quinta-feira, 30 de outubro de 2008
Uma Nova Geração Política: a juventude dos EUA e Obama
Reproduzo meu artigo publicado nesta quinta no site “Juventudes Sul-Americanas”:
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Uma das características que mais chamaram a atenção na campanha presidencial dos Estados Unidos foi o apoio da juventude a Barack Obama. As pesquisas indicam 60% do voto juvenil (18-29 anos) para o candidato, contra 30% para seu rival John McCain. O eleitorado jovem é formado por 44 milhões de pessoas, cerca de 25% do total.
Nas eleições de 2000, o Partido Democrata teve 2% a mais dos votos dessa faixa etária do que o Republicano. Em 2004, 9%. Contudo, a preferência da juventude por Obama não significa a adesão juvenil a uma doutrina partidária ou a um líder. É antes o reflexo da nova geração cidadã, que se tornou ativa politicamente em meio às tragédias dos atentados de 11 de setembro de 2001, das guerras no Iraque e no Afeganistão, da crise econômica e de uma série de escândalos envolvendo o governo Bush.
Ceticismo diante da tradição
A geração atual tem sido chamada de “Milênio”, “Y” ou “Pós-Tudo”, e seria marcada pelo ceticismo diante da liderança política tradicional. Nas sondagens de opinião, quase 80% da juventude dos Estados Unidos afirma que não apóia nenhum dos dois principais partidos ou que gostaria de ver alternativas. Desde sua campanha para o Senado, em 2004, Obama tem demonstrado cuidado em evitar a polarização, defendendo a construção de novos consensos, que ultrapassem a divisão partidária, e pregando a negociação entre grupos adversários, tanto nos Estados Unidos quanto entre o país e nações estrangeiras hostis.
O candidato também conquistou apoio juvenil por sua ênfase em temas ligados à qualidade de vida, em particular a agenda de meio ambiente, mudança do clima e energias alternativas ao petróleo. A juventude tem manifestado muito mais interesse por esses assuntos do que as pessoas mais velhas, que se mostram cautelosas em abandonar os modelos tradicionais.
O apelo à “mudança” - principal lema da campanha de Obama - não deve ser subestimado. Nos últimos 20 anos, a Casa Branca foi ocupada por presidentes que pertenciam às famílias Bush ou Clinton. A maior parte do eleitorado jovem viveu apenas esse período e a vontade de renovação foi um dos fatores que explicou a derrota de Hilary Clinton nas primárias democratas. Ela teve apenas 30% dos votos juvenis, pois, em grande medida, as pessoas nessa faixa etária a identificaram com o status quo conservador, e buscaram algo novo e diferente.
Comparecimento crescente, mas ainda baixo
Obama foi bem-sucedido não só em conquistar o apoio do eleitorado jovem, mas também em fazer com que rapazes e moças fossem às urnas. Nos Estados Unidos o voto é facultativo, e só é permitido para maiores de 18 anos. Desde a década de 1970, a taxa de comparecimento eleitoral juvenil é quase sempre menor que 50%, enquanto a adulta fica acima de 65%.
Os índices começaram a subir – para todas as faixas etárias – a partir de meados desta década. Nas primárias de 2008, houve o dobro de participação juvenil do que em 2000. Para além do entusiasmo com Obama, o aumento decorre também da ênfase que as campanhas de todos os partidos têm dado às novas tecnologias de informação, usando amplamente instrumentos como YouTube, sites de relacionamento como Facebook e MySpace, e mensagens enviadas por celulares. Há diversas organizações não-governamentais e movimentos sociais dedicados a estimular o eleitorado jovem.
Ainda assim, as pesquisas apontam que pouco mais da metade da juventude irá às urnas em 4 de novembro, o que mostra grande nível de apatia e desinteresse com a política partidária, mesmo diante de uma disputa tão acirrada e com questões tão importantes em jogo. No atual ritmo de crescimento populacional dos Estados Unidos, em 2015, um terço de todos os votos será de pessoas com menos de 30 anos. Como esses rapazes e moças se comportarão com relação aos principais temas da agenda pública?
Uma nova agenda política
O legado com os quais a juventude dos Estados Unidos precisa se defrontar é difícil. Nos últimos trinta anos, as desigualdades sociais aumentaram muito, colocando o país com o pior índice nessa área entre as nações desenvolvidas. A qualidade e disponibilidade de diversos serviços públicos, como educação e saúde, diminuiu.
A nova geração é mais diversa do ponto de vista étnico. Cerca de 1/3 é de ascendência africana, latino-americana ou asiática. Sua visão política é mais favorável às políticas de ação afirmativa e ao auxílio à imigração. Também tem posições mais tolerantes com relação ao homossexualismo, inclusive ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. De modo geral, favorecem maior participação do Estado na vida cotidiana.
Os problemas que os preocupam são familiares aos da juventude sul-americana: trabalho e educação dominam os receios quanto ao futuro. No primeiro aspecto, destacam-se os temores com relação ao alto índice de desemprego juvenil e à renda decrescente para vários segmentos populacionais, sobretudo pessoas com pouca qualificação profissional. No segundo, as inseguranças refletem os custos educacionais elevados, em particular na universidade.
Obama escreveu um livro que, em grande medida, é sua plataforma de campanha, e lhe deu o título de “A Audácia da Esperança”. De fato, o desejo de dias melhores é uma demanda intensa nos Estados Unidos de hoje, mas com freqüência o sentimento é refreado pelo medo de mudanças. A opinião pública conservadora tem ironizado o apoio juvenil a Obama, comparando-o à Juventude Hitlerista ou a grupos paramilitares. Organizações de extrema-direita, como bandos racistas, divulgaram vídeos ameaçando-o de morte, e os gritos de ódio foram dados por jovens. Entre esses sentimentos contraditórios, o eleitorado juvenil terá papel importante na definição do futuro dos Estados Unidos.
quarta-feira, 29 de outubro de 2008
Maradona e os Fundos de Pensão Argentinos (Tudo faz Sentido)
Homem vestido de padre, num bar: “Ele foi crucificado pelos seus próprios seguidores!”
Chega um amigo: “Ok, basta de religião.”
Homem: “Mas eu estou falando sobre Maradona!”
Do filme argentino “O Filho da Noiva”
Não sei se a nomeação de Maradona para técnico da seleção argentina será boa para a equipe nacional, mas com certeza renderá momentos emocionantes, dramáticos, engraçados e divertidos para todos os fãs de futebol. Em especial se você, como eu, acha que o estilo da era Dunga é mais adequado às propagandas de calmante do que ao esporte mais popular do planeta. Maradona é garantia de paixão em campo, sempre.
Quando eu morava na Argentina, era inevitável que amigos e conhecidos me perguntassem quem eu achava que era o maior jogador de futebol de todos os tempos: Maradona ou Pelé. O questionamento se dava no seguinte contexto:
1)Eu era o único aluno brasileiro da universidade.
2)Meus interlocutores com freqüência traziam tatuagens de Maradona. Que diabos, o ídolo tem até sua própria religião.
Ainda estou vivo, em grande medida porque elogiava Garrincha, cuja vida parece letra de tango, e é muito querido pelos argentinos. E claro, dom Diego é fascinante. Como já escrevi neste blog: “Maradona, por contraste [com Pelé], é o gênio irreverente e rebelde, amigo de Chávez e de Fidel. Mas seu talento convive com uma pulsão autodestrutiva quase incontrolável, ainda que balanceada pela capacidade de recomeçar do fundo do poço e reinventar-se. Qualquer semelhança com a história recente da Argentina não deve ser mera coincidência. “
Maradona irá compartilhar o comando da seleção com o antigo técnico da equipe campeã em 1986, Carlos Gilardo, que agora assume como “manager” (assim mesmo, em inglês). Não está clara para mim qual a esfera de responsabilidade de cada um. Os dirigentes futebolísticos argentinos declararam que Maradona será o número 1, mas me parece que está armado o cenário para uma fogueira de vaidades e problemas de coordenação entre as duas super-estrelas esportivas.
Impossível evitar a comparação com o que acontece na Casa Rosada. Os jornalistas políticos argentinos também falam sobre os riscos do “doble comando” - só que no governo nacional, em relação à presidenta Cristina Fernández e seu marido, Néstor Kirchner. Morales Solá analisa que com a sucessão de crises, o poder estaria se concentrando mais no ex-presidente. Eu acrescentaria os problemas na coalizão oficialista, como os conflitos com o vice Julio Cobos, cuja dissidência foi essencial para a derrota governista na votação sobre os impostos ao agronegócio.
Na semana passada a presidenta Cristina determinou a estatização dos fundos de pensão argentinos, que haviam sido criados por seu antecessor Carlos Menem. A cobertura da imprensa tem sido tão hostil à decisão que não consigo entender com clareza as razões do governo. Talvez a Economist tenha razão e se trate de um movimento para usar os US$30 bilhões dos fundos para pagar o serviço da dívida pública, em cenário de problemas fiscais e queda nos preços das commodities. Um olhar mais simpático ao oficialismo poderia afirmar que Cristina aproveita a onda mundial de nacionalizações para reverter a privatização da previdência implementada por Menem, que muitos no peronismo nunca consideraram boa idéia. Em todo caso, a estatização precisa ser aprovada pelo Congresso, o que será batalha dura.
Os fundos são donos de cerca de 25% das ações na bolsa argentina, que despencou em reação à nacionalização. O risco-país também subiu muito. A Casa Rosada resolveu se desfazer dos investimentos que os fundos tinham no Brasil (coisa pouca, mas ainda assim...) e sugeriu que o Mercosul poderia aumentar as tarifas comerciais por conta da crise. Com essa conjuntura, mais Maradona, não faltará emoção vinda do país vizinho.
