Na conjuntura atual, a Freedom House afirma que as reações das ditaduras às rebeliões democráticas no Oriente Médio e no Norte da África são a principal causa da piora, mas também há várias causas relacionadas ao agravamento da crise na Europa, em particular em nações como a Hungria, cujo regime dificilmente pode ser considerado democrático. E temos também a recente onda de golpes na África, que mencionei na semana anterior.
Contudo, a nova faceta do autoritarismo incorpora alguns elementos significativos da democracia - a Freedom House identifica que 60% dos países realizam eleições razoavelmente competitivas, ainda que marcadas por fraudes e violações de liberdades de expressão e de associação. Isso é mais do que meramente um gesto de fachada. Em muitas ditaduras eleições de nível local são travadas como disputas políticas reais, e governos autoritários perdem o controle de municípios ou províncias.
O caso é mais complexo quando se trata de eleições nacionais, mas mesmo nelas temos visto ocasionais desempenhos expressivos da oposição, que depois se tornam instrumento de barganhas para acordos de governos de coalizão, no qual líderes democráticos ganham ministérios ou empresas estatais. Claro que isso acaba sendo um poderoso instrumento de cooptação - o Zimbábue é um exemplo forte. Talvez algo desse tipo possa ocorrer na Síria, com a parcela da oposição disposta a negociar com Assad.
Não acredito na possibilidade - nem mesmo remota - da queda do regime democrático no Brasil, mas é importante observar que nas pesquisas de opinião internacionais, como o Latinobarômetro, o apoio dos brasileiros à democracia é bastante baixo, oscila entre 45% e pouco mais da metade da população. É menos do que se poderia esperar dado o bom desempenho da economia, a ascensão de uma nova classe média e até a queda constante das desigualdades, que embora altas, estão no menor nível desde 1960. Entendo que as razões para a falta de entusiasmo com o sistema venham do desencanto com a persistência da corrupção e pelo medo diante da violência e do crime.
São fatores importantes a se levar em conta. Pesquisas recentes apontam que metade dos países que tentaram se democratizar fracassaram, não tanto pelo desempenho econômico, mas por problemas como desigualdades, abusos do Poder Executivo, eclosão de conflitos étnicos etc.
Que pensemos um pouco sobre isso, neste dia em que nós, brasileiros, relembramos nosso mais recente - oxalá último - golpe de Estado.