sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Interlúdio Uruguaio



Um imprevisto nesta semana me levou a uma viagem de trabalho ao Uruguai, em outra visita de campo na pesquisa sobre juventude sul-americana. Passar bons dias em Montevidéu não é exatamente um sacrifício e as conversas que tive no Prata foram muito interessantes.

Me hospedei num pequeno hotel a duas quadras da Plaza Independencia (foto), o cartão-postal mais famoso de Montevidéu. Participei de reuniões com nossos parceiros no país, ONGs ligadas aos direitos humanos e muitos acadêmicos, sobretudo da faculdade de ciências sociais da Universidade da República. Discutimos a situação da juventude e as políticas públicas do setor com gestores do governo e especialistas das agências da ONU no Uruguai.

O país é o único território que já foi brasileiro e optou por deixar de sê-lo, em diversas guerras e rebeliões pela manutenção de sua independência. Foi uma sábia decisão, pois a sociedade uruguaia é muito mais igualitária, próspera, educada e equilibrada do que qualquer região brasileira. Gosto sobretudo do jeito aberto e fraterno das pessoas, e do cosmopolitismo da cultura cotidiana - por exemplo, jornais de vários países da América Latina e da Europa à venda em qualquer banca.

Contudo, a crise argentina de 1998-2002 bateu com muita força no Uruguai. Os dias de riqueza e bem-estar social ficaram para trás. A desigualdade cresceu e surgiram miseráveis, embora a situação seja muito diferente da brasileira. Os uruguaios (ainda) não se acostumaram com os aspectos mais cruéis da pobreza extrema. Olham nos olhos dos mendigos quando eles lhe pedem esmolas e jornais denunciam em manchete a vergonha de pessoas dormindo na rua. No Brasil, é o pão amargo de cada dia...

Mas o Uruguai se esforça para se reerguer. Uma das ONGs que são nossas parceiras, por exemplo, aproveitou a baixa no preço dos imóveis durante a crise para comprar uma bela casa do início do século XX (foto), onde instalou sua sede. É um lugar muito simpático e que parece resumir o charme da competência profissional e calor humano que associo aos uruguaios.



A imprensa brasileira é sempre histérica com relação ao suposto desejo do Uruguai de deixar o Mercosul. Pura bobagem. Não conheço outro país sul-americano tão dedicado à integração regional e onde esses temas tenham entrado tanto no cotidiano. A expressão "Mercosul" está por todas as partes. É difícil imaginar a sobrevivência desse pequeno país sem a inserção num processo regional que possa mediar os aspectos mais duros de suas relações econômicas internacionais - por exemplo, as negociações de acordos na OMC.

O que os uruguaios criticam, e com muita razão, são vários dos problemas do bloco, em particular o tratamento ruim dispensado a suas queixas comerciais diante do Brasil e da Argentina. Fiquei muito bem impressionado com as sugestões e propostas que ouvi das lideranças sociais urguaias, acho que podem render uma bela agenda de debates e de reflexão.

Consegui algum tempo para passeios, e o que mais gostei foi a Ciudad Vieja em Montevidéu, o bairro do centro histórico - abaixo, a Praça da Matriz, na qual está a catedral e o cabildo.



A área havia caído em degradação e pobreza, mas começou uma virada há cerca de 15 anos, quando a Frente Ampla assumiu a prefeitura. Hoje é um setor muito simpático, com ótimos restaurantes, galerias de arte, museus e teatros. Decididamente, preciso voltar a Montevidéu.

2 comentários:

Sergio Leo disse...

Bela dica, essa, Maurício. Montevidéu é mesmo uma cidade encantadora. E os uruguaios muito simpáticos; deveriam ser menos tristes, não sei se v. concorda.

Maurício Santoro disse...

Salve, Sergio.

Sim, há uma certa melancolia na cultura uruguaia, como também na Argentina. As pessoas com freqüência se referem aos tempos em que o país era rico e sua vida era mais fácil. A ironia é que com todas as crises eles continuam muito melhor do que a maioria dos latino-americanos...

Abraços