A foto que abre o post vem do bem-humorado comercial de guaraná no qual Maradona tem um pesadelo (após uma overdose, mas calma, era de refrigerante!) e sonha que está jogando pela seleção brasileira. Muita gente não gostou na Argentina, mas achei um belo exemplo da capacidade de Dom Diego de rir de si mesmo. Pelé só faz humor involuntário, como quando estrela anúncio de remédio contra impotência.
terça-feira, 28 de outubro de 2008
Um Novo Bretton Woods?
O premiê britânico Gordon Brown tem ressaltado a necessidade de redesenhar as organizações econômicas internacionais, adequando-as à interdependência global, aos enormes mercados financeiros e à ascensão da China e da Índia. Em suma, ao século XXI. Os demais chefes de governo europeus se juntaram ao coro e os Estados Unidos convocaram cúpula financeira para o dia 15 de novembro, e convidaram diversos países emergentes, inclusive o Brasil.
Há pouco mais de 60 anos houve um conclave parecido num elegante hotel de montanha na cidade de Bretton Woods, nos EUA. Era abril de 1944 e a Segunda Guerra Mundial estava em curso. Os nazistas já haviam sofrido derrotas no front soviético em Stalingrado e Kursk, e o Japão vira sua frota naval dizimada em Midway, mas ainda faltava o desembarque aliado na Normandia. Contudo, os negociadores americanos e britânicos, em conjunto com representantes de outros 42 países, desenharam na conferência o mapa da economia internacional para o pós-guerra. O resultado foram as instituições do Banco Mundial, FMI e as bases do GATT – a estrutura que amparou e estimulou o crescimento global das décadas de 1950-1960.
Bretton Woods determinou que as moedas mundiais teriam câmbio fixo com relação ao dólar, que por sua vez se lastrearia no ouro. O comércio seria liberalizado, numa série de rodadas de negociação, mas os fluxos de capital seriam submetidos a muitas restrições e controles. O arranjo funcionou bem até os anos 60, quando os Estados Unidos começaram a sentir os efeitos da competição crescente da Europa e do Japão reconstruídos, e sofreram com inflação e dívida pública decorrentes da pressão combinada da Guerra do Vietnã e dos ambiciosos programas sociais do presidente Lyndon Johnson.
Nixon mandou o sistema pelos ares em 1971, cancelando a vinculação do dólar com o ouro. O câmbio passou muito volátil, situação que persiste até hoje. Seus sucessores na Casa Branca desregulamentaram o mercado financeiro e apostaram no setor para superar a crise de baixo desempenho das manufaturas americanas.
As instituições de Bretton Woods têm sido muito criticadas por sua pífia atuação em crises recentes, em particular a dos mercados emergentes em 1997-2002. Afinal, são organizações que podem disponibilizar alguns bilhões de dólares, quantia pouco relevante no contexto de circuitos financeiros que mobilizam mais de um trilhão, diariamente. Nas turbulências atuais, o FMI parece ter encontrado uma função: auxiliar Ucrânia e Hungria, cuja situação séria pode arrastar toda a Europa Oriental. Pelo menos os problemas dos antigos países comunistas irão distrair o diretor do Fundo, que se recupera de um escândalo sexual envolvendo uma subordinada chamada Piroska.
Quais seriam as novas funções/instituições de um Bretton Woods redesenhado? Há consenso de que são necessários melhores mecanismos de regulação e transparência. Isso significaria organizações internacionais capazes de desempenhar papéis análogos ao da Securities and Exchange Commission que monitora as bolsas dos Estados Unidos, ou ao Comitê da Basiléia para Supervisão Bancária, que opera no BIS, o Banco Central dos Bancos Centrais.
Talvez possam funcionar como uma espécie de Estado-Maior para a coordenação das respostas dos governos à crise. Elas têm sido semelhantes: cortes na taxa de juros, aumento da liquidez e do crédito, nacionalizações/compra de ativos em bancos e corretoras, garantias a depósitos bancários e veto a determinadas operações financeiras, como short selling.
Possibilidades interessantes. Aguardemos.
Dois mapas ilustram o post. O primeiro representa a distribuição da riqueza mundial em 1900. O segundo mostra as projeções para 2015. O mundo mudou. Notem como Ásia e América Latina aumentam em importância, ao passo que diminui a influência da Europa. Fonte: o excelente Atlas of the Real World.
segunda-feira, 27 de outubro de 2008
Brasileiros no Paraguai
“Gostaria de esclarecer que sou brasileiro, mas não planto soja”, disse aos camponeses paraguaios. Eles riram. Eu tinha acompanhado uma oficina de jovens trabalhadores rurais na cidade de Hernandarias, e os organizadores me pediram para palestrar no fim do evento. Falei sobre as tensões que ocorrem na região entre as empresas do agronegócio e os pequenos agricultores – brasileiros e paraguaios. Conflitos envolvendo capangas, intimidação para venda de terras, contaminação da água devido ao uso intensivo de agrotóxicos.... A conversa foi boa e depois alguns rapazes vieram falar comigo se desculpando por declarações que equiparavam brasileiros a sojeiros, e me contando que tinham muitos amigos nascidos aqui, jogavam futebol juntos etc.
A América do Sul é bastante urbanizada, mas o Paraguai é exceção. Cerca de 40% de sua população vive na zona rural. A maioria dessas pessoas é de camponeses sem-terra, ou proprietários de minifúndios, que tocaram grandes movimentos sociais, como as Ligas Agrárias que enfrentaram a ditadura Stroessner (vejam o belo vídeo abaixo) e a onda de ocupações que ocorreu em meio ao colapso do regime autoritário. As tensões se concentram na região leste do país, fronteira com o Brasil, onde se localizam as áreas mais dinâmicas da agricultura comercial de exportação, da soja e do algodão.
Entre 300/500 mil brasileiros vivem no Paraguai. A migração começou na década de 1970, composta sobretudo agricultores familiares do sul do Brasil, oriundos de pequenas propriedades que não conseguiam sustentar muitas pessoas. Receberam incentivos da ditadura Stroessner, compraram terras baratas e prosperaram como fazendeiros, comerciantes e até políticos, no nível municipal. A segunda onda migratória acompanhou a expansão do agronegócio. São gerentes, técnicos e especialistas que se instalaram para administrar as operações das multinacionais no local - e às vezes entra em conflito com a primeira. É uma comunidade heterogênea e com relações bastante variadas com os paraguaios.
O presidente Lugo trabalhou vários anos com os sem-terra, como padre. Mas o governante tem arco de alianças que inclui vários partidos de direita e a oposição conservadora dos colorados tem maioria no Congresso e nos governos provinciais. Os camponeses sabem que suas demandas por reforma agrária correm sério risco de fracassar e pressionam fortemente Lugo. Nos últimos dias, cercaram fazendas, sobretudo aquelas pertencente a estrangeiros. Invadiram algumas, em outras ocasiões foram detidos pela polícia.
Os conflitos entre brasileiros e paraguaios misturam economia, controle dos recursos naturais, meio ambiente, xenofobia e racismo. Pesa a história de violência entre os dois países. No Brasil, quase não se fala da Guerra do Paraguai ou do apoio do país à ditadura Stroessner (que atravessou do democrático JK até o regime militar) mas na nação vizinha os dois temas geram ressentimento e frustração. Os paraguaios têm forte sentimento nacionalista, amparado no idioma e cultura guarani. Difícil conciliar esse orgulho com uma situação que a muitos parece humilhante, de ver a parte mais rica da economia sob controle do povo estrangeiro que os derrotou militarmente. E que às vezes demonstram sensibilidade cultural ímpar... Vejam por exemplo o brasileiro Tranquilo Favero, o maior plantador de soja do Paraguai: “Sou criticado publicamente por não falar guarani, mesmo estando aqui há 40 anos. Falo para os meus netos: aprendam língua de povo desenvolvido.“
Impossível prever os desdobramentos. O cenário no Paraguai reflete de modo mais intenso e conflituoso o que tem ocorrido também em outros países, como Bolívia, Equador e Uruguai. Como conciliar o projeto de integração com as assimetrias de poder entre o Brasil e os vizinhos?
Foto: Ponte da Amizade, entre Brasil e Paraguai.
sexta-feira, 24 de outubro de 2008
Elementos do Plano de Defesa do Brasil
Quando o Brasil voltou a ser uma democracia, a elite política retirou da agenda o debate sobre segurança nacional, que estava muito associado à ditadura. Além disso, a escassez de recursos nas décadas de 1980/1990 não estimulava investimentos nas Forças Armadas. Isso começou a mudar. Foram elaborados dois grandes conjuntos de diretrizes dessa política, por FHC (1996) e Lula (2005). Mas ainda genéricos, sem detalhes. Agora está para ser divulgado o Plano Estratégico de Defesa, que deverá explicar como serão alcançados os objetivos definidos nos documentos anteriores. Vem em conjunto com o aumento de 50% no orçamento militar.
O Plano deveria ter sido lançado no Dia da Independência, mas houve atrasos decorrentes de pontos polêmicos e o texto deverá ser apresentado ao público em duas semanas. Já é possível ter acesso ao essencial de seu conteúdo, a partir de artigo do ministro da Defesa, Nelson Jobim e de reportagem na revista “Desafios do Desenvolvimento”, editada pelo Ipea, que se concentra na outra autoridade responsável pelo Plano, o ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger (acima, os dois com o presidente Lula).
O Plano foi construído como um tripé: 1) Reformulação das Forças Armadas; 2) Vínculos entre Defesa e desenvolvimento industrial, científico e tecnológico; 3) Serviço militar obrigatório.
