segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Princesas


si la vida te da más de cinco razones para seguir
si la vida te da más de 5 rincones para dormir
si la vida te da más de 5 millones para morir

se fuerza la máquina de noche y de día
se fuerza la máquina de noche y de día
si la vida te da más de 5 cabrones para aguantar
si la vida te da más de 5 lecciones para no seguir

se fuerza la máquina de noche y de día
se fuerza la máquina de noche y de día


Tenho uma dívida com o cineasta espanhol Fernando León de Aranoa. Sempre reluto em assistir a seus dramas sociais. Os temas me interessam, mas são pesados e fico indeciso por semanas até finalmente vê-los e me maravilhar com a poesia e sensibilidade com que retrata os problemas das pessoas pobres. Foi assim com “Segunda-Feira ao Sol”, talvez o melhor filme contemporâneo sobre desemprego. E repeti a dose com “Princesas”, excelente história sobre prostituição, imigração, mas acima de tudo, amizade.

A capa do DVD traz uma crítica que afirma que León tem “o mesmo estilo de Almodóvar”. Bobagem para atrair espectadores. Ao contrário do diretor de “Carne Trêmula”, seus filmes têm sentimentos contidos, humor sofrido e felicidade que nunca é para sempre, apenas uma trégua na vida. “Princesas” é protagonizado por duas mulheres muito diferentes. Cayetana (interpretada por Candela Peña) é uma espanhola de classe média, que por razões que não sabemos, trabalha como prostituta. Lida com suas dificuldades contruindo fantasias sobre princesas e utopias de dias perfeitos, mais ou menos como sua mãe viúva enfrenta a solidão enviando flores para si mesma e fingindo ter um admirador secreto. Quem tira Cayetana de seu castelo é Zulema (a atriz porto-riquenha Micaela Nevárez), imigrante ilegal da República Dominicana. Mais jovem, muito bonita, ela também é prostituta e sobrevive na Espanha com saudades do país natal e do filho pequeno que deixou para trás. Uma série de acasos as aproxima e a necessidade de apoio mútuo as torna grandes amigas.

voy calle abajo, voy calle arriba
no me rebajo ni por la vida
me llaman calle y ése es mi orgullo
yo sé que un día llegará, yo sé que un día vendrá mi suerte
un día me vendrá a buscar, a la salida un hombre bueno
pa toa la vida y sin pagar, mi corazón no es de alquilar


Como em “Segunda-Feira ao Sol”, León utiliza um grupo de personagens em cenas cotidianas que dão o panorama de um tema social. Em “Princesas”, isso acontece com dois grandes blocos: as prostitutas e os imigrantes. As primeiras são mostradas na rua, à busca de clientes, ou num salão de cabelereiro, que rende muitas das melhores cenas do filme. As amigas de Cayetana estão inquietas com o aumento da competição, pois as imigrantes ilegais cobram mais barato e atraem os homens com sua beleza exótica.



Os diálogos são ótimos, quase uma paródia de uma reunião de conselho diretor de empresa. O mundo dos imigrantes entra através de Zulema, e dos restaurantes étnicos, dos quartos de aluguel onde se revezam várias famílias, da angústia de não ter papéis e estar sempre à mercê das autoridades.

me llaman calle, de esquina a esquina
me llaman calle bala perdida, así me disparó la vida
me llaman calle del desengaño, calle fracaso, calle perdida
me llaman calle la sin futuro
me llaman calle la sin salida


A prostituição é o supra-sumo da mercantilização do ser humano e não por acaso o dinheiro é um importante personagem do filme. Cayetana tem uma obssessão quase fica com notas e moedas e a todo o tempo é mostrada manuseando-as, e anotando seus ganhos num caderno. Ela economiza para um implante de silicone que, acredita, a tornará mais competitiva no mercado. Os celulares também aparecem muito, como uma ferramenta de trabalho particularmente incômoda.

Um ponto alto, altíssimo do filme, é a excelente trilha sonora composta por Manu Chao, com as canções “Cinco Razones” e “Me Llaman Calle”. Os ritmos mestiços e a poesia cortante de suas letras funcionam à perfeição para a história de Cayetana e Zulema, alternando drama, humor, garra e o desejo romântico de encontrar um homem que as espere à saída do trabalho, e que não pague. Os trechos em itálico são dessas canções.

O maior mérito de “Princesas” é se concentrar no aspecto humano, da amizade entre as duas mulheres, e raramente ter enfoques moralistas sobre a prostituição – embora isso aconteça no final, que não me agradou. Críticas pontuais ao trabalho de um excelente cineasta, que preciso acompanhar com mais atenção.

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