terça-feira, 29 de janeiro de 2008

As Guerras do Futuro



Para os militares americanos, as guerras que o país lutará nos próximos 15 anos serão conflitos de pequeno escopo, voltados para embates religiosos, étnicos ou operações de contra-terrorismo. A maioria ocorrerá numa área geográfica que vai da África do Norte à Ásia Central e que corresponde, em termos históricos, ao antigo califado islâmico. Boa parte delas será de caráter “híbrido”, misturando guerra convencional com contra-insurgência. Jovens pobres de países em desenvolvimento, concentrados em grandes cidades à beira-mar, são analisados com especial atenção como futuros antagonistas.

Este sumário é baseado em textos disponíveis no excelente site americano Small Wars Journal, que posta artigos e análises diárias a respeito das guerras em curso, em particular no Iraque e no Afeganistão. Os autores são jornalistas, acadêmicos e militares envolvidos no debate e na implementação das políticas de defesa dos Estados Unidos.

Em grande medida a discussão atual resume as experiências traumáticas dos últimos anos, sintetizadas no novo manual de contra-insurgência do Exército americano (a Força Aérea e os Fuzileiros Navais também têm publicado documentos a respeito). No blog que citei acima, John Donnelly examina o que mudou no pensamento militar:

Para o Exército, a nova doutrina significa um abalo cultural sísmico. Ele ainda terá canhões e blindados, mas também precisará de mais pessoas treinadas em línguas, relações públicas, desenvolvimento econômico e mesmo antropologia. Em vez de aceitar resmungando as tarefas de reconstrução nacional, como fez inicialmente no Iraque, o novo Exército precisará na maior parte dos casos abraçar a nova função. Desse modo, a “revolução nos assuntos militares” baseada em alta tecnologia e armas inteligentes, que cativou os estrategistas do Pentágono por décadas, está se tornando uma revolução para além dos assuntos militares.

Será? Me parece que essas análises seguem o famoso ditado de que os generais se prepararam sempre para a última guerra. Neste caso, projeta-se para o futuro o que os americanos enfrentam atualmente no Iraque e no Afeganistão, ou o que experimentaram de maneira breve na fracassada missão de paz na Somália. É um tanto questionável se as próximas guerras de fato seguirão esse padrão. Talvez os futuros governos dos Estados Unidos se mostrem bem mais relutantes em engajar suas tropas em aventuras militares na Ásia, após a constatação de que sair de um país ocupado pode ser mais difícil do que conquistá-lo.

A nova estratégia esbarra num problema sério nos EUA: a falta de pessoal qualificado para as Forças Armadas. Em torno de metade dos cadetes formados pela academia de West Point está abandonando a carreira militar após cumprir os cinco anos de serviço obrigatório. O Exército vem tentando lidar com o problema oferecendo bônus financeiros e melhores possibilidades dos oficiais escolherem bases perto de suas cidades natais, mas não tem adiantado.

Outro ponto - as pessoas mais adequadas para a nova tarefa necessitam de muita empatia e capacidade de compreender culturas estrangeiras, o que não são exatamente características da política externa de nenhuma grande potência. Já citei o caso do tenente-coronel John Nagl, o promissor especialista do Exército em contra-insurgência, que deixou a instituição para se tornar pesquisador acadêmico. Também impressiona a história de John Rushing, que era capitão dos fuzileiros navais, encarregado das relações com a imprensa durante a Guerra do Iraque. Rushing questionou muito do que viu no conflito e agora é repórter da TV Al-Jazeera.

Pessoas e instituições aprendem com os erros, e mudam. Em última instância, essa é a esperança da humanidade.

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