Comecemos pelo tradicional, o ponto 2. Desde a Primeira Guerra Mundial (ou mesmo antes, com os positivistas do Império) as Forças Armadas se preocupam com os temas do desenvolvimento e as iniciativas na área se multiplicaram após a Revolução de 1930, com intensa participação militar em setores como petróleo, energia nuclear, telecomunicações, aviação etc. O planejamento de expandir a Marinha e modernizar a Força Aérea oferece oportunidades excelentes para a pesquisa em ciência e tecnologia e fortalecimento da indústria naval e da Embraer.
O serviço militar obrigatório é controverso. Gostaria que fosse extinto. A tendência internacional são Forças Armadas formadas por voluntários, alistados por períodos longos, pois o soldado atual necessita de conhecimentos avançados, que dificilmente um recruta aprende em um ano. Mas as autoridades debatem expandi-lo para atrair jovens de classe média e melhor formação educacional. A conferir.
No primeiro ponto, Jobim elenca hipóteses de emprego militar que abordam segurança pública, guerrilha colombiana e as crises andinas, missões da ONU e o velho fantasma dos Estados Unidos na Amazônia - válido como exercício teórico, mas que a meu ver ganhou dimensão exagerada na reflexão brasileira.
O Plano trata bastante da América do Sul. O Brasil já teve política externa belicosa na região, sobretudo na Bacia do Rio da Prata, entre 1820-1870. Conseqüência de situação explosiva, de fronteiras ainda não definidas. O pacifismo nas relações exteriores se consolidou com a República, com as negociações de Rio Branco, que eliminou as disputas territoriais do país – para sempre seja louvado! Nesse contexto, Forças Armadas servem como instrumento de dissuasão. Lembrete do que pode ocorrer quando o diálogo fracassa – acima, a recente manobra em Santa Catarina e no Paraná, em que tropas se deslocaram até Foz do Iguaçu, em exercício ligado à situação tensa dos brasileiros proprietários de terras no Paraguai.
O modelo funcionou bem. Apesar de tensões ocasionais com a Argentina, o Brasil do século XX evitou as guerras, ao contrário de Peru, Equador, Bolívia, Paraguai e, evidentemente, da própria Argentina, com a tragédia das Malvinas.
Não acredito que os problemas atuais revertam o quadro, mas exigem um esforço de reflexão das autoridades brasileiras. Daí a importância de criar novas instituições, como o Conselho Sul-Americano de Defesa, para estimular o diálogo e colocar algodão entre os instáveis cristais da região.
quinta-feira, 23 de outubro de 2008
A Batalha pelos Hidrocarbonetos
Uma das conseqüências da crise econômica global é a diminuição na demanda por petróleo, com a conseqüente queda nos preços. Como se pode ver pelo gráfico acima, o valor do barril vinha crescendo quase sem interrupção desde 1998, e foi para a estratosfera depois dos atentados de 11 de setembro, dos conflitos entre Chávez e a estatal venezuelana PDVSA e da invasão do Iraque. De menos de US$20, saltou para quase US$150 em julho deste ano. Agora despencou de forma acelerada e está por volta de US$65.
Para enfrentar o novo cenário, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), convocou cúpula de emergência, que começa nesta sexta, em Viena. Os líderes da instituição querem reduzir a produção de petróleo, para tentar conter a queda dos preços. O plano mais ambicioso significaria algo como um Kuwait a menos disponível para o mercado, mas análises moderadas afirmam que o acordo deve ficar em metade disso.
A Opep está dividida, controla apenas 40% da produção mundial e tem longa e problemática histórica com esse tipo de movimento de diminuição de extração petrolífera. Os incentivos para os países trapacearem e tentarem boicotar a medida são fortes e isso ocorreu com freqüência em crises do passado. Desta vez, a principal pedra no sapato da organização é a Rússia.
O gráfico abaixo mostra as maiores reservas de petróleo do planeta, com o mapa de cada país redesenhado para refletir sua disponibilidade desse recurso natural. No entanto, a Rússia é a segunda maior produtora mundial, atrás apenas da Arábia Saudita. Isso porque o governo russo vem torrando suas reservas num ritmo suicida – alguns especialistas acreditam que elas poderão estar exauridas em 20 anos.
A Rússia não é membro da Opep, mas tem um diálogo de alto nível político com a organização, e nos últimos anos houve um intenso processo de negociações entre Moscou e as principais capitais do mundo árabe, que pressionam os russos para diminuir sua produção. Não está claro para mim se isso irá ocorrer.
As razões para isso é que Rússia, Venezuela e Irã são mais dependentes do petróleo para equilibrar seus orçamentos do que os países árabes. Estes aprenderam a duras penas com as crises anteriores e diversificaram seus investimentos, principalmente através do mecanismo dos Fundos de Riqueza Soberana. A estimativa é que podem gerir seus Estados sem problemas mesmo que o barril caia a US$40. Já o Irã precisa de US$55, a Rússia de US$70 e Venezuela de US$90. Ou pelo menos, são os valores que incluíram em suas previsões orçamentárias.
Esses países têm tentado lidar com a vulnerabilidade diante do petróleo investindo em outro hidrocarboneto. Ontem Rússia, Irã e Catar anunciaram a criação de uma espécie de “Opep do Gás”, que controlará cerca de 60% das reservas mundiais e responderá pelo abastecimento de boa parte da Europa e da Ásia Meridional. Eventualmente, a Troika poderia ser expandida e incluir outros grandes produtores como Venezuela, Nigéria, Argélia, Egito, Indonésia e Líbia. A União Européia não gostou nada e já declarou que será necessário rever sua política energética para evitar a dependência de uma só fonte. Todos temem virar reféns da nova organização.
quarta-feira, 22 de outubro de 2008
Na Prisão com Mandela
No sábado dei aula sobre o uso do cinema para o estudo das relações internacionais. Entre outros pontos, comentei que os filmes sobre a África tratavam menos da realidade do continente do que dos esforços de algum branco bem-intencionado (nativo ou estrangeiro) para melhorar a qualidade de vida dos negros. Disse aos alunos que era uma perspectiva muito limitada, e que bastava a comparação com a produção artística e intelectual dos próprios negros africanos para constatar esses problemas. Bom exemplo é contrastar o filme “Mandela – a luta pela liberdade” (Goodbye Bafana, no título original) do diretor dinamarquês Bille August com a autobiografia do ex-presidente, “Long Walk to Freedom”.
O filme é baseado em fatos reais e conta a amizade entre Mandela e um de seus carcereiros, James Gregory. O guarda foi o censor responsável pela correspondência dos líderes do Congresso Nacional Africano presos na ilha Robben (foto abaixo), um antigo leprosário próximo à Cidade do Cabo que virou a prisão de segurança máxima do apartheid. Com o tempo, Gregory passou a admirar Mandela, tornou-se seu amigo e acabou se convencendo da justiça de sua causa. Teve papel importante em garantir a segurança de Mandela no fim da década de 1980, quando suas condições de detenção foram relaxadas e ele negociou com o governo a transição do apartheid para a democracia.
É uma bela histórica, rica em relações humanas. A crítica brasileira detestou o filme, mas a meu ver os comentários foram injustos. É verdade que o roteiro tem problemas, e que as mudanças de atitude dos personagens ocorrem muito rapidamente. As atuações também poderiam ser melhores. Mas, para além de seus defeitos, é um retrato poético de um período essencial na história da África do Sul, cujos detalhes são pouco conhecidos no Brasil.
Minha objeção principal ao filme é que o foco é no carcereiro de Mandela. Assim como no longa sobre Steve Biko, que comentei recentemente no blog, os roteiristas europeus e americanos estão mais interessados nos dramas de consciência dos brancos do que na luta dos negros contra o apartheid. E com freqüência, este segundo aspecto é bem mais interessante.
Gregory, o carcereiro de Mandela, é retratado como um racista que aos poucos muda de opinião, em função do carisma de seu prisioneiro e de suas próprias experiências de uma infância passada na zona rural xhosa, próxima ao local onde nasceu Mandela. Essa é uma licença poética um tanto desnecessária. Em suas memórias, o ex-presidente cita Gregory algumas vezes, sempre com admiração e carinho, e ressalta que ele se destacava desde o início dos outros guardas, por sua gentileza e educação. Mandela elogia especialmente o respeito que Gregory devotou a Winnie, sua esposa e na cordialidade com que a recebia durante suas visitas às prisões.
O filme se concentra nos problemas familiares de Gregory, que vive uma rotina de classe média baixa e sonha em enviar os filhos à universidade (que eram muito caras durante o apartheid), embora mal tenha dinheiro para as despesas essenciais. Sua esposa teme que a amizade com Mandela acabe prejudicando sua carreira.
É um enfoque válido, mas não entendi por que deixar de lado o universo dos presos políticos, que levavam uma existência bastante movimentada na ilha Robben. Mandela descreve em detalhes as negociações e mobilizações incessantes que ele e os demais membros da liderança do Congresso Nacional Africano conduziram com os sucessivos diretores da prisão para melhorar as condições de vida. Aos poucos conquistaram vitórias expressivas, como a instalação de cursos educacionais – eram tantos que o lugar ficou conhecido como “a universidade”.
Outro ponto que valeria ser explorado é a relação entre a velha guarda da resistência ao apartheid, como o próprio Mandela (preso em 1962) e a nova geração que começou a ser detida após a rebelião de Soweto (1976), já influenciada pelo movimento da consciência negra de Biko. As discordâncias eram profundas e o regime do apartheid fez tudo para estimulá-las. Enfim, tudo isso está muítissimo bem narrado na autobiografia de Mandela, um livro extraordinário que é um dos meus favoritos.
