terça-feira, 13 de novembro de 2007

Fim de Tese


Completei minha tese de doutorado no sábado. O processo final foi rápido: apenas oito meses de redação. Precedidos, claro, por três anos de leituras e pesquisa. Se essa primeira etapa de trabalho é bem executada, o resto é organizar as fichas e apresentar as informações.

Supõe-se que uma tese deva contribuir à teoria e inovar numa área específica de pensamento. Bonitas ambições, além do escopo do meu trabalho. Meu objetivo é mais simples: entender as guinadas da política externa argentina dos últimos 20 anos no que diz respeito às suas relações com Brasil e Estados Unidos. Aprendi muito durante a pesquisa e gostei do resultado. Acredito que quem ler meu texto descobrirá uma coisa ou duas sobre nosso vizinho e se interessará em conhecer mais. Não creio que seja um trabalho inovador, apenas reforça algumas tendências contemporâneas um tanto marginais na academia brasileira, como a necessidade de estudar mais a fundo as dinâmicas políticas internas (inclusive a ascensão de movimentos sociais e os debates sobre identidade cultural) para entender a formulação da agenda diplomática.

Hoje deixei os dois últimos capítulos da tese no IUPERJ, para que meu orientador possa lê-los, avaliá-los e me indicar mudanças e correções. A princípio farei minha defesa em março de 2008, após as férias de verão. A data é mais adequada para os horários dos professores e também me permite um bom tempo para os ajustes finais.

O término da tese marca o fim de uma jornada muito importante que ocupou meus últimos quatro anos. Entrei para o doutorado com muitas dúvidas se era a melhor opção, o que acabou me decidindo foi a facilidade que o IUPERJ dá a seus mestrandos de prosseguir na especialização profissional. Pensei, ora bolas, em algum momento vou querer concluir o curso, por que não agora? Se ficar cansado, tranco matrícula. Não fiquei, evidentemente. Às vezes ouço histórias de terror de doutorandos, mas para mim esta é uma época de aprendizado alegre, do convívio fraterno com os amigos e do enorme estímulo por parte dos professores.

É possível que às vezes eu frustre meus mestres pela minha relutância em me dedicar integralmente à vida acadêmica. Afinal, já recusei diversas ofertas de cargos como professor e até convites para coordenar cursos de pós-graduação. Tenho claro para mim de que não é o que desejo, ao menos neste momento. Meu horizonte é trabalhar com políticas públicas e cooperação para o desenvolvimento, ainda que sempre queria tempo para lecionar.

Na semana passada estive em Brasília a convite da Secretaria Nacional de Juventude e da Organização Internacional do Trabalho, para uma excelente oficina sobre jovens e políticas de emprego. Coordenei uma mesa de debates e conversei muito com técnicos do governo e do sistema ONU, representantes de ONGs e movimentos sociais. É bom ver que os dados de nossa pesquisa sobre juventude na América do Sul estão tendo acolhida interessada, entusiasmada mesmo, por parte de tantas pessoas dedicadas ao tema. Agora mergulharei de cabeça na redação do relatório final do projeto, que precisa ficar ponto em três semanas.

Um pequeno episódio da viagem ficou comigo como exemplo das limitações do meu ofício. Tarde da noite no aeroporto do Rio de Janeiro, esperava o vôo para Brasília lendo o relatório brasileiro da nossa pesquisa sobre juventude. Estava cansado e tenso pelo acúmulo de trabalho, quando um menino se aproximou e pediu para engraxar meus sapatos. Duvido que tivesse mais de 8 anos. Negro, claro. Agradeci, mas recusei. Ele então se ofereceu para me vender pulseiras: “Elas ficam lá fora, porque o guarda não me deixa entrar com elas”. Disse não, novamente – quantas vezes o garoto ouve a expressão num só dia? Ele então se afastou em sua solidão, rumo à chuva, rumo à noite. Na minha pasta, trazia um romance francês, presente da minha mãe, sobre as angústias da alta burguesia parisiense. Botei o livro de lado e voltei ao relatório sobre juventude brasileira, com raiva e frustração.

4 comentários:

Anônimo disse...

"ajudar" negando ou "ajudar" aceitando o trabalho desses pequenos? aí mora o perigo...

dra disse...

vivemos todos em um mundo muito triste. e, ao menos, vc ainda se incomoda. muita gente, nem isso, vive sedada.
qto ao doutorado, parabéns! é sempre bom fechar etapas. força e bola pra frente!
abs,

N, Maciel disse...

Parabéns por concluir esta fase da sua vida! Eu vou começar a minha agora, acabei de passar para o mestrado no IUPERJ. Espero que minha "estadia" lá seja tão bem sucedida como a sua parece ter sido.
Já que você se interessa por juventude, te indico a edição especial da revista Sociologia, sobre juventude brasileira. Provavelmente você já leu, mas fica aqui a dica.
Sucesso em sua jornada.
Vou tentar passar mais vezes por aqui, gosto muito de ler este blog
Sucesso!

Maurício Santoro disse...

Pois é, anônimo, é sempre díficil. Em geral eu nego esmolas.

Dra, há mais gente inquieta por aí do que em geral se supõe, mas elas acabam se calando e seguem em frente.

Natália, seja bem-vinda ao IUPERJ. Espero que o instituto seja tão acolhedor para você quanto tem sido para mim. Vamos nos encontrar no churrasco de fim de ano, não?

Quanto à revista que você menciona, ela foi editada por uma das minhas melhores amigas e várias das articulistas trabalham no projeto. Também dei uma mãozinha na preparação da edição.

Abraços