quarta-feira, 26 de setembro de 2007
Conversas com Sociólogos Brasileiros
OK, não sou sociólogo, apenas um primo-irmão da Ciência Política. Feita a ressalva, gostei muitíssimo da leitura de “Conversas com Sociólogos Brasileiros”, coletânea de 21 entrevistas com os mestres da profissão, realizadas por Elide Bastos, Fernando Abrucio, Maria Rita Loureiro e José Márcio Rego. Algumas idéias centrais ficam dessa discussão: a importância crucial da USP para o desenvolvimento das ciências sociais no Brasil, o impulso para a América Latina nos anos 60 e as guinadas nas trajetórias pessoais provocadas pela ditadura.
Comecemos pela Universidade de São Paulo, fundada pela elite paulista como uma espécie de resposta ao isolamento político resultante da Revolução de 1930 e pela derrota na guerra civil de 1932. Mas a USP transcendeu esses objetivos conservadores e se tornou um importante centro de reflexão sobre o país, contanto com a presença de acadêmicos francês de primeiríssimo time, como Claude Lévi-Strauss e Roger Bastide. E entre seus discípulos, aqueles que se tornaram os mais influentes sociólogos brasileiros, Florestan Fernandes e Fernando Henrique Cardoso.
Florestan foi essencial no estabelecimento de linhas de pesquisa que passaram a ser clássicas no Brasil, como os estudos sobre desigualdades raciais e suas reflexões sobre a transição do escravismo ao trabalho assalariado. FHC, pelos debates sobre empresários e desenvolvimento econômico, que iriam resultar, já em seu exílio, na formulação da célebre teoria da dependência. Os dois formaram gerações de pesquisadores, ajudaram muita gente e mergulharam na política: Florestan foi deputado constituinte pelo PT e Fernando Henrique, claro, presidiu a República.
Os dois fizeram sua formação acadêmica nas décadas de 1940 e 1950. A geração posterior chegou à universidade num ambiente muito mais polarizado politicamente, e num grande entusiasmo pelas transformações que ocorriam na América Latina. Geração de craques como Luís Werneck Vianna e Elisa Reis. Impressionante a importância do Chile – ainda não era o país governado pela Unidade Popular e por Salvador Allende, mas o governo da Democracia Cristã de Eduardo Frei destacou a integração regional, a reflexão sobre o desenvolvimento e tornou o pequeno país andino um dínamo do pensamento. Pinochet, evidentemente, acabou com a festa.
Os anos da ditadura no Brasil foram marcados pela repressão ao trabalho dos sociólogos, mas também, paradoxalmente, pelo grande avanço em política educacional que dotou o país do melhor sistema público de pós-graduação da América Latina. Também foi o momento em que muitos sociólogos foram se doutorar no exterior, nos EUA ou na França – Bourdieu é muito citado. Os campos de estudos se ampliam, entram em cena importantes pesquisas sobre cultura, comunicação, intelectuais, como as de Renato Ortiz, Sérgio Miceli, Ricardo Berzaquen. Outro foco é a análise dos problemas rurais, como em José Souza Martins, nos quais é forte a influência da ação social da Igreja, como a Pastoral da Terra.
O livro se limita aos medalhões, os profissionais que hoje são titulares das cátedras e autores consagrados. Qual a situação da minha própria geração? No limite, temos a opinião de Héctor Leis, que fala sobre a “tristeza de ser sociólogo no século XXI” e afirma que a disciplina se tornou muito moralista, e não atrai mais a elite dos estudantes como nos anos 60 e 70. Mas também há ventos novos e positivos, como o maior acesso à informação, um desejo maior de dialogar com outras formas de pensamento ou mesmo com as artes. E com outras perspectivas profissionais, pois as universidades públicas não são mais a garantia de empregos do passado. Hoje há outros campos: consultorias, ONGs, empresas. Num país tão maluco, não faltará inspiração para jovens sociólogos.
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4 comentários:
Não poderia ter terminado com uma frase mais genial. Quando crescer, quero escrever igual a você, Mau!
Engraçado que só agora me dei conta de que não comento há vários posts, embora sempre esteja passeando por aqui. Mudarei isto a partir de agora!
Abraço grande
Ha ha ha. É porque você anda ocupado agitando o Coisas da Diplomacia. És sempre bem-vindo, meu caro, e estamos nos devendo uma rodada de conspiração no Sagrada. Tem novidade boa na roda.
Abraços
Pois como promessa é dívida, que tal marcarmos semana que vem? Qd vc pode?
Hoje, a Manoela te substituiu. DH foi o tema...
Abração
Vamos ver como fica minha agenda, que está um pouco complicada para esta semana. Talvez na outra. Legal saber da Manu, vocês estão em excelente mãos!
Abraços
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