A ilha Robben é hoje um ponto turístico muito visitado e com freqüência ex-prisioneiros e ex-guardas convivem como guias, num exemplo notável de conciliação política, dificilmente observado em outros países. Eu teria encerrado o filme com uma cena que mostrasse um encontro desse tipo.
terça-feira, 21 de outubro de 2008
A Rússia Pós-Soviética
"Terra Negra - uma viagem pela Rússia pós-comunista", Andrew Meier (Ed. Globo)
"A Era dos Assassinos - a nova KGB e o fênomeno Vladmir Putin", Yuri Felshtinsky (Ed. Record)
"Rússia - o ressurgimento da grande potência", Roberto Colin (Ed. Letras Brasileiras)
"A morte das formas contemporâneas da ordem social precisa alegrar, e não perturbar a alma. Mas o que dá medo é que o mundo que se vai deixa para trás não um herdeiro, mas uma viúva grávida."
Alexander Herzen, pai do socialismo russo, em meados do século XIX
Um dos temas que mais têm me interessado nas relações internacionais é a ascensão dos BRICs. E dos membros que formam a sigla, o país sobre o qual menos conheço é a Rússia. Ou melhor: li muito a respeito do império czarista e do século soviético. Estou no escuro quando o assunto é a situação do país após o comunismo. Por isso mergulhei em lançamentos recentes, listados acima.
A década de 1990 foi a transição de choque para o capitalismo. Na farra das privatizações fraudulentas, o resultado foi a ascensão de um grupo de altos funcionários soviéticos e/ou chefes de máfias que se tornaram empresários milionários na base de fraudes e negociataso que os russos chamam de "oligarcas". Eles já existiam desde os dias difíceis da era Brejnev, mas deram as cartas no país durante o governo Ieltsin, até a grave crise econômica de 1998.
Com Putin, tiveram licença para continuar a ganhar dinheiro, mas foram excluídos do jogo político e aqueles que se opuseram ao Kremlin foram perseguidos, presos, assassinados ou exilados. O Estado se (re)fortaleceu e ganhou destaque uma rede de funcionários das Forças Armadas e dos serviços de segurança e inteligência, que retomaram a política externa belicosa no Cáucaso e no Báltico.
Internamente, a frágil democracia russa tem sofrido em suas mãos. Perseguiram opositores, tomaram o controle da mídia privada e nomearam funcionários do Kremlin para substituir políticos eleitos, tanto nas províncias como no parlamento. Ainda assim, Putin e os seus têm significativo apoio popular, pois a população ansiava por um mínimo de lei e ordem, após anos de caos e violência, e a classe média queria crescimento após a destruição de suas economias na hiperinflação de meados dos anos 90.
Dos livros que citei acima, o que melhor captura esse período turbulento de 20 anos é o de Meier, uma obra-prima sobre o cotidiano do povo russo ao longo dessas décadas difíceis. O autor é um brilhante jornalista americano que escreveu para Time, Washington Post, New York Times e foi comentarista na BBC e na CNN. Tem um profundo conhecimento sobre o país e um amor autêntico por sua cultura e sua gente.
Seu livro é soberbo: uma viagem pelos quatro cantos da Rússia, organizada segundo os principais marcos geográficos: oeste (São Peterburgo e o movimento democrático na cidade); leste (a Ilha de Sakhalina, a indústria do petróleo e as tensões entre Rússia, China e Japão); norte (um cruzeiro pela Sibéria a um antigo campo de concentração de Stalin, num grande centro de mineração) e sul (o Cáucaso e as duas guerras na Chechênia - a foto abaixo retrata as ruínas de Grozny, capital chechena). Há dois capítulos especiais sobre Moscou e os hábitos do poder na capital.
Meier entrevistou todo mundo: veteranos de guerra, ex-prisioneiros de Stálin, escritores alternativos, oligarcas, gangsters, trabalhadores, empresários. Com freqüência, traça retratos humanos inesquecíveis, meu favorito é o da sobrevivente do cerco dos nazistas a Leningrado, na Segunda Guerra Mundial, que lhe fala sobre seu trabalho numa padaria, durante aquele conflito. As descrições sobre o Cáucaso são particularmente boas e ele aborda em detalhes as circunstâncias atuais - a luta para preservar a integridade territorial da Federação Russa, um mosaico de dezenas de etnias, os choques entre Estado e Islã.
O historiador russo Yuri Felshtinsky é duas vezes dissidente. Trocou a URSS pelos EUA na década de 1970 e na era pós-comunista se destacou como critico feroz de Putin. É um ofício perigoso. Ele escreveu um livro com Alexander Litvinenko, um ex-espião russo que acusou o presidente de diversos crimes. Litvinenko fugiu para o Reino Unido, mas foi assassinado por lá, com veneno radioativo. Outros inimigos de Putin tiveram destino semelhante, como a jornalista investigativa Anna Politkovskaya.
O livro de Felshtinsky é informativo, mas duro, difícil de ler. Basicamente, é um apanhado de denúncias contra Ieltsin, Putin e seus aliados. O argumento do autor é que Putin foi colocado no poder pelos serviços de segurança e de inteligência, para gerenciar um gigantesco esquema de compadrio e loteamento do Estado e das empresas privadas. Visão bem distinta é a oferecida pelo diplomata brasileiro Roberto Colin, que examina a ascensão de Putin muito mais em função de sua habilidade em fornecer segurança e estabilidade a uma população ansiosa por esses dois bens públicos.
De fato, há problemas na tese de Felshtinsky. Um deles é que a carreira de Putin na KGB foi modesta. Ele serviu em Dresden, uma cidade provinciana da Alemanha Oriental, quando os melhores agentes eram enviados para os EUA e a Europa Ocidental. Seu ponto de virada ocorreu quando era tenente-coronel e estava em Leningrado, onde se tornou um dos principais assessores do prefeito Anatoli Sobchak, que à época era um dos mais importantes líderes democráticos da URSS. De lá, Putin foi para o Kremlin, trabalhar com Ielstin, que o nomeou para dirigir o Serviço Federal de Segurança (FSB), uma das organizações na qual a KGB se fragmentou. Ficou apenas um ano no cargo, foi promovido a coronel, e o presidente inesperadamente o nomeou primeiro-ministro, e depois fez dele seu sucessor.
Putin não é bom orador, nem carismático, mas é conhecido por sua capacidade como administrador. Seu estilo sóbrio, militar, é bastante admirado na Rússia. Pessoalmente, acho que ele tem se mostrado um político hábil, conseguindo navegar entre o saudosismo da grandeza perdida da URSS e o repúdio ao pior daquele passado. O que resultou em frases como: "Quem não lamenta o desmoronamento da União Soviética não tem coração, mas quem deseja a volta dela não tem cabeça."
Para além de suas qualidades pessoais, Putin foi beneficiado pela conjuntura econômica que multiplicou o preço do petróleo - a Rússia é a segunda maior produtora mundial, só está atrás da Arábia Saudita. O barril do ouro negro chegou a valer US$140, agora caiu abaixo de US$70. Cada dólar de queda representa menos US$1 bilhão no orçamento russo. Como o país liderá com a crise?
Foto que abre o post: monumento a vítimas de um dos quase 500 campos de concentração de Stalin, na cidade de Magadan, famosa pelas minas de ouro.
segunda-feira, 20 de outubro de 2008
À Procura de Gandhi
Ontem assisti a mais um excelente documentário da série “Por que democracia?” - espero que as produções sejam lançadas em conjunto, numa caixa de DVDs ou algo assim. Desta vez o tema foram as desigualdades sociais na Índia, no filme “À Procura de Gandhi”, do cineasta Lalit Vachani.
O diretor refez o percurso de mais de trezentos quilômetros da “Marcha do Sal”, que Gandhi havia conduzido em 1930 para protestar contra o monopólio sobre o produto exercido pela Coroa britânica. A manifestação foi um marco do movimento pela independência da Índia. Vachani percorre o caminho e vai conversando com as pessoas sobre Gandhi, constatando que as idéias de tolerância e não-violência do líder foram esquecidas, ou passaram a ser consideradas incômodas, e em seu lugar surgiu um amálgama de consumismo, individualismo exacerbado (com profunda desconfiança do Estado e dos outros cidadãos) e fundamentalismo religioso hindu e muçulmano. Mas também afloraram novas mobilizações sociais, em particular entre os mais pobres.
A viagem começa em Gujarat, a província natal de Gandhi. A região é governada por Narendra Modi, que incorporou o discurso da modernização e de transformar Ahmedabad, a capital provincial, numa “cidade global”. Ao mesmo tempo estimula o fundamentalismo hindu como maneira de se manter popular. Em sua administração a economia cresceu, mas também ocorreram uma terrível onda de violência religiosa, na qual pelo menos mil muçulmanos foram assassinados e vários outros tiveram suas casas destruídas. A polícia ficou de braços cruzados, enquanto as atrocidades aconteciam.
O cineasta visita alguns pontos célebres da marcha, como a ponte Ellis, onde Gandhi fez um famoso discurso. Agora existe uma favela embaixo da ponte, que está ameaçada de ser despejada pelo governador Modi.
As contradições da democracia indiana também estão presentes na zona rural – não poderia ser de outro modo num país em que mais de 2/3 da população depende do campo para sobreviver. Vachani atravessa as pequenas aldeias por onde Gandhi passou e descobre que os locais onde ele se hospedou foram abandonados ou destruídos, e que muitas de suas estátuas estão trancadas ou escondidas. O momento mais impressionante é a conversa que ele tem com um homem muito idoso, que participou da marcha do sal. Embora ele fale com respeito dos ideais de pacificismo, também mergulha numa diatribe violenta contra os muçulmanos.
