quinta-feira, 15 de novembro de 2007
Guerra e Cooperação para o Desenvolvimento
Há uma revolução silenciosa ocorrendo no campo da cooperação internacional para o desenvolvimento: o impacto que as guerras vêm tendo na criação de novos instrumentos e agências estatais dedicadas ao tema. O principal campo de testes tem sido o Afeganistão, mas algo semelhante também ocorre no Iraque, na medida em que as condições de segurança permitem. A idéia básica é simples: a força militar, sozinha, não garante a vitória. Para estabelecer um mínimo de estabilidade política e confiança da população civil, é preciso oferecer algum tipo de compensação em termos de serviços públicos e emprego.
José Luis Fiori tratou disso em artigo recente ("Eleições e Escolhas Estratégicas", Valor, 07/11/2007). O texto só está disponível para assinantes, mas reproduzo o trecho principal, que diz respeito ao debate presidencial nos EUA: "E o que é mais interessante: quase todos os candidatos propõem a criação de “corpos”, brigadas ou agencias civis, encarregadas de reconstruir e administrar os territórios e os governos incorporados ou atingidos pelo poder americano, ao redor do mundo. Uma proposta que lembra muito as instituições e os servidores encarregados de administrar o império britânico: os “imperial builders”, da Rainha Vitória."
Há sem dúvidas semelhanças e muitos historiadores britânicos - como Niall Ferguson - comparam a Grã-Bretanha favoravelmente aos EUA, simplesmente porque a primeira tinha uma elite que fazia do serviço ao Império sua razão de ser. Não há nada parecido nos Estados Unidos em termos de talento, habilidade e dedicação ao célebre Serviço Colonial Indiano, que empregou homens brilhantes como Rudyard Kipling, Richard Burton e, em seus escritórios londrinos, John Stuart Mill e John Maynard Keynes. Fora outros gênios que serviram na Ásia e Oriente Médio, como Thomas Edward Lawrence e George Orwell.
Na medida em que decisões cruciais da política externa americana cada vez mais acontecem em lugares remotos como o Curdistão ou Cabul, tem aumentado as preocupações entre os líderes políticos sobre a incapacidade do país em lidar com tantos problemas de falta de informação e de profissionais especializados em questões de desenvolvimento, assistência social ou propaganda política para outros povos. Max Boot escreve em interessante artigo para o NY Times sobre a necessidade de (re)criar agências dedicadas a esse tema e dar-lhes autonomia diante do Pentágono e do Departamento de Estado.
Os casos mais interessantes em andamento são o uso de antropólogos na guerra do Afeganistão e a criação do Comando Africano pelas Forças Armadas dos EUA. O primeiro exemplo só chocará aqueles que desconhencem a história das ciências sociais. A antropologia nasceu dos serviços coloniais, e surgiu como uma ferramenta que visava ao domínio daquelas populações. Claro que depois ela se tornou outra coisa, mas sempre pode ser utilizada para seu velho propósito. Às vezes isso rende obras-primas, como "O Cristântemo e a Espada", clássico de Margaret Mead sobre a cultura japonesa escrito para o Exército americano durante a II Guerra Mundial.
A segunda situação merece explicação. As Forças Armadas dos Estados Unidos tem uma série de comandos internacionais, cada um responsável por uma região do planeta - a América Latina, por exemplo, está a cargo do Comando Sul. Até este ano, a África não tinha uma estrutura própria e o continente estava fragmentado entre os comandos "Europa", "Central" e "Pacífico".
O novo Comando Africano está sob a chefia de um general negro, evidentemente, mas sua criação é muito interessante por diversas razões. Primeiro, ilustra a importância crescente da África para a política internacional, basicamente como fonte de energia (petróleo, gás, bicombustíveis), minérios e matérias-primas. Mas também como ameaça de segurança para os EUA e Europa, tanto pela ação de grupos terroristas (Egito, Somália, Sudão) como possível local de origem de correntes emigratórias indesejáveis (fluxos de refugiados) e mesmo de epidemias.
Segundo, o novo Comando Africano tem um caráter diferente dos demais: é muito mais voltado para temas sociais e de desenvolvimento. Sua vice-chefe, por exemplo, é uma experiente diplomata de carreira. Também há a expectativa de que ele seja uma espécie de campo de testes para o trabalho conjunto de várias agências do governo americano dedicadas a esses assuntos.
O Brasil tem interessante política de cooperação para o desenvolvimento, que usa poucas verbas e é bastante concentrada na questão da capacitação de técnicos estrangeiros. Há muitos problemas de coordenação entre os diversos ministérios, mas especialmente entre o Itamaraty e as Forças Armadas. É uma vergonha que nossa diplomacia ainda não conte com um departamento especializado em temas militares, basicamente por conta de feridas não-cicatrizadas da época da ditadura. Esse insulamento burocrático vem impedindo que nosso país aperfeiçoe iniciativas muito importantes, como aquelas que o Exército vem desenvolvendo no Haiti, e que já estão se tornando referências internacionais, inclusive para as Forças Armadas dos EUA.
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Um comentário:
Espero com Fé que as bolsas de valores quebrem meu amigo,a loucura americana precisa ter fim. chega desta orda mizéravel que impoe seu poder bélico ao mundo e principalmente aos mais fracos, acrédito na união das massas operárias para derrubar este regime que já começou a ruir.
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