segunda-feira, 4 de outubro de 2010

As Eleições Presidenciais no Brasil



Os surpreendentes resultados do primeiro turno nas eleições presidenciais do Brasil são um recado claro para o presidente Lula e para sua candidata: a população apóia suas políticas sociais e a condução da economia, mas quer que o combate à corrupção seja levado a sério, e deseja também conhecer melhor as posições de Dilma Rousseff sobre os temas mais importantes da agenda pública. O segundo turno será uma disputa acirrada, dura, com muitos ataques pessoais e manobras questionáveis. Mas talvez seja igualmente a oportunidade para sair do pretenso consenso dos últimos meses e abrir outras possibilidades de debate sobre as opções do Brasil.

Passei a noite da eleição com a equipe da CNN no Rio de Janeiro, acompanhando os dados da apuração, discutindo os resultados com as jornalistas, entrando ao vivo com as análises do momento e gravando outras participações. Eu esperava comentar sobretudo as perspectivas do futuro governo Dilma, mas é claro que os temas principais foram o crescimento do voto oposicionista, em particular a rápida ascensão da senadora Marina Silva.

Embora Marina tenha sua trajetória política identificada com a questão ambiental, não avalio que sua expressiva votação tenha sido obtida majoritariamente por conta do maior interesse dos eleitores nos assuntos ecológicos. A meu ver, a motivação principal foi o apoio daqueles que a valorizam por sua vinculação ao presidente Lula e às causas sociais, mas sem ter tido escândalos de corrupção em sua equipe, como ocorreu com Dilma. Contou muito também seu desempenho na campanha, e sua figura pública amena e serena, no ambiente de polarização das últimas semanas.

Sua votação a consolida como uma estrela de primeira grandeza na política brasileira e, naturalmente, um apoio que será cortejado por governo e oposição neste segundo turno. Contudo, tenho dúvidas sobre como os eleitores de Marina irão se comportar. Provavelmente muitos terão perfil mais independente e não necessariamente seguirão as diretrizes da senadora ou do Partido Verde.



José Serra não fez boa campanha, mas o PSDB se saiu melhor do que muitos esperavam, em particular em São Paulo, onde Geraldo Alckmin foi reeleito governador e Aloysio Nunes Ferreira, ex-ministro de Fernando Henrique Cardoso, surpreendeu como senador mais votado. A questão para Serra é como aproveitar o presente que a “onda verde” de Marina lhe deu, e elaborar uma estratégia que lhe permita se opor a Lula e Dilma sem afastar os eleitores satisfeitos com o bom desempenho do governo – a tabela acima, retirada da última edição da Economist, mostra que não será fácil construir esse discurso. Talvez precise mudar o candidato a vice, uma vez que Índio da Costa se mostrou uma escolha problemática, frequentemente envolvendo o titular da chapa em polêmicas radicais e estéreis.

Apesar dos resultados de Dilma terem sido muito abaixo das expectativas do governo, a votação para o Congresso beneficiou a coligação oficial. PMDB e PT fizeram as maiores bancadas no Senado, melhorando muito seu desempenho com relação à última eleição (de 25 para 33 parlamentares). Na Câmara dos Deputados, o PT cresceu levemente (de 83 para 88), o PMDB diminuiu um pouco (de 89 para 79), mas o que mais impressionou foi o declínio do PSDB e do DEM, que passaram de 131 para 96 membros.

9 comentários:

Mário Machado disse...

Dizem que Serra não fez boa campanha por que estava comendo todo mundo. Ok agora sem requentar piadas infames.

O PSDB cometeu um erro grave, ele permitiu desde 2002 que o PT pautasse sua estratégia o que levou a esconder FHC.

Depois evitou bater pesado em Lula no mensalão - nunca entendi isso.

Agora precisa se quiser concorrer de fato de revisar sua estratégia, nesse caso uma supresa será como agirá o poderoso PSDB mineiro, que protagonizou uma virada humilhante. Pra cima de dois ministros de Lula e como sou testemunha de toda a máquina sindical que trabalhou pesado por Helio Costa e Ananias.

A meu ver o problema da campanha petista foi focar demais em lutas internas de poder.

De todo modo não consigo ver o PMDB como coligado é um partido em que cada cacique é uma tendência - para usar um termo caro aos petistas.

E se a coligação governista não vencer, creio que o PMDB será governo mesmo assim. Bom pelo menos assim nos ensina a história da república novíssima.

Mas, reconheço não tenho os instrumentos analíticos refinados que vc tem.

Bom trabalho com a CNN que não acompanhei.

Abs,

Carlos Renato Lima disse...

Vejo a campanha de Serra com boas possibilidades de crescimento em muitos estados. No Pará, por exemplo, onde Simão Jatene (PSDB) enfrentará no segundo turno uma Ana Julia Carepa (PT) enfraquecida e impopular. Lá Serra perdeu por 10% no primeiro turno, mas tem tudo para virar o placar. Em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro também deve crescer e até virar o placar em alguns desses locais. Longos dias até o 31/10, com certeza. Campanha surpreendente essa.