Contudo, Vachani encontra igualmente sinais de progresso e melhoria na Índia. A nova riqueza material é palpável, com uma ampla classe média aproveitando os frutos da tecnologia e as maravilhas do consumo.
Ele também se impressiona com a força do movimento dos Dalits, as pessoas que estão de fora do sistema de castas e ocupam a posição social mais baixa na sociedade indiana. Gandhi os chamava de Harijan, os Filhos de Deus, e condenava a discriminação contra eles – posição endossada na Constituição da Índia, que criou programas de ação afirmativa. Hoje o termo Harijan é considerado paternalista e pejorativo, assim como o mais conhecido “intocáveis” e a expressão mais usada é “dalit”, que significa algo como “oprimido”. O cineasta conversa com os ativistas, inclusive um que foi eleito prefeito de seu vilarejo. Naturalmente, o racismo persiste e o ódio é bastante explícito nas entrevistas do filme.
Dica para quem se interessa por Índia e quer conferir uma perspectiva brasileira sobre o país: visitem o sítio do Sergio Leo, que começou a postar sobre sua recentíssima viagem por essa nação.
sexta-feira, 17 de outubro de 2008
A Crise Financeira e a América Latina
A ONG em que trabalho publicou um especial sobre a crise financeira, no qual contribuo com um pequeno artigo sobre os impactos das turbulências globais neste continente. Reproduzo o texto abaixo:
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A crise financeira que se originou no mercado de empréstimos imobiliários dos Estados Unidos se espalhou rapidamente para muitos dos principais bancos e corretoras daquele país e das nações da Europa. À medida que aumentam as tensões nas bolsas de valores e nas operações de câmbio, cresce a expectativa sobre as conseqüências para a América Latina. Para tentar responder à questão, é preciso analisar as diferentes maneiras pelas quais os membros da região se inserem na economia global. Os países mais vulneráveis são aqueles que dependem primordialmente dos Estados Unidos e/ou da exportação de poucos produtos primários.
Principais riscos
No primeiro grupo, destacam-se o México e as nações da América Central e Caribe. Um grande percentual de seu comércio exterior – em alguns casos, mais de 90% - se dá com os Estados Unidos. A relação foi aprofundada com a assinatura de acordos de livre comércio como o Nafta (em 1994) e o Cafta (2005), marcos da aposta em crescer pela vinculação à economia do vizinho do norte. Com a profunda crise pela qual passa esse país, a tendência é que diminua a demanda pelos produtos mexicanos e centro-americanos.
A dependência é reforçada pela imigração. Há cerca de 12 milhões de latino-americanos(as) vivendo nos Estados Unidos e a maioria é originária do México ou da América Central e Caribe, em especial El Salvador e República Dominicana. Essas pessoas enviam remessas de dinheiro para parentes e a quantia chega a dezenas de bilhões de dólares. Para muitas dessas nações, é uma fonte de recursos tão importante quanto as exportações. A crise nos Estados Unidos atingiu de maneira intensa os setores onde abunda a mão-de-obra latino-americana, como a construção civil, acarretando desemprego ou diminuição da renda, resultando em menor fluxo de remessas para suas famílias no exterior.
O segundo grupo de países vulneráveis depende da exportação de produtos primários, como petróleo, soja e cobre. Os preços dessas mercadorias havia se elevado muito nos últimos anos, mas começou a cair à medida que a crise se agravou. Os investimentos têm saído desse setor e ido para ouro e dólar. O barril petrolífero, por exemplo, atingiu o ápice de US$ 140 e depois teve seu valor reduzido para US$ 90. Isso prejudica os grandes exportadores do produto, como Venezuela, Colômbia e Equador. Problemas semelhantes afetam os países vinculados à soja (Brasil, Argentina, Paraguai) e ao cobre (Chile).
Além disso, a América Latina como um todo é afetada pelo pânico nos mercados financeiros globais, pois há reduções nos investimentos e no crédito que têm sido fatores importantes para o crescimento econômico da região. As conseqüências já foram sentidas nas quedas nas bolsas de valores e na desvalorização das moedas locais frente ao dólar.
Recursos para enfrentar a crise
Apesar dos riscos, há consenso que o impacto da crise na região será menor do que em turbulências anteriores, como as moratórias das dívidas externas (1982) ou a instabilidade financeira dos mercados emergentes (1997-2001). Nessas ocasiões, a América Latina estava no centro do problema e sofreu anos de recessão e de agravamento dos problemas sociais. Atualmente, o quadro é diferente: a crise não se originou aqui e os anos de bonança da última década deram aos governos recursos para lidar com os problemas. As autoridades dispõem de boas reservas cambiais e dinheiro em caixa para tocar ações de emergência.
Os bancos latino-americanos não investiram maciçamente nos títulos derivados do mercado imobiliário dos Estados Unidos e, portanto, não sofreram os efeitos do colapso. Simultaneamente, as empresas da região não contraíram muitos empréstimos no exterior, sendo relativamente pouco atingidas pela diminuição dessa fonte de capital.
No caso brasileiro, somente 10% do crédito das empresas nacionais vem de fora do país, e o governo reagiu diminuindo a taxa dos depósitos compulsórios ao Banco Central, o que liberou cerca de R$ 100 bilhões para as instituições financeiras disponibilizarem no mercado nacional. Além disso, setores-chave da economia foram beneficiados com pacotes de ajuda, como a indústria naval.
Outro bom exemplo de gestão é o Chile, que há anos mantém um fundo para armazenar os recursos oriundos da exportação do cobre. O dinheiro é guardado durante os bons anos e é utilizado pelo governo apenas em situações difíceis, para estimular a economia. De modo que as autoridades chilenas podem compensar a queda no preço do cobre.
Além disso, é preciso destacar o acerto da estratégia diplomática seguida pelos países do Mercosul e pelo Chile. Ao invés de apostar todas as fichas no mercado dos Estados Unidos, essas nações optaram por negociações comerciais para ampliar suas exportações a outros pólos dinâmicos da economia internacional. Principalmente China, mas também Índia, África e os intercâmbios dentro da própria América Latina. O resultado: maiores possibilidades de manobrar no cenário instável que se anuncia para o mundo.
quarta-feira, 15 de outubro de 2008
Celso Furtado e a Venezuela
Antes de outra impressão, na presença e nos modos: um grande senhor. Serena altivez, unidade de pensamento, visão global dos temas e espetacular poder dedutivo. Poliglota. (...) Apaixona-se automaticamnte pelos grandes problemas que supõem um desafio intelectual ou social e se comove diante do mais simples gesto humano que traga uma legítima carga poética.
O jornalista venezuelano Lorenzo Batallán, descrevendo o economista brasileiro Celso Furtado
“Dinheiro na mão é vendaval”
Paulinho da Viola
Meses atrás Rosa Furtado, víuva de mestre Celso, esteve na ONG em que trabalho para a exibição do documentário sobre seu marido. Contou que finalmente o arquivo do economista foi organizado, reunindo cartas, esboços e mapas do que foi um dos mais ricos itinerários intelectuais da América Latina. Ficamos entusiasmados com o potencial do tesouro. A primeira pérola a vir a público é o livro “Ensaios sobre a Venezuela: subdesenvolvimento com abundância de divisas”, que reúne dois textos a respeito da dificuldade de conciliar o boom petrolífero com a modernização do país. Vale para os venezuelanos, de ontem e hoje, mas também para o Brasil nestes tempos de pré-sal.
Os ensaios foram escritos em 1957 e 1974. Na primeira data, a Venezuela estava no fim da ditadura do general Pérez Jimenez. Furtado visitou o país como funcionário da Comissão Econômica da ONU para a América Latina e Caribe. Sua missão era realizar o diagnóstico da realidade local e preparar o estudo que serviria de base para o treinamento de técnicos governamentais. No entanto, as conclusões do economista desagradaram o ditador, que no melhor estilo caudilhista declarou o relatório “inexistente” e proibiu sua difusão. Esta é a primeira vez que ele é publicado oficialmente, embora tenha circulado de maneira informal.
Na época do segundo ensaio Furtado já havia deixado a ONU, e estava exilado na França, como professor da Sorbonne. Voltou à Venezuela a convite da equipe do presidente Carlos Andrés Pérez, que buscava conselhos sobre como administrar o manacial de dólares que seguiu para o país após o choque do petróleo de 1973.
As reflexões de Furtado são parecidas nos dois textos. Chama a atenção para a benção duvidosa do petróleo. Os lucros obtidos por sua exportação inundam a economia com tantos dólares que tornam a moeda local excessivamente valorizada, prejudicando o desempenho dos outros setores econômicos (indústria, agricultura) que só sobrevivem à custa de subsídios e proteção pesada e ineficiente. Sim, é a doença holandesa. Mas ele diagnosticou o problema antes do termo ser criado. Sua inspiração, além do trabalho de campo, foram estudos sobre o impacto da prata da América no velho império colonial espanhol.
A ditadura venezuelana usou o petróleo para promover grandes (e corruptas) obras de infra-estrutura, a democracia tentou desenvolver complexos de siderurgia e petroquímica. Furtado examina os prós e contras dessas escolhas, mas o que recomenda é a ênfase no capital humano, na criação de um sólido sistema escolar, e no incentivo à modernização da agricultura familiar, para absorver mão-de-obra e baratear os alimentos. Ele critica o modo como as ações governamentais concentraram renda em pequenos grupos empresariais.
