sexta-feira, 18 de setembro de 2009
Alemanha: eleições, crises, memórias
Na semana passada meu irmão passou alguns dias em Brasília e um dos temas sobre os quais mais conversamos foi a situação atual da Europa, continente que ele visita com freqüência (chequem seu ótimo blog de viagem, com impressões que vão da Sérvia à Finlândia). E, naturalmente, falamos muito do país mais importante da região, que nos fascina: a Alemanha.
O país perdeu há poucas semanas sua posição de maior exportador mundial. Para a China, é claro. Há ansiedade em como conciliar os direitos de cidadania alemães com a economia global cada vez mais competitiva, mas o país enfrenta bem a crise internacional. As políticas públicas de proteção social funcionaram, e as medidas de incentivo ao consumo e à indústria foram eficazes, em particular no setor automobilístico. Forte contraste com a situação bem mais complicada do Reino Unido.
No fim deste mês haverá eleições gerais na Alemanha e a vantagem (ligeira) é para a coalizão entre democratas cristãos e sociais-democratas, liderada por Ângela Merkel. É uma situação curiosa, porque o principal rival à chanceler é seu próprio ministro das relações exteriores. A imprensa observa que os debates entre ambos parecem mais um dueto do que o enfrentamento entre posições opostas.
Tédio é um luxo raro na história política alemã, como lembraram as cerimônias sobre deste mês sobre os 70 anos do início da Segunda Guerra Mundial, e duas décadas da queda do muro de Berlim. O mais interessante foi a publicação de documentos do Foreign Office britânico, até então confidenciais, que mostram o pavor de Margareth Thatcher e François Mitterand com a possibilidade de uma Alemanha unida e ressurgente. Os dois pensaram em recriar a aliança com a Rússia para conter o colosso germânico, mas recuaram diante do turbilhão incontrolável dos acontecimentos.
As mudanças na política externa alemã foram bem mais graduais do que se imaginava. O país retomou a influência na Europa Oriental e flerta com a retomada do sentimento de orgulho nacional (mesmo que por ora limitado ao esporte), mas segue jogando de acordo com as regras, na União Européia e na OTAN.
Ou quase sempre. Uma das polêmicas das eleições alemãs é o desempenho dos militares do país na guerra do Afeganistão. Há uma série de limitações a seu envolvimento em operações de combate, mas dias atrás eles foram responsáveis pelo ataque aéreo a um comboio seqüestrado pelos Talibãs. O bombardeio resultou em muitas mortes de civis inocentes e despertou um debate amargo na Alemanha sobre as responsabilidades internacionais do país.
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11 comentários:
O muro caiu em 89, portanto duas décadas ;)
Engraçado essa história de Alemanha, da tradição autocrática dos Kaisers e mesmo (ou principalmente)de Weimar, referência de democacia cordial...
Oops, tem razão, obrigado, vou corrigir o texto.
Weimar foi uma democracia muito caótica, ainda que com uma vitalidade cultural impressionante.
Curioso como a experiência de Weimar detonou debates passionais na ciência política, inclusive sobre as regras do sistema eleitoral, que favoreceram os pequenos partidos. E teriam ajudado os nazistas...
Abraços
é um tema interessante. Curioso notar que Alemanha e Japão tiveram suas insttuições reformadas no pós-Guerra, mas o ambiente regional europeu é, sem dúvida, menos ameaçador em relação ao ambiente regional de segurança japonês.
Os japoneses, na minha opinião, foram mais longe. O desenvolvimento teconológico na área de defesa em conjunto com os EUA tem sido impressionante. Mas ambos estão entre os que mais gastam com defesa no mundo. "Potências Civis" não é? :[
abraços.
Salve, meu caro.
O cenário regional faz toda a diferença. A participação alemã na União Européia e na OTAN é uma garantia de que o país não vá sair por aí repetindo velhos hábitos, como ocupar Paris e Varsóvia.
As rivalidades na Ásia são bem mais complexas e eu me pergunto o impacto delas na vida política japonesa. Agora mesmo tivemos uma eleição importante, com uma raríssima vitória da oposição.
O novo premiê japonês andou falando um pouco sobre a necessidade de maior integração regional na Ásia. Será que teremos novidades na área?
Abraços
Olha tenho lido muitos estudos sobre livre comércio na Asia e me parece que há um potencial para superação em nome do progresso economico, mas com tantos regimes fechados fica dificil compreender as correntes de opinião publica que formam a política externa (bem escola francesa isso, não? rs).
A Alemnhã é realmente fascinante, por que apesar de seu passado tenho amigos negros que dizem ser um dos melhores lugares do mundo em termos de oportunidades iguais, pode ser um sinal que velhos hábitos morreram ao atingirem o ápice.
Pode sair da crise como motor da europa até mesmo financeiro se o Reino Unido não se resolver.
E na competição com a China, quanto das exportações chinesas não são de firmas alemãs?
Salve, Mário.
Meu irmão me disse a mesma coisa a respeito da tolerância racial e cultural na Alemanha, o que me deixou bastante surpreso, dada a postura do governo em se opor firmemente à entrada da Turquia na União Européia.
Com certeza há bons investimentos alemães na China, a preocupação do país é com relação a salários e direitos trabalhistas. Competência tecnológica, sem dúvida, os alemães têm de sobra.
Abraços
Meu caro:
Respeito ao racismo, é emocionante ver cómo a Alemanha tem superado os horrores do nazismo e não estão relativizando números nem nada disso. Todo um modelo pra o Japão, que ainda não termina de aceitar os crimes de guerra (incluindo as tristemente famosas "mulheres do consolo") e até pra nós, latinoamericanos, que não temos asumido totalmente os diversos genocídios dos séculos XIX e XX.
Saludos!
É verdade, Patricio, a relação com os crimes do passado é muito diferente na Alemanha do que no Japão ou na América Latina. Novamente, acho que a questão da região importa muito. Integrar-se à União Européia significa aceitar determinados padrões com relação à democracia e aos direitos humanos.
Abraços
Jogador, realmente não dá para colocar "tudo no mesmo saco". Japão e Alemanha tem diferenças importantes tanto internamente quanto no ambiente regional como havia dito. Esse discurso de integração regional eu já vi com o Koizumi. Mas no fim, me parece que a estratégia e ser o maior investidor direto na China mesmo, levar grandes montadoras nipônicas para lá e tentar diminuir o dilema de segurança.
Patricio, A reconciliação com o passado não ocorreu na mesma intensidade na Ásia Oriental como na Europa. Mas o governo japonês já reconheceu sim responsabilidades e pediu mais de uma vez desculpas formais. O problema é que a China usa isso para manipular a população.
Sobre a Alemanha. Engraçado que no Die Welle há um aluno turco. Ele parece ser um dos mais animados com as idéias totalitárias. Ironia não?
Salve, Helvécio.
Pois é, mas o turco da Onda entra no movimento porque é um lugar onde a cor da pele e a origem nacional dele não importam, e ele pode se sentir parte, plenamente, do grupo.
Abraços
Primeiramente gostaria de elogiar seu blog, matérias muito bem redigidas, e de fácil compreensão. Sou aspirante a carreira diplomática, caloura no curso de relações internacionais na ESPM de Porto Alegre.
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