quarta-feira, 28 de outubro de 2009
O escritor e a cidade: Balzac
As leituras sobre arquitetura e urbanismo também me (re)conduziram à literatura, para lançar outro olhar às relações entre escritores e suas cidades. Comecemos por Honoré de Balzac e esse magnifíco romance do aprendizado de Paris que é “O Pai Goriot”.
O protagonista é um jovem provinciano, Eugênio de Rastignac. Pobre e ambicioso, ele chega a Paris para estudar direito e vencer na vida – algo que não era particularmente fácil na França da Restauração Bourbon (1815-1830), com o clima político asfixiante e a escassez de oportunidades de ascensão social.
Enquanto rumina sonhos nos jantares miseráveis da pensão onde se hospeda, Rastignac oscila entre dois professores: os salões da alta sociedade, aos quais tem (precário) acesso por meio de uma prima, e os conselhos inescrupulosos de um colega pensionista, Vautrin. Trata-se de um dos mais fascinantes personagens de Balzac, um lider do crime organizado sempre em fuga e envolvido em conspirações. Ele foi inspirado por uma pessoa real, Eugene Vidocq, que chegou a ser chefe de polícia de Paris!
Entre bailes e intrigas, boudoirs e planos de duelo e de morte, Rastignac descobre que a distância de Vautrin às alcovas das condessas que frequenta é menor do que parece à primeira vista. E que descrições nos dá Balzac! Está tudo lá: os cassinos do Palais-Royal, o luxo dos palácios da aristocracia, o tédio estudantil na Sorbonne e as ruas sujas, enlameadas e turbulentas da Paris pré-Hausmann, que fazem Rastignac lamentar não ter carruagem. Mas também o prazer de vagar pela cidade – flaner, dizem os franceses – em meio a sua diversidade, colorido, caos: “Quem não frequentou a margem esquerda do Sena, entre a rua Santiago e a dos Santos Padres não conhece nada da vida humana”.
O Pai Goriot do título é um velho e rico comerciante de massas, louco pelas filhas que o desprezam. Um rei Lear do talharim. Rastignac se envolve com uma das moças, num amor que lhe abre portas sociais, mas também lhe rende lições dolorosas: “Entre o gabinete azul da Sra. De Restaud e a sala de visitas cor-de-rosa da Sra de Beauseant ele cursara três anos desse Direito Parisiense, de que não se fala, embora constitua uma elevada jurisprudência social que bem aprendida e bem praticada, consegue tudo.”
Dentre todas as cenas do romance, há uma passagem clássica na qual Rastignac sobe ao cemitério Père-Lachaise para enterrar um ente querido, e com ele suas últimas ilusões. Do alto da colina, mira os bairros elegantes de Paris: “Lançou àquela colméia sussurrante um olhar que parecia sugar-lhe antecipadamente o mel e proferiu esta frase suprema: Agora é entre nós dois”.
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