Nenhum governo venezuelano lidou a contento com o presente do petróleo. Chávez tampouco. Verdade que investiu em saúde e educação, mas falhou em combater pobreza e desigualdades, e em diversificar a base produtiva do país. O máximo que conseguiu foi ampliar as origens das importações, o que favoreceu Brasil e China. Segue preso à armadilha dos projetos gigantescos de infra-estrutura e do favorecimento aos empresários próximos ao poder, agora conhecida como “Boliburguesia”. Curiosamente, inclui benefícios a empresas brasileiras desprezadas por outros governantes bolivarianos...
Furtado estava pessimista com relação à Venezuela da ditadura militar, mas otimista com as possibilidades que se abriram para a democracia. Havia dito que a nação poderia aproveitar a chance de crescer, “ou pode ser um país subdesenvolvido mas muito rico, com tremendas desigualdades sociais, com grandes desequilíbrios e com uma sociedade muito menos viável.”
terça-feira, 14 de outubro de 2008
O Nobel de Paul Krugman
Não é comum que a concessão dos Nobel seja comemorada como os resultados de uma partida de futebol, mas foi assim que muitos pensadores do desenvolvimento se sentiram com a decisão da academia sueca em conceder o prêmio de economia a Paul Krugman. O grande público o conhece por suas ferozes críticas a Bush, a partir de sua coluna no New York Times.
Sem dúvida o Nobel teve um certo ar de tapa na cara do presidente americano – como já havia ocorrido com a concessão do prêmio da paz a seu rival derrotado (fraudado?) Al Gore. Mas as idéias de Krugman têm importância bem maior do que a atual conjuntura política. Suas teorias ajudam a explicar os padrões de comércio internacional e a informar os governos que querem atuar para melhorar a posição de seus países na economia global.
O tema é complexo, mas tentarei resumi-lo. Os modelos clássicos do comércio internacional, como os de David Ricardo no século XIX, ou o Heckscher-Ohlin na década de 1930, basicamente prevêem que a maior parte do intercâmbio de mercadorias acontecerá entre países muito diferentes, cujas vantagens comparativas se concentram em fatores distintos, como terra, mão-de-obra ou capital. No exemplo mais comum de todos, usado pelo próprio Ricardo: Portugal exporta vinhos e importa manufaturados da Inglaterra. O problema é que o fluxo de comércio atual simplesmente não segue esse padrão. A maior parte dele acontece entre nações industrializadas, como Estados Unidos e os países da Europa Ocidental, e boa parcela ocorre entre matriz e filiais da mesma empresa ou entre companhias do mesmo setor, como o automobilístico.
Krugman ajudou a explicar por que o comércio real é tão diferente dos modelos clássicos, e o fez ressaltando os impactos da localização geográfica, da competição imperfeita (oligopólios) e das economias de escala. Suas percepções são úteis para entender o surgimento e desenvolvimento de regiões especializadas num determinado tipo de produto – os chamados clusters de desenvolvimento. Pensem, por exemplo, no que o Vale do Silício (EUA) e Bangalore (Índia) significam para a informática. Ou São José dos Campos, para a aviação brasileira. A proximidade espacial dessas empresas e em geral de centros de pesquisa/ensino associados a ela, gera diversas vantagens que ajudam a destacá-las com relação a outras firmas que, tomadas individualmente, podem ser muito parecidas.
São idéias que contradizem o cânone liberal clássico e Krugman tem sido utilizado com proveito por técnicos governamentais que planejam políticas de incentivo a indústria e ao comércio exterior, justamente por mostrar onde o mero funcionamento dos mercados não consegue explicar o desenvolvimento econômico. Contudo, é apressado usá-lo para justificar ações protecionistas. O próprio Krugman tem se manifestado com reservas e defendido medidas pontuais e cautelosas, em pequena escala.
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
Os Tudors
Tema: Governo de Henrique VIII
Contém: Relação Sexual, Assassinato, Nudez, Suicídio e Masturbação.
Essa é a etiqueta do DVD e pelo aviso já se entende parte do sucesso da série de TV "Os Tudors". De fato, a história da dinastia é um prato cheio para tablóides de qualquer época e o programa dosa em boas medidas as intrigas sexuais e políticas de um dos momentos mais conturbados da história britânica. No Brasil, a série passa no canal People + Arts, às 22h de quinta-feira.
Os excelentes roteiros são escritos por Michael Hirst, que se baseou nos agéis diálogos de Aaron Sorkin da Casa Branca de The West Wing, e em seu próprio filme sobre a rainha Elizabeth. A imagem clichê de Henrique VIII é a do gordo barbudo, com seus divórcios movidos à decapitação. A série brinca com essas expectativas, mostrando o monarca como um popstar do Renascimento, inteligente, belo e dinâmico. Ele é interpretado pelo galã Jonathan Rhys Meyers, que está muito bem no papel. O problema é sua idade. Supostamente começa a saga com vinte e poucos anos, mas alguns personagens envelhecem à sua volta, enquanto ele se conserva jovem.
Contudo, isso não chega a ser um problema na primeira temporada, que acabou de sair em DVD. Os dez episódios são conduzidos por duas tramas que se intercalam: Henrique VIII se apaixona por Ana Bolena e tenta se divorciar da rainha para se casar com ela; e o cardeal Wolsey - na prática, o primeiro-ministro do rei - arquiteta maquinações para dar um pouco de estabilidade à Inglaterra, numa Europa em chamas pela Reforma protestante e pelas rivalidades entre a França, o Império Hapsburgo e o Papado.
Ana Bolena é um dos papéis mais difíceis que posso imaginar. Como personagem histórica, ela era uma nobre menor, educada nas Cortes dos Valois franceses e dos Habpsburgo austríacos, acompanhando seu pai diplomata. Deve ter sido uma mulher extremamente sofisticada e inteligente, além de bonita. Uma flor exótica que enfeitiçou o rei ao ponto de fazê-lo romper com a Igreja. Na série, ela é vivida pela estreante Natalie Dormer, que tem beleza mas não consegue impor a dimensão do que deve ter sido Ana e a retrata como uma patricinha agitada.
O melhor ator da temporada é Sam Neill, que interpreta Wolsey astuto como um cardeal Richelieu, mas ao mesmo tempo dolorosamente humano e frágil. Consciente de suas fraquezas e frustrado diante do fracasso em seus planos em se tornar papa e da dificuldade de lidar com a demanda de Henrique VIII para casar com Ana. Ele gosta do rei e lhe é fiel até certo ponto - já que cede à corrupção dos franceses, por seu amor ao luxo e aos confortos materiais. A Corte britânica é mostrada como um imenso Big Brother, marcado por disputas constantes, onde todos se vigiam, e qualquer simbolismo ganha força extraordinária, caso mostre proximidade com o rei.
Infelizmente Wolsey sai da série na segunda temporada, mas a excelência na atuação continua com a Igreja: Peter O´Toole dá o show habitual, desta vez como o papa Paulo III.
A série é bem mais centrada nos dramas dos personagens do que no contexto histórico e imagino que alguns espectadores fiquem um tanto perdidos em meio à citação rápida de fatos e personagens cruciais, como os escritos de Lutero e Erasmo, o saque de Roma pelas tropas do imperador Hapsburgo e mesmo Michelangelo que aparece aqui e ali trabalhando nas obras da Basílica de São Pedro.
Em linhas gerais: os Tudor foram a dinastia que governou a Inglaterra entre 1485 e 1603. Sua escalada ao poder começou com Henrique VII, que matou Ricardo III em batalha e se apoderou da coroa. A vitória pôs fim a uma guerra civil de 30 anos, entre as casas de York e Lancaster. Henrique VII pertencia à segunda, mas se casou com uma princesa da primeira.
Seu filho, Henrique VIII, chegou ao trono consciente da fragilidade de sua dinastia e apavorado com a possibilidade de retorno à guerra civil, em particular porque havia nobres com pretensões bem mais legítimas à coroa do que aquelas de sua família. Para garantir a estabilidade ele precisava de filhos homens, legítimos, que pudessem ser seus sucessores. A rainha só conseguiu lhe dar uma menina. Ele teve bastardos com outras mulheres, inclusive com Mary Bolena, irmã de Ana. Mas o imponderável que ronda as paixões humanas mudou o curso da história.
Claro, havia a Reforma. A Igreja da época era um amontoado de corrupção e desordem. A série não foca esse aspecto: os personagens católicos são modelos de virtude, como a rainha Catarina e o filósofo e conselheiro real Sir Thomas More. E os protestantes são retratados de modo ambíguo, mais como oportunistas a serviço do Estado absolutista nascente. Como a série é co-produzida por irlandeses, acho que está aí a explicação...
No fim, Henrique VIII conseguiu um herdeiro legítimo, mas não de Ana. Contudo, foi sua filha com ela - Elizabeth - que logrou a tão sonhada estabilidade e prosperidade à Inglaterra. Nenhum dos descendentes de Henrique VIII teve filhos, o que talvez não seja de espantar, dada a história da família. Mestre Machado de Assis diria que optaram por não transmitir a outros seres o legado de nossa miséria.
sexta-feira, 10 de outubro de 2008
Pensar a América do Sul
Cada um de nós tem sua velocidade pessoal, mas que se desenvolve em meio ao tempo do mundo. Quando ambos sincronizam, o resultado é o sentimento de realização e pertencimento, do estar integrado a alguma maior e mais importante do que a rotina cotidiana. Meu período na cooperação internacional e como estudante de doutorado no Iuperj coincidiu com a formação do Observatório Político Sul-Americano (OPSA) do instituto. Agora sou um jovem doutor, prestes a virar tecnocrata, e o OPSA completa com festa seus cinco anos de vida.
