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Ontem foi o lançamento de "Política Externa na Era da Informação", do meu amigo fraterno Leonardo Valente. O livro é a dissertação de mestrado do Leo, na qual ele analisa o papel dos meios de comunicação na política internacional, tema importantíssimo e pouco estudado. O trabalho do Leo já virou uma referência importante – foi muito citado por um diplomata argentino que acabou de escrever um livro sobre o assunto. De fato, meu amigo tem condições privilegiadas para a análise, pois é repórter da editoria internacional do Globo e um jornalista tarimbado que já esteve até clandestino em Cuba, cobrindo as repercussões da doença de Fidel.
Pouco após a defesa de sua dissertação, escrevemos um artigo em que aplicamos suas idéias à experiência que tive trabalhando na Venezuela, no Fórum Social Mundial de 2006. O resultado foi "A Diplomacia Midiática de Hugo Chávez". Desde então, sempre conversamos sobre os momentos em que a imprensa exerce um papel nas questões internacionais. Um deles foi durante os Jogos Pan-Americanos. Esse foi um tema que apareceu com força no papo do coquetel do lançamento.
Conversando com alunos comuns – o Leo também leciona na pós-graduação da Universidade Candido Mendes – comentei o impacto que as vaias no Pan tiveram para as ambições brasileiras de sediar as Olimpíadas e a Copa do Mundo. A imprensa estrangeira retratou de maneira muito negativa o comportamento da torcida, que vaiou atletas de várias nacionalidades. Um amigo que trabalhou na segurança dos jogos me disse que as agressões que mais o chocaram ocorreram durante os Jogos dos Para-atletas: “O sujeito que está ali já é um vencedor, ele superou grandes limitações físicas. É uma covardia agredi-lo.”
O Leo me chamou a atenção para a rapidez com que a imprensa estrangeira cobriu as vaias brasileiras e como elas foram apresentadas à opinião pública internacional como um exemplo da incapacidade do país em sediar grandes eventos esportivos mundiais. Claro que esse é o tipo de posição que as nações que rivalizam com o Brasil querem ver difundidas. O argumento do Leo, central em seu livro, é que o uso da imprensa é um instrumento fundamental na política externa contemporânea e que o Estado brasileiro não tem conseguido lidar bem com isso. Outros países estão mais atentos. Como dizia Madeleine Albright, “A CNN é o novo membro permanente do Conselho de Segurança”.
Meu amigo que trabalhou no Pan expressou uma opinião semelhante, dizendo que era preciso educar o público dos jogos para a importância de um comportamento adequado, para o que estava em questão com relação aos interesses da política externa do país. Mas ambos lembramos que isso não foi necessário em 1950. Naquela célebre Copa, o Uruguai venceu o Brasil em pleno Maracanã e os jogadores uruguaios foram unânimes em elogiar a gentileza e educação da torcida brasileira, que os cumprimentou pela vitória que é a maior tragédia do futebol nacional.
O que mudou no Brasil? “É a geração Rede Globo”, palpitou meu amigo. Mas o fato é que essa violência (mesmo que limitada ao aspecto verbal) associada ao esporte também cresceu em outras regiões, como na Europa e na Argentina. Os hooligans e as barra bravas se sentiriam em casa em meio à grosseria brasileira no Pan.
Para quem se interessa pelo tema da diplomacia midiática e das relações entre esporte e política, recomendo outros dois excelentes livros. Não por acaso, também escritos por jornalistas espertos: “Genocídio – a retória americana em questão”, de Samanta Power (vai muito além do título e inclui uma ótima discussão sobre imprensa e conflitos internacionais) e “Como o Futebol Explica o Mundo”, de Franklin Foer.