
Reproduzo meu artigo publicado nesta quinta no site “Juventudes Sul-Americanas”:
***
Uma das características que mais chamaram a atenção na campanha presidencial dos Estados Unidos foi o apoio da juventude a Barack Obama. As pesquisas indicam 60% do voto juvenil (18-29 anos) para o candidato, contra 30% para seu rival John McCain. O eleitorado jovem é formado por 44 milhões de pessoas, cerca de 25% do total.
Nas eleições de 2000, o Partido Democrata teve 2% a mais dos votos dessa faixa etária do que o Republicano. Em 2004, 9%. Contudo, a preferência da juventude por Obama não significa a adesão juvenil a uma doutrina partidária ou a um líder. É antes o reflexo da nova geração cidadã, que se tornou ativa politicamente em meio às tragédias dos atentados de 11 de setembro de 2001, das guerras no Iraque e no Afeganistão, da crise econômica e de uma série de escândalos envolvendo o governo Bush.
Ceticismo diante da tradição
A geração atual tem sido chamada de “Milênio”, “Y” ou “Pós-Tudo”, e seria marcada pelo ceticismo diante da liderança política tradicional. Nas sondagens de opinião, quase 80% da juventude dos Estados Unidos afirma que não apóia nenhum dos dois principais partidos ou que gostaria de ver alternativas. Desde sua campanha para o Senado, em 2004, Obama tem demonstrado cuidado em evitar a polarização, defendendo a construção de novos consensos, que ultrapassem a divisão partidária, e pregando a negociação entre grupos adversários, tanto nos Estados Unidos quanto entre o país e nações estrangeiras hostis.
O candidato também conquistou apoio juvenil por sua ênfase em temas ligados à qualidade de vida, em particular a agenda de meio ambiente, mudança do clima e energias alternativas ao petróleo. A juventude tem manifestado muito mais interesse por esses assuntos do que as pessoas mais velhas, que se mostram cautelosas em abandonar os modelos tradicionais.

O apelo à “mudança” - principal lema da campanha de Obama - não deve ser subestimado. Nos últimos 20 anos, a Casa Branca foi ocupada por presidentes que pertenciam às famílias Bush ou Clinton. A maior parte do eleitorado jovem viveu apenas esse período e a vontade de renovação foi um dos fatores que explicou a derrota de Hilary Clinton nas primárias democratas. Ela teve apenas 30% dos votos juvenis, pois, em grande medida, as pessoas nessa faixa etária a identificaram com o status quo conservador, e buscaram algo novo e diferente.
Comparecimento crescente, mas ainda baixo
Obama foi bem-sucedido não só em conquistar o apoio do eleitorado jovem, mas também em fazer com que rapazes e moças fossem às urnas. Nos Estados Unidos o voto é facultativo, e só é permitido para maiores de 18 anos. Desde a década de 1970, a taxa de comparecimento eleitoral juvenil é quase sempre menor que 50%, enquanto a adulta fica acima de 65%.
Os índices começaram a subir – para todas as faixas etárias – a partir de meados desta década. Nas primárias de 2008, houve o dobro de participação juvenil do que em 2000. Para além do entusiasmo com Obama, o aumento decorre também da ênfase que as campanhas de todos os partidos têm dado às novas tecnologias de informação, usando amplamente instrumentos como YouTube, sites de relacionamento como Facebook e MySpace, e mensagens enviadas por celulares. Há diversas organizações não-governamentais e movimentos sociais dedicados a estimular o eleitorado jovem.
Ainda assim, as pesquisas apontam que pouco mais da metade da juventude irá às urnas em 4 de novembro, o que mostra grande nível de apatia e desinteresse com a política partidária, mesmo diante de uma disputa tão acirrada e com questões tão importantes em jogo. No atual ritmo de crescimento populacional dos Estados Unidos, em 2015, um terço de todos os votos será de pessoas com menos de 30 anos. Como esses rapazes e moças se comportarão com relação aos principais temas da agenda pública?
Uma nova agenda política
O legado com os quais a juventude dos Estados Unidos precisa se defrontar é difícil. Nos últimos trinta anos, as desigualdades sociais aumentaram muito, colocando o país com o pior índice nessa área entre as nações desenvolvidas. A qualidade e disponibilidade de diversos serviços públicos, como educação e saúde, diminuiu.
A nova geração é mais diversa do ponto de vista étnico. Cerca de 1/3 é de ascendência africana, latino-americana ou asiática. Sua visão política é mais favorável às políticas de ação afirmativa e ao auxílio à imigração. Também tem posições mais tolerantes com relação ao homossexualismo, inclusive ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. De modo geral, favorecem maior participação do Estado na vida cotidiana.
Os problemas que os preocupam são familiares aos da juventude sul-americana: trabalho e educação dominam os receios quanto ao futuro. No primeiro aspecto, destacam-se os temores com relação ao alto índice de desemprego juvenil e à renda decrescente para vários segmentos populacionais, sobretudo pessoas com pouca qualificação profissional. No segundo, as inseguranças refletem os custos educacionais elevados, em particular na universidade.
Obama escreveu um livro que, em grande medida, é sua plataforma de campanha, e lhe deu o título de “A Audácia da Esperança”. De fato, o desejo de dias melhores é uma demanda intensa nos Estados Unidos de hoje, mas com freqüência o sentimento é refreado pelo medo de mudanças. A opinião pública conservadora tem ironizado o apoio juvenil a Obama, comparando-o à Juventude Hitlerista ou a grupos paramilitares. Organizações de extrema-direita, como bandos racistas, divulgaram vídeos ameaçando-o de morte, e os gritos de ódio foram dados por jovens. Entre esses sentimentos contraditórios, o eleitorado juvenil terá papel importante na definição do futuro dos Estados Unidos.