O Observatório é fruto do trabalho de diversas pessoas em vários países, capitaneadas por minha dileta professora Maria Regina Soares de Lima. Com freqüência digo a meus alunos frases como “Já dizia Maria Regina...” ou “Aprendi com a mestra tal e qual coisa...”. O OPSA procura pensar a América do Sul a partir da perspectiva da própria região. Simples e importante assim. Em outros países, sobretudo na Ásia, projetos semelhantes são conhecidos por nomes mais empolados, como Subaltern/Post-Colonial Studies.
A decisão é uma guinada. A vida acadêmica brasileira tradicionalmente dispensou pouca atenção aos vizinhos, preferindo se dedicar aos Estados Unidos ou à Europa. Os colegas do campo das Letras e das Artes reverteram primeiro o quadro, mas os cientistas sociais demoramos demasiado tempo para corrigir esse erro. Ainda há muito o que precisamos fazer.
Em cinco anos, o site do OPSA já disponibilizou dezenas de pesquisas e artigos, todos gratuitos. Atualiza semanalmente um boletim de notícias sobre a América do Sul e compilou um banco de dados sobre os principais eventos políticos da região. Lançou duas coletâneas de artigos e organizou seminários e debates. Tudo isso o transformou, sem dúvida, na principal referência sul-americana para o estudo do continente.
Embora eu tenha uma intensa vivência acadêmica, optei por não trabalhar em horário integral no mundo universitário. Não cheguei, portanto, a ser membro do OPSA, embora tenha sido assistente de seu embrião, o Grupo de Pesquisa em Política Internacional. Ainda assim, contribuí com diversos artigos para o Observatório. Em geral, textos escritos após alguma viagem a serviço de projetos de cooperação, uma tentativa de refletir sobre a experiência rica, mas de ritmo sempre apressado, que venho levando nos últimos anos.
O aniversário do OPSA foi comemorado pelo lançamento de uma coletânea sobre os governos de esquerda na América do Sul e pela publicação em livro da tese de doutorado do coordenador-executivo do Observatório – e meu amigo fraterníssimo – Marcelo Coutinho. É um estudo brilhante e detalhado sobre as crises políticas na região, com observações muito perspicazes sobre a maneira de superá-las. Um trecho de sua reflexão:
“O problema institucional sul-americano não é de natureza econômica, e sim política. Não há essa associação: crise econômica, crise institucional. Uruguai e Argentina passaram talvez pela pior crise da história da América Latina, entre 1998 e 2003. A crise no Uruguai é tremenda, mas as instituições políticas passam incólumes.”
Exato! Assim como a boa situação econômica vivida pelo boom dos hidrocarbonetos na Bolívia, Equador e Venezuela não resolveu o nó político desses países. Em seu livro, Marcelo se foca no contraste entre Brasil e Peru, e indica que o caminho mais inclusivo adotado pelos brasileiros aponta para boa parte do sucesso da estabilização daqui.
Em meio às celebrações do OPSA, tenho o gosto de ver a publicação de um dos meus artigos: “Políticas Públicas de Juventude no Mercosul”. Uma tentativa de pensar a área a partir das minhas experiências recentes como pesquisador e membro do Conselho Nacional de Juventude.
quinta-feira, 9 de outubro de 2008
A Expulsão da Odebrecht
A decisão do presidente Rafael Correa em expulsar do Equador a empreiteira brasileira Odebrecht me pegou de surpresa. Eu acreditava que suas ameaças à empresa eram apenas uma manobra para ganhar popularidade eleitoral às vésperas do referendo, e que passada a votação o governo fecharia um acordo com a empresa, como chegou a ser noticiado que ocorrera.
As autoridades brasileiras vinham negociando nos bastidores, sem criticar publicamente os governos vizinhos que entravam em conflitos com empresas do Brasil. Agora houve mudanças. O Itamaraty retaliou o Equador e cancelou uma missão de ajuda encabeçada pelo ministro dos Transportes. O Brasil depende da Bolívia para obter o gás que abastece a indústria. Não há impedimento semelhante com relação ao Equador, o que me faz crer que a reação brasileira será bem mais dura desta vez. Não é bonito ver esse tipo de confronto ocorrendo, mas diante dos fatos, não resta alternativa ao Brasil.
Enquanto isso, em Quito, a situação também está instável. O presidente exonerou o ministro do Petróleo, porque ele não conseguiu fazer as empresas estrangeiras aceitarem a nova regulação proposta pelo governo, que aumenta muito os impostos. Há cerca de 10 firmas do exterior extraindo aproximadamente 40% do petróleo no Equador. Correa tem ameaçado expulsá-las - incluindo a Petrobras. Seu antecessor, de quem ele foi ministro da Economia, fez isso com uma companhia americana, a Occidental, que era a maior investidora estrangeira no país.
O barril de petróleo chegou a valer US$140, a crise das últimas semanas o derrubou para US$90. Com EUA e Europa (o mundo?) à beira da recessão, é provável que a demanda diminua e os preços continuem a cair. As rendas petrolíferas garantem mais de 1/3 do orçamento equatoriano, o que será um problema significativo para o presidente, ainda mais com a expansão de serviços públicos prevista na recém-aprovada Constituição.
Naturalmente, a instabilidade e a hostilidade que Correa tem demonstrado com relação às empresas estrangeiras não ajudam a atrair investimento externo. Desde a posse do presidente, o fluxo caiu de US$270 para US$179 milhões anuais.
quarta-feira, 8 de outubro de 2008
Modernizando a FAB
Ontem recebi de um amigo a análise da Stratfor, a célebre consultoria especializada em temas militares, sobre a política brasileira de reequipar a Força Aérea. A empresa coloca a decisão como um dos três grandes fatos da última semana que indicam os rumos da política internacional da próxima década – os dois outros seriam a ratificação do acordo nuclear Índia e Estados Unidos, e a cúpula Alemanha e Rússia, que tenta reforçar a parceria energética entre os dois países e acalmar a União Européia, sobretudo os Estados do Leste, com relação às intenções de Moscou.
A Stratfor examina a geopolítica sul-americana e contrasta a situação do Brasil com os problemas dos vizinhos:
By any measure, Brazil is a rapidly rising power, and this has nothing to do with the fact that it has discovered an obscene amount of oil in its offshore regions in the past year. Brazil's traditional competitors - Argentina and Venezuela - are in the process of mismanaged economic collapse, leaving Brazil with no competitors in its neighborhood.
Dizer que a Venezuela é “rival tradicional” do Brasil é uma brincadeira, historicamente o vizinho do Norte olhou para o Caribe e a América Central, regiões de pouco interesse para a política externa brasileira. O caso argentino, evidentemente, é outro, marcado pelas longas disputas no Cone Sul. Mas o enfrentamento virou aliança a partir dos Acordos de Iguaçu, em 1985, e desde então as relações entre Buenos Aires e Brasília se tornaram bastante sólidas, ainda que temperadas aqui e ali por alguma controvérsia comercial a respeito de geladeiras ou tarifas. Ainda assim, me parece que a Stratfor acertou o nervo: a comparação entre um Brasil que cresce internacionalmente e uma região onde a instabilidade política e econômica continua a travar o desenvolvimento.
Em seguida, a consultoria examina a decisão da Força Aérea Brasileira de comprar 36 caças, a custo de cerca de US$3 bilhões. A FAB já é maior da região – a segunda, a colombiana, é forte em helicópteros mas tem poucos aviões de combate. A folga não é tão grande com relação a alguns tipos de aeronaves, como caças, que Peru, Chile e Venezuela possuem em boa quantidade, e em modelos mais avançados como Mirage 2000, F-16 e Mig-29. As iminentes aquisições por parte do Brasil reverterão o quadro, com o país assumindo a superioridade também nessa área.
O governo brasileiro anunciou três empresas finalistas para a compra dos caças: o francês Rafale (foto), o americano F-18 e o sueco Gripen. O objetivo da FAB não é apenas adquirir os aviões, mas obter transferência de tecnologia. È considerado praticamente certo que a França vencerá a concorrência, em função dos acordos estratégicos que assinou com o Brasil, e que estabelecem cooperação militar nos campos aeronáutico e naval.
Contudo, a lista da FAB apresenta uma exclusão interessante. Ficaram de fora os Sukhoi-35 russos, muito bem avaliados pelos especialistas. Ora, como todos sabem, Estados Unidos e Rússia estão em rota de colisão, inclusive na América Latina, pela proximidade entre os governos em Caracas e Moscou. Sanções americanas contra Chávez impedem a boa manutenção de sua frota de F-16 dos EUA, de modo que ele se voltou para os aviões russos.
A Stratfor analisa bem o significado da opção brasileira:
More notable than what designs made Brazil's final cut is the design that failed to: Russia's Sukhoi Su-35. Brazil is emerging on the world stage. The decisions it makes now will shape its policy - and thus that of the rest of the world - for decades to come. Brazil deliberately chose to go with a Western system for its airpower. Of the potential options, the Sukhoi was the only system that would have given Brazil the option of challenging U.S. military primacy (...) Put simply, rising Brazil has either made a conscious decision to pursue a modernization program that will put it at American mercy or made a conscious decision not to adopt a hostile attitude toward the United States.
De fato. Tudo indica que o Brasil ficará com a aliança francesa, que lhe permitirá autonomia tecnológica que os americanos nunca se mostraram dispostos a conceder. Ao mesmo tempo, evita-se o confronto com os Estados Unidos, excluindo da concorrência seus rivais russos.
Aguardemos o anúncio do Plano Nacional de Defesa, que deve trazer outras novidades bastantes bem interessantes, em particular sobre a expansão da Marinha.
terça-feira, 7 de outubro de 2008
Todo Mundo em Pânico
Deixa eu ver se entendi.
