quarta-feira, 24 de junho de 2009

Os Colegas de Fidel



A Revolução Cubana tem sido uma fonte inesgotável de inspiração para escritores, e por difícil que seja pensar em uma abordagem original para o tema, ainda há possibilidades, como “Os Meninos do Dolores: os colegas de classe de Fidel, da Revolução ao exílio”, do jornalista americano Patrick Symmes.

Symmes partiu de uma velha foto em preto e branco que mostra duas centenas de adolescentes no pátio do colégio jesuíta de Dolores, em Santiago de Cuba, a escola mais tradicional da ilha, ao lado de sua instituição irmã em Havana. Por suas salas de aula passaram os herdeiros das grandes fortunas, como os Bacardi, filhos de profissionais de classe média em ascensão e os irmãos Castro - rebentos de um ex-soldado espanhol que enriqueceu como capataz das grandes empresas americanas. Desse microcosmo da elite cubana, Symmes pinta um panorama dramático e comovente das transformações da Revolução.

Quando os Castro estudaram por lá, na década de 1940, Cuba vivia sua breve primavera democrática. Os jesuítas eram, em grande medida, o que havia de mais progressista na educação da ilha, com sua ênfase no mérito, na ciência e no raciocínio crítico. Mas também eram limitados por preconceitos, como a exclusão de estudantes negros e um culto da disciplina que podia chegar à brutalidade. Fidel tivera que brigar com o pai para estudar no Dolores, que fascinava o rapaz pelo prestígio e pela qualidade das aulas. Nele se destacou como ótimo aluno, atleta entusiasmado e líder dos colegas. Inevitável que a memória tenda a ver no adolescente os sinais de sua vida posterior e vários dos entrevistados destacam o lado sombrio de Fidel, como seu autoritarismo, propensão à violência e pouca disposição ao diálogo. Me chama a atenção as inseguranças sociais que provavelmente sentiu: perto dos colegas era um caipira, sem a sofisticação de uma família culta, e deve ter tentado compensar as fragilidades pela postura macho-alpha.

As amizades que Fidel fez no Dolores entre famílias de elite foram fundamentais durante a Revolução, para estabelecer uma rede de contatos, informantes e de ajuda financeira que manteve seu movimento vivo mesmo nos piores períodos da repressão. Sua entrada triunfal em Havana foi recebida com entusiasmo pela maioria dos colegas, mas em cerca de dois anos quase todos já estavam contra o novo governo. O constante adiamento das eleições, a estatização da educação e a supressão do dissenso político o afastaram dos antigos amigos, e os mais ricos ainda tiveram terras e fábricas confiscadas. Muitos estiveram entre os primeiros a se exilar nos EUA e alguns tomaram parte das conspirações que culminaram na fracassada invasão da Baía dos Porcos – um dos pontos altos do livro é a narrativa da batalha mais acirrada do conflito, pela ótica de um rapaz que lutou com os anti-castristas.

O retrato feito por Symmes da diáspora cubana em Miami é o de um exército quixotesco que viu ruir todos os seus sonhos e planos, e vive no limbo entre a cultura americana e uma Cuba de nostalgia que não mais existe. Alguns raros ex-alunos do Dolores permaneceram na ilha, e sua situação é mais dramática: experimentam na pele as agruras da vida no “período especial”, a brutal crise econômica que se seguiu ao colapso da URSS. A foto dos meninos do Dolores pode ser só um retrato na parede – mas como dói!

2 comentários:

Pablo Markwald disse...

Caro Mauricio,

Gostaria se possível que me informasse seu email para que eu possa lhe indagar sobre algumas questões.

Um abraço,

Pablo Markwald

Maurício Santoro disse...

Com prazer, Pablo.

É mauriciosantoro1978@gmail.com

Abraços