Maurício Santoro disse...

Salvem, caros.

O PSDB tem alguns problemas sérios pela frente, em particular encontrar parceiros de coalizão que complementem, ou mesmo substituam, o combalido DEM.

Outra dificuldade será construir uma base sólida fora de São Paulo. Em Minas Gerais existe a adesão à liderança individual de Aécio, mas não uma identificação partidária.

No Rio de Janeiro, está bastante complicada a vida de uma oposição que se oponha à popularíssima aliança Lula-Cabral. Mesmo os Garotinho têm tido dificuldades nesse aspecto...

Abraços

Raphael Barreto disse...

Olá Mauricio, sou novo aqui.Eu assiti sua palestra na FGV por isso descobri o seu blog.Você acredita que o fator religioso também contribuiu para a inesperada e surpreendente votação da Marina?

Rafael disse...

Mário, acho que o receio do PSDB em 2006 se deu por causa dos ataques do PCC em São Paulo, no mês de maio, uma elevação de tom na campanha certamente traria esse assunto à baila.

Outra coisa a não se esquecer é que tanto em 2006 como agora o PSDB só foi ao segundo turno por fatores alheios ao partido, agora com o crescimento de Marina Silva nas regiões metropolitanas e na eleição passada, com o "escândalo dos aloprados".

A meu ver Serra só terá chances se abandonar o discurso egoísta e demagógico, assumindo a herança de FHC, fortalecendo os laços com os potenciais eleitores do DEM, a cama da conservadora do país, que como observou o Maurício em post anterior, não encontra representante na atual classe política.

Abraço

brunomlopes disse...

Grande Mauricio,

uma maneira fácil de explicar o que foi essa eleição para um americano é recorrer a uma comparação com o México. Lá, durante anos, cada presidente do PRI indicava o sucessor - o chamado "dedazo".

O Brazilian president tentou fazer um dedazo, apontando como sucessora uma tecnocrata que não havia concorrido em qualquer eleição. Todos acharam que ia ser um passeio, mas os eleitores estão começando a ver que PT e PSDB estão cada vez mais parecidos (no bom e no mau sentido). E aí, tanto faz, o eleitor faz uni-duni-tê.

Quanto ao Rio de Janeiro, o eleitorado sabe separar as estações. Cabral foi muito bem votado por ter mostrado uma solução clara para um antigo problema, a segurança. Mas a Marina foi a segunda, com 31% dos votos, e a tendência é que boa parte desses votos vá para o Serra.

Eu não gosto do PSDB ou do DEM - adorei ver Tasso, Artur Virgilio, Cesar Maia e Marco Maciel voltando para casa com o rabo entre as pernas. Mas vou adorar ver a aprendiz de ditadora também vestindo um pijama, e me divertir por quatro anos assistindo o Serra tendo trabalho para governar com um Congresso oposicionista.

Enquanto os políticos gastarem seu tempo brigando, a sociedade brasileira vai ter espaço para seguir progredindo.

Maurício Santoro disse...

Salve, Raphael.

Me parece que a religião contou ao menos um pouco, os conflitos da Dilma com a Igreja devem tê-la atrapalhado. Quem briga com os católicos no Brasil em geral acaba mal. A hierarquia religiosa segue tendo muito poder por aqui.

Grande Bruno,

O problema é que no México não há reeleição, e no Brasil o dedazo de Lula parece condicionado à possibilidade de que ele retorne em 2014, o que traz uma outra dimensão à disputa. Que funções ele irá exercer num eventual governo Dilma?

O PSDB tentou um esforço de polarização ideológica no primeiro turno, que a meu ver não funcionou. O discurso mais centrista da Marina é o que Dilma e Serra vão precisar disputar ao longo das próximas semanas. Vem briga boa por aí.

Abraços

brunomlopes disse...

Por falar em discurso centrista, as contradições da coligação governista se tornam mais óbvias. Ainda há pessoas que acham que a Dilma é de esquerda, mas André Vargas, secretário de comunicação do PT, usa seu blog para dizer que é contra Serra porque ele "normatizou o aborto" (ou seja, facilitou o aborto na rede pública de mulheres estupradas ou com risco de vida). Volto a repetir: com a saída de muitas pessoas no PSOL, o equilíbrio se rompeu no PT, e os "Andrés Vargas" e "Edsons Santos" dão as cartas sem pudores.

Santa confusão, Batman!

Maurício Santoro disse...

Caro,

É contraditório mesmo, mas lembre-se de que o PT, por conta da forte influência da Igreja desde sua formação, é um dos poucos partidos de esquerda no mundo que nunca tomou posição oficial favorável ao aborto. Até na Espanha e na Irlanda isso já aconteceu, mas aqui a discussão continua travada!

E, ademais, acredito que eles querem bater no Serra por conta das disputas entre Dilma e a Igreja, ao longo do primeiro turno.

Abraços