Os Estados Unidos aprovaram um gigantesco pacote de ajuda ao sistema financeiro. A União Européia não conseguiu articular uma resposta conjunta à crise, e seus bancos e investidores sentiram o baque. As principais economias da região – Alemanha, Reino Unido, França – já estão em recessão.
O pânico se espalhou para os mercados emergentes e as bolsas da Rússia, Brasil e Indonésia despencaram. Os preços de commodities muito importantes para as exportações desses países caíram bastante – petróleo, soja, milho, trigo.
Diante da instabilidade e do medo, os investidores retiram seu dinheiro das bolsas e rumam para opções mais seguras: dólar, ouro, títulos da dívida pública.
A economia brasileira vem crescendo a boas taxas, impulsionada pela expansão do crédito – alguém aí comprou automóvel financiado em 50 meses? Com a crise, os empréstimos internacionais ficam mais escassos e caros. Não chega a ser um grande problema para o Brasil, porque o crédito externo anda pelos 10%. O governo reage diminuindo o depósito compulsório que os bancos comerciais precisam deixar no BC, e medida libera algo na faixa de R$15 bilhões para a economia.
No fim da semana ocorrerá em Washington um encontro das instituições de Bretton Woods, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. Ninguém acredita que elas possam oferecer alternativas à crise, devido aos seus parcos recursos diante da dimensão do mercado financeiro atual. Por exemplo, o maior empréstimo que o FMI já concedeu foi de cerca de US$40 bilhões. O diretor do Fundo chora suas mágoas e diz que ninguém lembra dele nesse momento difícil.
E agora, quem poderá nos defender?
Primeiro, a União Européia precisa coordenar suas respostas. Não adianta a Alemanha fazer uma coisa, a Islândia outra, a Espanha uma terceira.
Segundo, é hora de reconhecer que é necessário ampliar o clube de quem manda. Chamem China e Índia, já! Suas gigantescas reservas cambiais têm sido fundamentais para manter o valor do dólar e a demanda de seus mercados será essencial para puxar a recuperação desta crise.
segunda-feira, 6 de outubro de 2008
O Mundo Pós-Americano
Há poucos dias mencionei de passagem o livro “The Post American World”, do cientista político Fareed Zakaria. A obra me chegou pelo correio num pacote da Amazon, junto com uma série de estudos sobre a Índia, e foi minha leitura do fim de semana.
Primeiro, algumas palavras sobre o autor: Zakaria é indiano. Seu pai foi vice-presidente do poderoso Partido do Congresso, sua mãe editou um dos principais jornais do país. O rapaz cresceu numa mansão do aristocrático bairro de Malabar Hills, em Mumbai (Bombaim) e optou por cursar a universidade Yale nos Estados Unidos, em formação acadêmica que culminou com o doutorado em Harvard. Foi o editor mais jovem da revista Foreign Affairs, apresenta um programa sobre política internacional na CNN e coordena as edições internacionais da Newsweek. Escreveu três livros, incluindo uma obra-prima (“From Wealth to Power: the unusual origins of America´s World Role”). Vem sendo apontado como um novo Kissinger ou Brzezinski, um imigrante capaz de ascender aos mais altos cargos da diplomacia americana.
Passemos às idéias. O argumento central do livro é que a ordem internacional dos próximos anos será marcada pela ascensão de potências fora do eixo tradicional EUA-Europa, em virtude da difusão do desenvolvimento econômico e da integração bem-sucedida de Estados periféricos à economia global. Embora Zakaria afirme que os astros emergentes estão em toda parte, inclusive América Latina e África, os países que ele realmente destaca são todos asiáticos: China e Índia. Com menções mais do que ocasionais, e sempre elogiosas, ao Brasil.
Zakaria chama a China de “o desafiante” e a Índia de “a aliada”. Obviamente, as duas classificações dizem respeito à posição desses países diante dos Estados Unidos. Apesar de indiano de nascimento e criação, o autor usa a expressão “nós, os americanos”, ainda que fale do desenvolvimento de seu país natal com grande admiração. Ele não compra a tese do “choque de civilizações”. Seu argumento é que o melhor caminho para os Estados Unidos prosperarem no mundo pós-americano é buscar a parceria com a Índia, em função de seus valores e interesses comuns (democracia, contenção da China) e reforçar/reformar as instituições multilaterais, para dar mais espaço à participação dos países em desenvolvimento. É quase uma plataforma para se candidatar a Secretário de Estado ou Conselheiro de Segurança Nacional.
O ponto forte do livro, sem dúvida, são as análises sobre a Índia. Zakaria conhece profundamente o país e tem uma visão ampla e crítica dos erros e problemas nacionais, em particular em suas estratégias de desenvolvimento econômico e política externa. Gostaria no entanto que ele abordasse mais a questão dos papéis que a Índia pode desempenhar na Ásia, porque a discussão se concentra muito na relação com os Estados Unidos e nas fascinantes semelhanças entre os dois países. Talvez de modo inevitável, dada a biografia do autor.
As análises sobre a China não são tão ricas, mas o grande “senão” do livro é ausência de discussão profunda a respeito da Rússia. O que fazer com o poderio ressurgente de Moscou? A pergunta tem ressoado entre os EUA e as capitais da União Européia, sem que se tenha conseguido formular uma resposta unificada ou coerente, diante das tensões que envolvem a guerra no Cáucaso, corrida armamentista e cooperação/conflito em programas de energia e de cooperação tecnológica espacial.
sexta-feira, 3 de outubro de 2008
Um Olhar sobre os Jovens Sul-Americanos
Na quarta-feira estive em Campos, para dar palestra no programa de pós-graduação em sociologia política da Universidade Estadual do Norte Fluminense. Apresentei aos alunos as pesquisas sobre juventude sul-americana nas quais tenho trabalhado. Foi uma excelente tarde de troca de idéias e de experiências.
Chamei a atenção deles para as possibilidades oferecidas a pesquisadores em ONGs e movimentos sociais. Há vida e oportunidades fora do circuito acadêmico tradicional, em particular agora, em que as grandes agências financiadoras da cooperação internacional estão interessadas em entender as transformações sociais em curso no Brasil. Com mais recursos, podemos investir a sério em pesquisa e obtivemos resultados promissores misturando ferramentas qualitativas (grupos focais, entrevistas) com quantitativas (pesquisas de opinião pública).
Por exemplo, há poucos dias o IBOPE aplicou para nós extenso questionário para 15 mil pessoas, em seis países sul-americanos: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai. Metade dos entrevistados é jovem, os demais são adultos ou idosos. Nossa intenção é comparar as atitudes, valores e hábitos de participação política, procurando descobrir se existem diferenças significativas entre as faixas etárias.
Algo que despertou a curiosidade dos alunos foi a metodologia dos Grupos de Diálogo, instrumento desenvolvido pela ONG Canadian Policy Research Networks. Trata-se de processo longo, que pode levar dias inteiros, nos quais pessoas envolvidas com determinado tema trocam idéias e discutem modelos de participação, até chegar a consensos sobre os melhores caminhos. O compromisso com o diálogo e a democracia é uma expressão da admirável cultura cívica do Canadá. No Brasil, começamos a aplicar o método nos estudos sobre juventude, e recentemente o usamos também em pesquisa com os beneficiários do Bolsa Família. Os resultados foram tão bons que os canadenses nos convidaram a apresentar as adaptações e mudanças que fizemos por aqui, adotando algumas delas.
“Método” vem do grego e significa caminho, e mesmo as melhores ferramentas só são úteis se sabemos aonde queremos chegar. Pesquisas realizadas por ONGs sempre tem intenso compromisso político, o que me agrada muito, acho que dificilmente me adaptaria a fazer algo que fosse apenas teórico. No caso dos levantamentos sobre juventude, os objetivos são entender os novos movimentos sociais juvenis, identificar suas principais demandas e contribuir para a formulação de políticas públicas na área, tanto nos níveis nacionais quanto no Mercosul.
Se você lê este blog há algum tempo já deve ter acompanhado várias das nossas atividades. Basicamente, encontramos entre os jovens seis reivindicações principais: sobretudo educação e trabalho, mas também cultura, meio ambiente, circulação (movimentos de passe livre) e o que chamamos de “vida segura”, que abarca direitos humanos e segurança. Houve enorme convergência nos seis países que estudamos em torno dessas demandas, o que me surpreendeu. Imaginava que fossem surgir diferenças bem mais expressivas entre nações com nível de desenvolvimento econômico bem diverso, como Brasil e Paraguai.
Outro ponto que chamou a atenção dos alunos foi a multiplicidade dos atuais movimentos juvenis. Houve uma época em que eles eram quase sinônimo de mobilizações estudantis. De fato, elas continuam muito expressivas, mas agora são acompanhadas por várias outras organizações, ligadas à cultura, às identidades étnicas, às questões de gênero. Também estão mais populares, incorporando mais os pobres, deixaram de ser majoritariamente de classe média.
Enfim, há mais atividades que desempenho na área e em breve comentarei sobre elas. Para quem está no Rio de Janeiro, na próxima quarta-feira, dia 8 às 14h darei palestra sobre movimentos juvenis e políticas públicas na América do Sul, na PUC, na Semana de Relações Internacionais da universidade.
Imagens do Post:
1)Hip hop aymara, centro cultural Wayna Tambo, em El Alto, Bolívia.
2) Hijos por la Identidad y la Justicia, contra el Olvido e el Silencio (filhos de militantes políticos assassinados pela ditadura), Buenos Aires Argentina.
3) Protesto de secundaristas durante a "Rebelião dos Pingüins". Valparaíso, Chile.
4) Jovem camponês do movimento Asagrapa, em ocupação de terras na província de Alto Paraná, Paraguai.
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