sexta-feira, 26 de junho de 2009

Trajetórias de Desenvolvimento: Argentina e México



Nestes dias estive no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada acompanhando o seminário “Trajetórias de Desenvolvimento”, que examinou a história recente de 10 países: África do Sul, Alemanha, Argentina, China, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, Índia, México e Rússia. Não consegui assistir a todas, por conta de outros compromissos de trabalho, portanto destaco os dois estudos sobre países latino-americanos.

Na última década Argentina e México seguiram modelos de desenvolvimento opostos, e ambos enfrentam dificuldades sérias. Um lembrete de que nunca é fácil pensar soluções para esse tipo de desafio.

É bastante conhecida a trajetória da longa crise da Argentina, de como a crise de 1929 colocou em xeque a bem-sucedida inserção do país no modelo agro-exportador, abrindo a porta a uma série de conflitos políticos que, a rigor, até hoje não terminaram. A catástrofe de 1998-2002 é apenas o capítulo mais recentes (e, espero, o último) desse processo.

A partir de Duhalde, e prosseguindo com os Kirchner, a Argentina experimentou um modelo heteredoxo de desenvolvimento, com moratória da dívida externa, desvalorização cambial e a conquista de superávits gêmeos, no comércio e nas finanças. O PIB cresceu a taxas chinesas, ainda que boa parte fosse recuperação do colapso dos anos anteriores.

Os bons resultados iniciais se perderam em meio a uma série de crises recentes, como o conflito entre o governo e os produtores rurais, o crescimento da inflação (e sua negação pelas estatísticas oficiais) e medidas controversas, como a estatização de fundos de pensões e a adoção de controles e restrições sobre o comércio exterior. Más condições naturais, como uma seca prolongada, também atrapalharam e agora o antigo celeiro da América Latina se vê na iminente condição de precisar importar alimentos básicos como carne e trigo.

O México, como se sabe, iniciou na década de 1980 uma série de reformas opostas, que visavam a substituir o modelo nacionalista dos anos 1940 por um paradigma liberal de crescimento vinculado ao aumento das exportações para o mercado dos Estados Unidos e do Canadá. O símbolo máximo da estratégia foi a assinatura do NAFTA, mas igualmente importante foi o esforço para combater a inflação e benefícios tarifários para a instalação de maquliadoras, fábricas que processam matérias-primas, reúnem alguns componentes e exportam o produto final para os dois ricos mercados ao norte.



Como na Argentina, o modelo deu bons resultados nos anos iniciais, com alto crescimento do PIB. Com o tempo, seus problemas se tornaram evidentes: baixa integração das maquiladoras com o resto da economia nacional, dificuldades de competir com a China como plataforma de exportação para os Estados Unidos e o agravamento da dependência com a economia americana, o que torna difícil reagir a crises como a atual – o país precisou de ajuda emergencial do FMI. Os conflitos políticos estouraram sobretudo no sul indígena e empobrecido, em Chiapas e Oaxaca. Mas os problemas também se manifestam na crise de segurança pública. Até a gripe suína estourou por lá.

Os dois grandes países da América Latina têm muito a ensinar ao terceiro gigante da região, o Brasil. Para quem se interessou pelo tema, os artigos do seminário serão publicados em livro no mês de julho.

5 comentários:

Patricio Iglesias disse...

Meu caro:
"A catástrofe de 1998-2002 é apenas o capítulo mais recentes (e, espero, o último) desse processo."
Espero o mesmo, mas näo creio isso. As situaçöes interna e externa säo muito difíceis, e aqui temos "miniciclos de Kondratieff" de umos 10 anos. Ha, ha, ha!

"Más condições naturais, como uma seca prolongada, também atrapalharam e agora o antigo celeiro da América Latina se vê na iminente condição de precisar importar alimentos básicos como carne e trigo."

Antigo celeiro da América Latina? Éramos chamados de "el granero del mundo"! E hoje, pelo monocultivo da soja, a especulaçäo excesiva, a consolidaçäo dos grandes "pools" de sembra (e, claro, pela mala ou ainda pior, nenhuma política de longo termo pela produçäo agrária) hoje estamos pensando em importar... trigo! Inêdito desde o século XIX, quando vinha dos EUA! E o pior, o danho irreparável aos solos.

Respeito ao México, lembro ter ouvido faz umos 7 anos ou mais uma comparaçäo entre eles nos ultimos anos e a Argentina cem anos atrás: paises crecendo a custa da superpoténcia do momento.

Saludos!

Maurício Santoro disse...

É, meu caro, sei que está a grave a crise por aí... Oxalá vocês possam dar uma resposta nas eleições de domingo.

abraços

Enzo Mayer Tessarolo disse...

Olá Mauricio,

Estou procurando algumas fontes sobre as relações entre Brasil e Alemanha. Você sabe se há alguma informação disponível em algum lugar sobre a parte do seminário que tratou do desenvolvimento na Alemanha?

Obrigado,
Enzo

Ricardo Cabral disse...

Caro Mauricio, vivi no México em meados dos anos 80 e vi o início dessa política de instalação de maquliadoras. minha A impressão inicial de uma cancunização da indústria mexicana — como se sabe, Cancún é tudo menos México, ou melhor, é mais um enclave gringo fora dos EUA — foi até benevolente diante da crise que assola por lá.

P.S. Gostei muito da tua fala na mesa organizada pelo Idelber na LASA e gostaria de saber um pouco mais sobre a pesquisa com jovens de que você falou.

Abraços

Maurício Santoro disse...

Caro Enzo,

a palestra sobre a Alemanha foi feita pela Paula Pedroti, minha ex-professora na Escola Nacional de Administração Pública. Me escreva para mauriciosantoro1978@gmail.com e coloco vocês dois em contato.

Recomendo também o livro "Alemanha: visões brasileiras", organizado pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que tem artigos muito bons sobre a história do país no pós-Segunda Guerra Mundial.

Salve, Ricardo.

Muito interessante a sua vivência. Eu estava justamente lendo alguns textos do Celso Furtado sobre as "economias de enclave" na América Latina e o conceito é bem esclarecedor para o estudo das maquiladoras.

Que bom que você gostou do debate na LASA, adorei a mesa redonda.

Você pode conseguir mais informações sobre a pesquisa do IBASE, inclusive os relatórios completos, nos sites www.ibase.br e www.juventudesulamericanas.org.br

Abraços