhei algum artigo suo sob o 32º aniversário do golpe de Estado na Argentina no 24 de marzo.
Saludos!

Patricio Iglesias

Maurício Santoro disse...

Caro,

pois é, virou um problema bastante sério para o Brasil, e que se agrava à medida em que a soja brasileira chega à Bolívia e à Colômbia.

Te confesso ter esquecido inteiramente do aniversário do golpe na Argentina, mas acompanho com interesse a primeira crise política enfrentada por Cristina Fernández. Talvez escreva sobre o tema em breve.

Abraços

ii disse...

a mauricio
eu conheso como poucos a situacão dese tema, favero, disputas por terras, soja, e tudo mais.
porem discordo de que mananciais, e coregos estejan contaminados,com agrotoxicos.
conheço bem como são feitos os trabalhos no campo os cuidados tomados com esses tipos de produtos por isso poso afirmar que não ah ou a muito pouco coregos contaminados.
não ah estudos que comprovam contaminaçoes por isso não poderia ter afirmado a contaminação.
em defesa dos produtores. sempre e estamos tomando todos os cuidados nescesarios para evitar acidentes com defencivos agricolas...
não se pode comparar rio tiete ou coregos de cidades brasileiras que eses sim estão de fato contaminados mas os nosos riachos estão sem contaminação....
add yuri grabowski